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Joni Mitchell, Neil Young, Nico, David Crosby: discos clássicos do pop angustiado

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PUBLICADO ORIGINALMENTE EM 11/11/2013

 

A revista inglesa “Uncut” traz uma entrevista sensacional com a cantora e compositora Joni Mitchell, que está completando 70 anos.

Com sua verve corrosiva e um ego do tamanho do mundo, Joni é garantia de diversão. Deve ser a única pessoa do planeta com moral para achincalhar Bob Dylan.

 

 

Na entrevista, Joni diz que Dylan é um músico de segunda categoria e um plagiador, que copiou muitas de suas letras de um romance japonês (ela não entrega qual).

A revista traz ainda uma lista dos “50 maiores discos de cantores/compositores”, com LPs de Dylan, Leonard Cohen, Nick Drake, Beck, John Grant... e Joni Mitchell, claro.

A era dos cantores/compositores, marcada por discos confessionais, teve seu auge no início dos anos 70, época em que o pop se recuperava de vários baques.

Entre o fim dos 60 e o início dos 70, os Beatles acabaram, o show dos Stones em Altamont acabou em morte, Charles Manson e sua gangue mataram sete pessoas, a Guarda Nacional matou quatro estudantes em Ohio e o mundo perdeu Brian Jones, Jim Morrison, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Martin Luther King e Bobby Kennedy. Apesar dos protestos, a Guerra do Vietnã só piorava.

Estava claro que o sonho hippie de paz e amor tinha ido pro brejo.

A reação a esse fenômeno foi o isolamento. Músicos começaram a largar suas bandas e partir para uma música mais pessoal e confessional. De repente, saíram de moda longas jams psicodélicas; o lance era se enfurnar num canto escuro, cheirar pó e cantar sobre seus problemas.

David Crosby saiu do Byrds, Graham Nash deixou o Hollies, Neil Young largou o Buffalo Springfield, Lou Reed abandonou o Velvet Underground e John Lennon aproveitou o fim dos Beatles para iniciar sua carreira solo.

David Geffen, um dos maiores gênios da indústria da música, sacou a tendência e criou a gravadora Asylum, que virou a meca do bloco do eu sozinho. Assinou Judee Sill, Jackson Browne, Joni Mitchell, Linda Ronstadt, Glenn Frey, Tom Waits, Warren Zeavon e até Bob Dylan (quem quiser ler mais sobre essa época, recomendo o livro “Hotel California”, de Barney Hoskins).

O sucesso planetário de Simon & Garfunkel mostrou que o mundo estava pronto para trovadores cantando pop minimalista. Tchau, psicodelia; bem-vinda, introspecção!

Até o fim dos anos 70, vários discos de banquinho e violão foram sucesso mundial: “Sweet Baby James” (James Taylor), “Tapestry” (Carole King), “Harvest” (Neil Young), “Teaser and the Firecat” (Cat Stevens) e “No Secrets” (Carly Simon).

Se os discos soavam plácidos e serenos, traziam algumas das letras mais tristes e desesperadas do pop.

Fiz uma lista, em ordem cronológica, de meus discos prediletos do gênero. Para ouvir e chorar junto...

Dez discos clássicos de solidão e angústia

Nico – The Marble Index (1969) - Aposto um jantar como Siouxsie Sioux, Robert Smith e Peter Murphy passaram longas horas ouvindo esse disco dilacerante. John Cale botou todo seu arsenal vanguardista de drones e distorção a serviço da voz glacial de Nico, e o resultado é um dos LPs mais tristes e bonitos já gravados, com canções sobre heroína, corações partidos e orgias xamanísticas com Jim Morrison. Segundo um executivo da gravadora Elektra, o disco vendeu seis cópias. Nico penou com heroína a vida toda. Morreu em 1988, ao cair de uma bicicleta em Ibiza.

Skip Spence – Oar (1969) - Em 1968, Alexander “Skip” Spence, guitarrista do Moby Grape, atacou seus companheiros de banda com um machado durante um surto psicótico. Internado numa clínica psiquiátrica por seis meses, saiu de lá e gravou esse disco inesquecível, polaróide de uma alma em  conflito.

John Lennon / Plastic Ono Band (1970) – Nem tanto um disco quanto uma sessão de terapia musicada, o primeiro LP solo de Lennon é um triunfo do minimalismo confessional. Nunca um artista tão famoso expôs sua psique de forma tão aberta, em canções sobre Deus (“God”), abandono familiar (“Mother”) e solidão (“Isolation”). O som cru e espartano foi uma reação à superprodução dos últimos trabalhos dos Beatles e prenunciou o punk.

