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O FILME QUE “PSICOSE” DESTRUIU

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Já escrevi bastante aqui no blog sobre filmes que quase acabaram com as carreiras de seus respectivos diretores, como “Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia” (Sam Peckinpah), “Comboio do Medo” (William Friedkin) e “Cão Branco” (Samuel Fuller).

Foram filmes ousados demais e populares de menos, que prejudicaram as carreiras dos cineastas e dificultaram o financiamento de projetos posteriores, mas que acabaram redescobertos depois e hoje são clássicos.

Pode somar a essa lista “A Tortura do Medo” (“Peeping Tom”), de Michael Powell, que acaba de sair em DVD no Brasil.

Quando fez "A Tortura do Medo", em 1960, Michael Powell (1905-1990) era um dos diretores mais respeitados do cinema inglês, graças a sucessos como "The Life and Death of Colonel Blimp" (1943), "Os Sapatinhos Vermelhos" (1948) e "Os Contos de Hoffman" (1951), feitos em parceria com Emeric Pressburger (aliás, se você não viu “Os Sapatinhos Vermelhos”, assista de qualquer maneira, é um desses filmes inesquecíveis).

"A Tortura do Medo" conta a história de Mark Lewis (Carl Boehm), um aspirante a cineasta e membro de uma equipe de filmagem. Lewis é um sujeito tímido e calado, que vive sozinho e não tem amigos. Na verdade, é um poço de repressão sexual e neuroses, um assassino serial cuja obsessão é filmar as expressões de horror no rosto de suas vítimas.

Dizer que o filme foi mal recebido pela crítica não é justo; ele foi escorraçado. Os adjetivos eram de “nojento” pra baixo: um famoso crítico sugeriu jogar os negativos no esgoto; outro disse que era “mais nauseabundo e deprimente que colônias de leprosos no Paquistão”. Powell foi chamado de pervertido e doente. O filme saiu rapidamente de cartaz na Inglaterra e foi lançado nos Estados Unidos em pouquíssimas salas e cópias cortadas e em preto e branco.

Dois meses depois do lançamento de “A Tortura do Medo” na Inglaterra, Alfred Hitchcock lançaria outro filme sobre um assassino atormentado por neuroses de infância: “Psicose”. O sucesso deste acabou jogando ainda mais terra na cova do filme de Powell.

No início da década de 70, no entanto, uma cópia completa – e colorida - de “A Tortura do Medo” começou a circular nas escolas de cinema de Nova York. Um jovem Martin Scorsese assistiu, boquiaberto, e começou a falar sem parar sobre o filme. “Tudo que você precisa saber sobre a arte do cinema está em dois filmes: ‘Oito e Meio’, de Fellini, e ‘A Tortura do Medo’, de Michael Powell”. Anos depois, Scorsese iniciaria uma longa parceria com a editora Thelma Schoonmaker, que em 1984 casaria com Powell.

Hoje, “A Tortura do Medo” é considerado um clássico do terror psicológico. É um daqueles filmes - como “O Despertar da Besta”, de José Mojica Marins - em que você não sabe onde começa a loucura voyeur do personagem e termina a do diretor. Um pesadelo neurótico e atormentado, inundado de obsessões freudianas e tão perturbador quanto um “snuff movie” (filme de violência real), mesmo filmado em um tecnicolor saturado e artificial. De entortar a cabeça.

Bom fim de semana a todos.

P.S.: Estarei fora até o fim da tarde e impossibilitado de moderar comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência. Obrigado.

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