Noite de domingo no Rock in Rio. Eu estava na sala de imprensa escrevendo sobre o show de John Legend, quando os fotógrafos voltavam da apresentação de Seal (nesses grandes festivais, a produção só permite que fotógrafos fiquem na área reservada em frente ao palco durante as três primeiras músicas).
O fotógrafo Eduardo Anizelli, meu colega da "Folha", disse que nunca havia presenciado um show tão fácil de fotografar, e que Seal tinha facilitado o trabalho de todos os fotógrafos e cinegrafistas. Ele contou que Seal andou - não correu, andou - pelo palco todo, parando em vários locais onde se aglomerava gente de imprensa e fazendo expressões e gestos de alto impacto visual - braços abertos enquanto jogava a cabeça para trás, punhos cerrados para o alto, etc. - com o cuidado de manter-se na posição por um bom tempo, para que nenhuma câmera perdesse aquelas poses.
Logo na primeira canção, Seal caminhou pelo corredor de seguranças de que divide o público, cumprimentando fãs e sendo abraçado. "Na primeira música, fiz todas as fotos que precisava", disse Anizelli.
Dei uma olhada nas fotos que ele descarregava no computador, e realmente a qualidade das imagens era impressionante: o jornal poderia escolher qualquer uma. Seal estava impecável em todas, sempre com uma expressão bacana ou fazendo um gesto visualmente impactante.
Alguém pode dizer: "Ah, mas o Seal tem quatro metros de altura e parece um top model, ele sai bem em todas as fotos". É verdade.
Mas Elton John, que tocou logo depois, não é um top model - baixinho, gordinho e com pinta de bibliotecário - e também sai bem em todas as fotos. Por quê?
Na primeira música de seu show, "The Bitch is Back", Elton sentou em cima no piano (veja a 1m20s). Foi a imagem que ilustrou a cobertura de incontáveis jornais e sites.
Agora veja um trecho de um show de Elton na Flórida, em março:
E outro trecho, dessa vez do show do cantor no mesmo Rock in Rio, em 2011:
Elton repete o artifício de sentar em cima do piano em todos os shows, exatamente no mesmo ponto da música. E a razão é simples: ele sabe que fotógrafos só podem trabalhar por três músicas, e que precisa dar a eles boas imagens nesse curto intervalo de tempo.
Quando um popstar atinge o nível de fama e profissionalismo de Elton John, não há um segundo de seu show que não tenha sido testado e aprovado. Mesmo Bruce Springsteen, conhecido por sua interação com a plateia e "improviso", costuma repetir gestos e frases de efeito que sempre funcionam com grandes plateias.
Essa padronização dos grandes concertos sempre existiu, mas ganhou força nos anos 1990, com a popularização do uso de grandes telões em concertos. O astro pop aprendeu a usar os telões e aprendeu que, tão importante quanto agradar ao público da fila do gargarejo, é se comunicar com o infeliz que estava na centésima fileira da arquibancada. Fora que a quantidade de pessoas num show é infinitamente menor do que o número que verá as imagens do show na mídia.
Em 2010, fui ao show de Paul McCartney no Morumbi e encontrei um amigo jornalista, que já tinha visto uns cinco shows da mesma turnê. Ele conseguia antecipar todos os gestos de Macca: "Agora ele vai dar um suspiro, olhar pro alto da arquibancada e perguntar se eles estão se divertindo; depois vai olhar pro outro lado, gritar 'Good evening, São Paulo!', e dizer tal coisa...". Não errou uma.
No Rock in Rio de 2013, o vocalista do Nickelback, Chad Kroeger, usava um artifício muito esperto para vender mais discos: anunciava toda música que a banda ia tocar, com cuidado de dizer em que álbum poderiam ser encontradas.
Alguém acha que Kroeger tirou isso da cabeça, num rompante de tino comercial, ou foi treinado por algum gênio do marketing? Ninguém vende 50 milhões de discos à toa.
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