David Crosby – If I Could Only Remember My Name (1971) - Em 1969, Christine Hinton, namorada de David Crosby, se despediu dele, pegou o carro do casal e foi levar o gato no veterinário. Na esquina, o bichano pulou no colo de Christine, que perdeu controle do carro e bateu de frente num ônibus escolar. Christine morreu na hora. Crosby, que já não era das pessoas mais tranqüilas do mundo, entrou em parafuso: trancou-se em casa, cheirou metade da Bolívia e cometeu esse disco extraordinário, cujo título – “Se eu Pudesse Ao Menos Lembrar Meu Nome” – dá uma idéia do estado mental em que se encontrava. Amigos como Graham Nash, Santana, Jefferson Airplane e Joni Mitchell deram uma força. Essa versão de “Traction in the Rain” na BBC é demais:

Joni Mitchell – Blue (1971) – Uma obra-prima lamuriosa sobre o fim dos relacionamentos de Mitchell com Graham Nash e James Taylor e o evento que marcaria a vida da cantora: em 1965, ela descobriu que estava grávida. Sem condições de sustentar a criança, deu sua filha para adoção. A música “Little Green” (“criança, com uma criança, fingindo...”) é sobre essa experiência traumática, que só foi revelada ao público nos anos 90.

Judee Sill – Heart Food (1973) – A vida de Judee Sill foi punk: órfã, viciada em drogas ainda adolescente, acabou na cadeia por furto e se prostituiu para comprar heroína. Gravou dois discos minimalistas e arrasadores, com influência de ocultismo e temas religiosos. Não venderam nada, mas influenciaram gente como Beth Orton, Jeff Buckley, Bill Calahan (Smog), Mark Eitzel e Beck. Sill morreu em 1979, aos 35 anos, de overdose.

Neil Young – Tonight’s the Night (1975) – Em 1973, depois das mortes por overdose de Danny Whitten, guitarrista do Crazy Horse, e do roadie Bruce Berry, Neil Young reuniu amigos em seu rancho e promoveu sessões de gravação que se estendiam madrugada adentro, regadas a tequila e pó. O exorcismo rendeu o disco mais dark de sua carreira. Tão dark que Young levou dois anos para ter coragem de lançá-lo.

Arnaldo Batista – Lóki (1974) – Depois de sair dos Mutantes e terminar o romance com Rita Lee, Arnaldo gravou este disco, tão lindo quanto doloroso de ouvir. Sua voz é tão frágil que parece que Arnaldo vai se despedaçar a qualquer momento. Oito anos depois, ele se jogaria de uma janela.

Dennis Wilson – Pacific Ocean Blue (1977) – Por anos, Dennis viveu nos Beach Boys à sombra dos irmãos Brian e Carl e do primo, Mike Love. Era o mais rebelde dos irmãos Wilson e o que mais apanhou do pai, Murray, um psicopata cujo hobby era torturar a prole. Cultivando um complexo de inferioridade gigantesco, Dennis, um playboy cocainômano e viciado em sexo, amigo de Charles Manson, penou por quase oito anos para tomar coragem e gravar suas próprias canções. O resultado é o majestoso “Pacific Ocean Blue”, jóia do soft-rock orquestral. Só os Wilson para fazer a tristeza soar tão bela. Dennis morreria seis anos depois, ao mergulhar bêbado no Pacífico.

Marvin Gaye – Here My Dear (1978) – Quando se divorciou de Anna Gordy, irmã de Berry Gordy, chefão da gravadora Motown, Marvin Gaye estava na pior: cheirava 500 dólares por dia e não tinha dinheiro para pagar o divórcio e a pensão do filho pequeno. Seu advogado fez um trato com Anna: Marvin gravaria um disco e dividiria os royalties com ela. O resultado foi um LP duplo que periga ser o mais arrasador documento musical sobre um casamento desfeito. Em 1984, Marvin Gaye, 44, seria assassinado a tiros pelo próprio pai.

 

Menções (muito) honrosas:

Syd Barrett - The Madcap Laughs (1969/1970), Nick Drake – Pink Moon (1972), Leonard Cohen – Songs of Leonard Cohen (1967), Erasmo Carlos – Carlos, Erasmo (1971), James Taylor – Sweet Baby James (1970), Gram Parsons – Grievous Angel (1974), Gene Clark – No Other (1974), Bob Dylan – Blood on the Tracks (1975).

P.S.: O blog está de férias até 5 de janeiro. Infelizmente, não poderei moderar ou aprova comentários até lá. Ótimo fim de ano para todos!

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