Semana passada, Kareem Abdul-Jabbar, um dos maiores ídolos da história do basquete americano, publicou um texto no site da revista “Time” explicando porque acha que o futebol – o nosso - não deslancha nos Estados Unidos (leia aqui).
Kareem diz, entre outras coisas, que no futebol “há muita movimentação, mas não há muita ação”, usa números de audiência de TV da liga profissional de futebol dos Estados Unidos para provar que o futebol ainda gera muito menos dinheiro do que basquete, beisebol, futebol americano e hóquei, e diz que o público americano fica frustrado pelo baixo número de gols em algumas partidas.
O texto é muito bom. Kareem não critica o futebol, mas tenta explicar porque o esporte nunca será capaz de exprimir o “ethos americano”.
Concordo com ele. Acho muito difícil que o futebol seja admirado nos Estados Unidos da forma como é no resto do mundo, assim como os brasileiros nunca conseguirão apreciar o jogo de beisebol.
Listei algumas razões que, acredito, ajudam a explicar essa barreira que existe entre os Estados Unidos e o futebol:
O futebol não é um esporte “televisivo” – O esporte, nos Estados Unidos, é feito para ser visto na TV. As partidas têm intervalos para comerciais de TV e o ritmo dos jogos é propositalmente acelerado, com tempos de posse de bola definidos para cada time (a exceção é o hóquei no gelo, mas o jogo é tão rápido e dinâmico que isso se torna desnecessário). No futebol, em contrapartida, um time poderia ficar tocando a bola por 90 minutos sem que o adversário sequer encoste nela. Para o público norte-americano, isso é um tédio mortal.
Americano odeia “zebras” – Com exceção do futebol americano, os outros esportes principais do país são decididos em séries de melhor de sete jogos. Vence quem ganhar quatro partidas. Para muitos americanos, é inconcebível que o melhor time não ganhe. Já no nosso futebol, “zebras” são comuns. Mas tente explicar para um americano que isso torna o jogo mais emocionante. Ele certamente vai reclamar que não é justo.
Os Estados Unidos são obcecados por estatísticas – Se você se aborrece com PVC falando de quantos impedimentos Romualdo Arpi Filho apitou em Madureira x Bangu em 1977, sugiro assistir aos programas esportivos nos Estados Unidos. Parte considerável da análise dos jogos – eu diria que a maioria – é dedicada a estatísticas e números. No beisebol, então, chega a ser doentio: os caras falam do percentual de acertos de um rebatedor contra lançadores canhotos em jogos diurnos e com ventos de até 15 km por hora. Já o futebol é um esporte à prova de estatísticas: um time pode dar um chute a gol e ter 5% de posse de bola, e vencer um adversário que deu 78 chutes a gol.
Americano é obcecado pelo sucesso individual – Nem uma vitória dramática no último minuto arranca mais lágrimas nos Estados Unidos do que a história de um personagem solitário que obtém algum feito extraordinário. Um exemplo: em 1995, o país todo chorou quando Cal Ripken Jr., do time de beisebol Orioles, de Baltimore, bateu o recorde de jogos consecutivos disputados – 2130 – que pertencia, desde 1939, ao lendário Lou Gehrig, do New York Yankees. Não importava se o Orioles era um time mediano. O povão só queria saber de Ripken. Em 1999, esse “feito” foi escolhido, por fãs de todo o país, o “maior momento do beisebol do século 20”. Já no Brasil, o recorde de Rogério Ceni, que em 2013 bateu a marca de Pelé de jogos disputados por um mesmo time, chegando a 1117 jogos com a camisa do São Paulo, foi bastante comentado, mas sem um milésimo do fuzuê que os americanos fizeram para Ripken.
O futebol endeusa a “arte”; os Estados Unidos, o resultado – Sem tocar na bola, Pelé dá um drible no goleiro uruguaio Mazurkiewicz. O Rei pega a bola do outro lado e chuta, mas ela passa raspando a trave. A jogada é reprisada pela milionésima vez na TV, e qualquer um que ame futebol a assiste de novo, de boca aberta. Mas não há, no esporte norte-americano, jogada bonita que não termine em ponto ou bloqueio. Nenhuma TV reprisa uma “quase” cesta de Larry Bird, Michael Jordan ou Magic Johnson, mesmo que a jogada tenha sido espetacular. A beleza só é recompensada quanto útil. Não há espaço para futilidades no esporte do Tio Sam. Ou a beleza tem resultado prático, ou é desprezada.
P.S.: Sensacional o chaveamento das semifinais da Copa. Amanhã escreverei sobre os jogos. Mesmo torcendo contra a seleção da CBF, deu pena ver o Neymarketing chorando e saindo de maca do gramado. Deve ser a maior frustração do mundo para um jogador ficar de fora da Copa por contusão, especialmente na fase final da competição. E muito bonitas as manifestações de Messi, Podolski e outros adversários, desejando pronta recuperação ao brasileiro.
P.S.2 - Estarei fora por boa parte do dia. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço um pouco de paciência. Desculpem pelo incômodo.
The post FUTEBOL NA AMÉRICA? NO, THANKS! appeared first on Andre Barcinski.