Quando publiquei minha lista dos melhores filmes de 2014, ainda não havia estreado “Ida”, do polonês Pawel Pawlikowski. E nenhuma lista estaria completa sem essa obra-prima.
“Ida” é um filme raro: fotografado em preto e branco (e em formato 1.33:1), vai na contramão da edição frenética e ritmo de videoclipe do cinema atual. Pawlikowski desacelera a narrativa e traz imagens estáticas, em que a câmera raramente se move. Isso nos obriga a ver cada fotograma como um quadro e prestar mais atenção nos pequenos detalhes – a ambientação da sombria Polônia sob jugo stalinista; a infelicidade das pessoas; a complexidade de duas personagens que, nas mãos de um diretor menos competente, poderiam virar caricaturas.
“Ida” se passa na Polônia no início dos anos 60. Num convento, uma noviça, Anna (Agata Trzebuchowska), é mandada por sua superiora visitar uma tia em Lodz. Anna nunca deixou o convento, e essa simples visita é uma aventura sem par em sua vida.
A viagem acaba por mudar a vida de Anna. A tia, Wanda (Agata Kulesza), é uma quarentona, juíza e membro do Partido Comunista, que tem sérios problemas com álcool e com homens.
A princípio, as duas se estranham: Anna é jovem, inocente e temente a Deus; Wanda é experiente, libertina, e não acredita em nada - nem no comunismo que, um dia, já defendeu a ponto de condenar gente à morte.
Wanda faz uma revelação chocante: o nome verdadeiro de Anna é Ida, ela é judia, e os pais foram mortos durante a ocupação nazista.
O filme vira um “road movie”, em que Ida e Wanda rumam para a pequena vila onde Wanda e a irmã, mãe de Anna, moraram antes da chegada dos alemães. Na jornada, encontram – e se interessam – por um saxofonista (Dawid Ogrodnik) e tentam descobrir como os pais de Anna morreram.
“Ida” é um filme curto – apenas 80 minutos – mas tão bem escrito, dirigido e atuado, que consegue tocar em muitos temas complexos. A contraposição de personagens tão distintos quanto Anna e Wanda cria tensão e faz surgir discussões sobre religiosidade, fé e prazer. A forma como Pawlikowski mostra os poloneses, vivendo o inferno do comunismo depois de experimentar o nazismo, consegue ser contundente sem ser panfletária: é um país cinza, onde vizinhos desconfiam de vizinhos, o medo é constante, e a liberdade passa longe.
Que sorte poder ver “Ida” em tela grande. Não perca a oportunidade.
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