Ontem, a Espanha, atual campeã mundial, foi humilhada. Perdeu para o Chile e foi eliminada da Copa. Após o jogo, o técnico espanhol, Vicente Del Bosque, abatido, disse: "Não há desculpas". Casillas, o grande goleiro que esteve irreconhecível nesta Copa, pediu perdão aos conterrâneos.
Anteontem, Felipão, técnico da seleção da CBF, praticamente classificada para a segunda fase depois de um empate chocho contra o México, deu uma entrevista coletiva arrogante, agressiva e prepotente.
Fiquei imaginando como Felipão reagiria se estivesse no lugar de Del Bosque.
Se existe um profissional que foi pressionado nessa Copa, foi o espanhol. Chegou como campeão e, logo na estreia em 2014, levou uma sapatada de cinco da Holanda. Mas não botou a culpa em ninguém ou descontou sua frustração na imprensa. Disse: "É inexplicável que façam cinco gols. Não tenho palavras. É um momento delicado. Estou mal, arrasado. Mas com coragem para assumir minha participação nesta pancada que sofremos. Já que sabemos ganhar, temos de saber perder."
Felipão, por sua vez, parece incapaz de aceitar críticas e discutir problemas de forma clara, sem apelar para truques psicológicos cuja única função é colocar o questionador na posição de “inimigo”.
Se, depois do primeiro jogo, Felipão havia dito, para risadas gerais, que viu pênalti em Fred no lance escandaloso que deu a vitória à seleção contra a Croácia, dessa vez afirmou, entre grunhidos e muxoxos, que a seleção “melhorou pelo menos 10%” e reclamou de um suposto pênalti em Marcelo, um lance tão ridículo que o lateral merecia até um amarelo por simulação.
As coletivas de Felipão só conseguem ser menos desagradáveis que as de Dunga, um ogro cujo gesto mais emblemático foi, como capitão da seleção, levantar a taça do Mundial de 94 e gritar palavrões, transformando o que deveria ser um momento histórico em uma patética explosão de vingança pessoal e ressentimento, sem o menor respeito à solenidade e importância do acontecimento.
Ao agir de forma grosseira e responder aos questionamentos da imprensa com monossílabos ou opiniões claramente insinceras, Felipão tenta colocar a “mídia”, que até agora quase só bateu bumbo para a seleção, no papel de adversária, e trazer o povo para o lado do time. Um populismo rastaquera e obtuso, mas que infelizmente parece funcionar por aqui.
Felipão não é o único. Nossos homens públicos têm o hábito de fazer chantagem com patriotismo. O ministro do Esporte, Aldo Rebello, vem fazendo isso há tempos, associando qualquer crítica à Copa e aos estádios superfaturados a um sentimento “antipatriota”. Os militares costumavam fazer isso durante a ditadura também.
O que Felipão consegue com isso é deixar o ambiente ainda mais pesado. Muitos jogadores da seleção são jovens, disputando sua primeira Copa, e devem estar sentido demais a responsabilidade, ainda mais depois que Parreira prometeu a vitória (“Nós vamos vencer a Copa (...) a seleção não vai perder de novo. É impensável e inimaginável o Brasil não ganhar o Mundial. Não existe plano B”) e Felipão também (“Estou cada dia mais convicto de que vamos ganhar a Copa”.).
A seleção da CBF jogou duas vezes nesta Copa da FIFA. Nas duas, o capitão do time, Thiago Silva, chorou durante o hino e David Luiz cantou o hino com uma expressão de ódio, parecendo lutador de UFC.
Anteontem, em Fortaleza, enquanto a torcida entoava “Ouviram do Ipiranga”, Neymar pôs as mãos no rosto e chorou. Ou melhor, pareceu ter chorado, já que foi difícil ver uma lágrima sequer ali. Choro ou Neymarketing?
Neymar chora durante Hino Nacional por thevideos no Videolog.tv.
O clima entre os jogadores parecia pesado. A impressão não era a de uma festa do futebol, mas o enterro de algum estadista.
Pergunto: chorar toda vez que toca o hino é sinal de emoção ou descontrole? Um técnico que não consegue dar uma resposta objetiva a qualquer tipo de indagação, preferindo criar um clima de animosidade e enfrentamento, está jogando a favor ou contra o time?
O mais curioso é que Felipão, a cada tropeço, diz que a imprensa parece esquecer que, do outro lado do campo há um adversário forte, embora ele próprio faça o mesmo quando promete o título.
E ai de quem apontar essa hipocrisia para ele em uma entrevista. Corre o risco de ser achincalhado ou de perder a credencial de imprensa, já que a CBF também não gosta de perguntas "antipatriotas".
P.S.: E que jogão Austrália vs. Holanda, não? Um gol antológico de Cahill, duas viradas, e a torcida australiana aplaudindo muito o time no final, embora quase eliminado. Bonito demais.
Bom feriadão a todos e até segunda.
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