“Love and Mercy”, a cinebiografia do líder do Beach Boys, Brian Wilson, deveria ter estreado no Brasil em agosto, foi adiado para setembro e agora tem nova data: 19 de novembro. Mas quem não aguentou a lerdeza da distribuidora já viu o filme no Cine Torrent.
O roteiro é do jornalista Alan Michael Lerner e do cineasta e roteirista Oren Moverman, um sujeito talentoso que dirigiu e escreveu (com James Ellroy) um de meus filmes prediletos dos últimos anos, “Um Tira Acima da Lei”, com Woody Harrelson.
Lerner e Moverman optaram por uma estrutura interessante e pouco convencional para contar a história de Wilson: o filme é dividido em duas partes – os anos 60 e os 80 – e o personagem é interpretado por dois atores. Paul Dano faz o Brian Wilson jovem e sonhador dos 60, e John Cusack interpreta o farrapo humano em que ele se transformou nos 80, depois de anos de abuso de drogas, remédios e espancamentos na mão do pai, um sádico chamado Murry.
O filme é até bonzinho com Murry. Ele aparece dando um tapa na cabeça de Brian (Dano), que causou surdez quase total em um dos ouvidos. Na cena, Brian é mostrado adolescente, mas na vida real as porradas começaram quando ele era apenas um bebê de dois anos de idade.
Quem quiser saber os detalhes mais brutais do relacionamento de Murry com os filhos Brian, Carl e Dennis, deve ler o capítulo sobre Brian Wilson na coletânea “The Dark Stuff”, do jornalista britânico Nick Kent. O livro, infelizmente, nunca saiu no Brasil.
Kent relata como Murry não só batia nos filhos com cintos e porretes, mas os submetia a torturas psicológicas apavorantes, trancando as crianças em armários escuros e outras barbaridades. Murry havia perdido um olho em um acidente industrial e era tão louco que tinha dois olhos de vidro, um “normal” para uso diário, e um vermelho, que usava quando acordava de ressaca, o que não era nada incomum. Também não tinha parte de uma orelha, arrancada pelo próprio pai, um sádico ainda pior que ele.
Dos três irmãos, Brian era quem mais sofria com a violência do pai, não só por ser o mais velho, mas por ser o mais sensível e carente. Toda sua obra – canções quase infantis em sua busca por amor e carinho – pode ser vista como um apelo desesperado pelo afeto que nunca teve em casa. Enquanto isso, Murry, que sonhara em ser um compositor de sucesso, tinha grande inveja do talento do filho e fazia questão de humilhá-lo e criticar suas músicas.
Sobre “Love and Mercy”, achei a metade interpretada por Paul Dano bem superior à de John Cusack. A primeira mostra o processo de composição das principais canções de Brian – “God Only Knows”, “Good Vibrations”. As cenas no estúdio, em que Brian era acompanhado por um grupo extraordinário de músicos chamado “The Wrecking Crew”, são demais (leia aqui um texto do blog sobre a Wrecking Crew).
Já a parte com John Cusack é mais dramática. Ali, Brian é dominado pela segunda figura paterna e nociva em sua vida, Eugene Landy (Paul Giamatti), um bandido com diploma de psicólogo que inventou um método terapêutico que consistia em controlar a vida de Brian 24 horas por dia e entupi-lo de remédios. Em pouco tempo, Landy havia se tornado empresário, consultor e até parceiro musical de Brian, que só conseguiu fugir do controle do médico com a ajuda de sua segunda esposa, Melinda (Elizabeth Banks).
Essa parte do filme se concentra na luta de Melinda para salvar Brian, e o tom melodramático lembra uma novela de TV. O filme foi aprovado por Brian, e certamente por isso evita mostrar passagens mais tristes de sua vida, como os três ANOS que passou deitado na cama, as overdoses de drogas e os inúmeros surtos psicóticos que sofreu. Apesar disso, “Love and Mercy” é um filme muito acima da média. Vamos torcer para que passe logo por aqui.
E por falar em Brian Wilson...
O dólar está pela hora da morte, então comece a economizar já.
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