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Trindade: crônica de 15 mortes anunciadas

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 Trindade: crônica de 15 mortes anunciadas
São 18h30 de domingo, e as informações sobre o terrível acidente com um ônibus em Trindade, no município de Paraty, ainda são confusas. O número de mortos pode ter chegado a 15, e o número de feridos, 57 (ou 66, de acordo com o jornal "O Globo").

O que posso afirmar, sem medo de errar, é que um acidente desses não é nenhuma surpresa.

Qualquer um que já tenha usado as estradas da região e o sistema de ônibus local sabe a roleta-russa que é isso aqui.

O acidente foi num local chamado Morro do Deus Me Livre, no caminho para Trindade. É uma estradinha de mão dupla, pessimamente sinalizada, com curvas angulosas e onde motoristas andam como alucinados.

Faz mais de um ano que o DNIT não corta o mato nos acostamentos da Rio-Santos. Há trechos onde o acostamento não existe mais, tendo sido totalmente tomado pelo mato, que esconde placas e provoca perigo para os motoristas. A Rio-Santos, pelo menos no trecho próximo a Paraty, não tem sequer faixas pintadas no asfalto.

Está muito cedo para saber as causas do acidente, mas posso afirmar uma coisa: os ônibus da Viação Colitur, que faz o transporte dentro do município, são velhos e invariavelmente lotados, especialmente num domingo de feriadão como hoje. A soma do número de vítimas fatais e feridos - entre 72 e 81, dependendo da fonte - mostra como o ônibus estava cheio.

Uso bastante o sistema de ônibus local e canso de ver absurdos: ônibus andando pelos acostamentos, fazendo ultrapassagens em locais proibidos e pegando passageiros fora do ponto; ciclistas andando à noite pela Rio-Santos sem nenhum tipo de iluminação ou sinalização; motoristas falando ao celular enquanto zunem a 120 por hora.

Os ônibus da viação Costa Verde, que fazem o trajeto Rio-Paraty-Rio, voam a mais de 100 km por hora, especialmente à noite. Já presenciei motoristas andando a toda velocidade na contramão da Rio-Santos para escapar de “pardais”.

Um posto da Polícia Rodoviária, localizado na Rio-Santos, a dois km de Paraty, está invariavelmente vazio, e só mostrou algum sinal de atividade nos dias que se seguiram ao atentado contra o prefeito, ocorrido em maio.

No meio da tarde de domingo, nosso celular começou a tocar com mensagens de amigos e conhecidos, pedindo ajuda para as vítimas. Todos que tinham carros maiores ou caminhonetes foram convocados para ajudar na remoção de feridos, já que o sistema de saúde local não dava conta.

Como o hospital local é uma VERGONHA, um prédio decrépito para onde nenhuma pessoa de bom senso gostaria de ser levada em caso de um problema, a imensa maioria dos feridos foi transferido para Angra ou Ubatuba.

Muita gente da cidade quis doar sangue, mas o local mais próximo ficava em Angra dos Reis, a 94 km.

Foi um domingo negro por aqui. Mas não foi nenhuma surpresa. A única coisa surpreendente é como uma tragédia dessas demorou tanto a acontecer.

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