Em 1991, o canadense Douglas Coupland lançou o romance “Geração X – Contos Para Uma Cultura Acelerada”. O livro foi um fenômeno cultural: não só vendeu muito, como ajudou a eternizar a expressão “geração X”, a massa de jovens que chegou à idade adulta nos anos 90.
Coupland virou uma espécie de porta-voz de uma geração meio perdida em meio à globalização e a inovações tecnológicas que mudaram o mundo no fim do século 20. Pelos últimos vinte e tantos anos, escreveu outros 13 romances, todos lidando, de formas diversas, com a modernidade, a tecnologia e o consumismo.
O que muita gente não sabe é que, antes de ser escritor, Coupland era designer e artista plástico. Sua carreira na literatura começou por acaso: um dia, mandou um cartão-postal de Tóquio, onde trabalhava como designer, para uma amiga. O marido da amiga, que era editor de uma revista, leu, gostou do estilo e convidou Coupland para escrever.
Hoje, ele divide o tempo entre livros e o trabalho para museus e escolas de arte canadenses. Em maio, estreou em Vancouver a obra “Gumhead”(“Cabeça de Chiclete”), uma escultura imensa de sua própria cabeça, que ele pede ao público que cubra de chiclete. O trabalho está em exposição no CCBB de São Paulo.
Fiz uma entrevista com Coupland para a “Folha”. Por restrição de espaço, publiquei apenas alguns trechos. Aqui vai o papo completo:
- Só vi “Gumhead” em fotografias. Qual foi a inspiração para a obra?
- Foi um projeto que fiz há seis anos, quando dei chiclete a 40 mil estudantes canadenses para que eles construíssem uma torre de chiclete. Faço muito trabalho em museus e escolas de arte e lido com a questão da descaracterização em todas as suas formas. Acho fascinante o que acontece quando o “id” é liberado em um objeto superpúblico. Recentemente, tenho feito vários trabalhos com cabeças grandes, daí decidi juntar tudo numa obra só.
- Como foi a reação do público de Vancouver à obra?
- As pessoas amaram. Há um artigo adorável sobre isso no jornal canadense “The Globe and mail” (leia aqui, em inglês).
- O resultado foi o que você esperava?
- Eu esperava que fosse interessante, mas não bonito. E ficou bonito demais.
- Nas fotos que vi, o rosto da escultura não ficou escondido pelo chiclete, como você disse que esperava...
- As pessoas não só colaram chiclete em tudo, mas modificaram as feições da escultura, colorindo os olhos e adicionando sobrancelhas. Antes de as pessoas começarem a cobrir a escultura de chiclete, ela parecia muito o Lênin!
- No Brasil, você é mais conhecido como autor do que artista plástico. Que reação espera do público brasileiro à sua obra?
- Tudo que você pode desejar com a arte é expandir a noção do espectador do que é possível.
- Vamos falar um pouco sobre seus livros: o subtítulo de seu primeiro romance é “Contos para Uma Cultura Acelerada”. O que você pode dizer sobre a velocidade de nossa cultura hoje? Faz seus personagens da Geração X parecerem tartarugas?
- É engraçado como, naquela época, precisávamos de pouco para que vida parecesse fora de controle. Basicamente, o que fazemos hoje, enquanto cultura, é sentar e absorver onda após onda de tecnologias logarítmicas, que aniquilam qualquer conceito prévio de política, religião e individualidade. A verdade é que 1991 não foi nada perto disso.
- Quando você lê seu primeiro romance, mais de duas décadas depois de tê-lo escrito, o que sente?
- As emoções estão todas ali, então não mudou. Até um livro sobre o “ultra-extremo-presente” como “Microserfs” (romance de 1995, cujos personagens trabalhavam para a Microsoft) mantém a atualidade, pelas mesmas razões. E as pessoas gostam de ler esses livros como se fossem cápsulas do tempo.
- Como você explica o impacto do livro?
- Para muitas pessoas, foi a primeira vez que viram suas vidas interiores descritas.
- Como você compara o processo criativo de escrever um livro e fazer uma obra de arte?
- Livros existem no tempo, e arte existe no espaço. Você precisa ler um livro inteiro, mas eu ‘saco’ uma pintura em três segundos. As sensações são muito diferentes. Escrever um livro me coloca num transe que dura 24 a 36 meses.
- Li em uma entrevista que você mora no meio do mato (Coupland vive com seu companheiro em uma área de florestas perto de Vancouver).
- Sim, vivo.
- Isso é meio surpreendente, já que tantos de seus livros e obras lidam com a tecnologia, o futuro, e os efeitos do consumismo...
- Foi ali que cresci, então, nesse aspecto, sou antiquado. Mas, com acesso à Internet, a natureza se torna uma realidade revisada. É ainda a natureza, ou algo completamente novo?
P.S.: Contagem regressiva: amanhã sai nos Estados Unidos "Perfidia", primeiro romance de James Ellroy em cinco anos. Já encomendei meu ebook e escreverei sobre o livro aqui em breve. Muito breve.
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