O fim de semana foi uma tristeza só. Acompanhando as notícias dos massacres em Paris, a primeira conclusão é que ninguém está seguro em lugar algum do mundo.
Recentes atentados contra um avião russo no Sinai, em Beirute, e agora em Paris, mostram claramente uma tendência de internacionalização dos alvos do Estado Islâmico.
Das muitas horas de entrevistas e depoimentos que vi na TV, um momento me abalou especialmente: quando o grande jornalista David S. Rohde, da Reuters, disse à CNN que o “Estado Islâmico está ganhando a guerra”. Rohde, veterano de coberturas de combates, vencedor de dois prêmios Pulitzer e que passou sete meses sequestrado por terroristas do Taliban, explicou que, enquanto o Estado Islâmico tiver liberdade para treinar terroristas na Síria, será impossível pará-los.
A verdade é que a coalizão contra o Estado Islâmico, chefiada pelos Estados Unidos, não tem obtido grande sucesso no combate ao grupo na Síria, país devastado por uma guerra civil. Segundo analistas, a razão é simples: o grande objetivo norte-americano seria a derrubada do ditador sírio, Bashar al Assad.
Entrevistado por William Waack no programa “Painel”, da Globonews, o professor de Relações Internacionais da Faculdade Rio Branco, Gunther Rudzit, disse que a coalizão estava realizando cerca de 300 missões aéreas por semana contra o Estados Islâmico na Síria. “Só para comparar, quando os Estados Unidos queriam derrubar Saddam Hussein, realizavam 16 mil missões aéreas por semana”.
Depois que a Rússia, aliada de Bashar al Assad, começou a bombardear o grupo terrorista na Síria – e atingir também vários focos de opositores do ditador, é bom lembrar – a situação ficou ainda mais caótica.
Talvez a única consequência boa dos atentados de Paris seja uma trégua ideológica entre Putin, Obama e a coalizão, para um combate mais intenso e organizado contra o Estado Islâmico.
Mas acabar com as tropas terroristas na Síria seria só uma pequena parte da missão. Difícil também será identificar e exterminar as células extremistas infiltradas na Europa e outras partes do mundo. O fato de que três grupos fortemente armados e muito bem treinados executaram os massacres em Paris, uma das cidades mais vigiadas por grupos antiterroristas, prova que nenhuma cidade do planeta está livre do risco.
Um norte-americano especialista em antiterrorismo, entrevistado pela BBC, disse ser impossível vigiar com eficiência todos os milhares de indivíduos suspeitos de ligações com grupos extremistas morando na França. Ele explicou que isso demandaria um número de homens e uma logística que nenhum país possui. “Para fazer a vigilância presencial de alguém, ou seja, segui-lo dia e noite, são necessários vários agentes por indivíduo vigiado. É difícil também vigiá-lo virtualmente, porque ele pode ter inúmeros celulares e se comunicar por diversas maneiras diferentes. Há também a questão do idioma. Se o vigiado falar em árabe, significa que todos os agentes que participam da vigilância precisam conhecer a fundo o idioma”.
Resumindo: não estamos combatendo o Estado Islâmico como deveríamos na Síria e somos impotentes para evitar atentados em nossas próprias cidades. Quem diz que as Olimpíadas do Rio, ano que vem, não serão um alvo?
Enquanto isso, podemos esperar uma radicalização da xenofobia na Europa e a ascensão da extrema direita. É um círculo vicioso: quanto mais ataques terroristas, mais preconceito contra muçulmanos; quanto mais preconceito, mais jovens nos bairros muçulmanos de Paris ou de outras cidades estarão propensos à radicalização.
Seria bom lembrar que o Estado Islâmico e outros grupos terroristas, como a Al-Qaeda, matam muito mais muçulmanos do que não-muçulmanos (veja esta reportagem da CNN) e que grande parte das tropas que estão combatendo os terroristas na Síria são formados por seguidores do Islã. Mas é difícil esperar razão e sensibilidade da opinião pública, especialmente depois das cenas bárbaras em Paris.
E no meio da barbárie, que ironia terrível ver uma banda tão festiva e alegre quanto o Eagles of Death Metal no meio da carnificina, não? Escrevi uma matéria para a “Folha” (leia aqui), contando um pouco sobre a origem da banda e sua música escapista e divertida. Felizmente, Jesse Hughes e seus companheiros escaparam ilesos.
Para finalizar, muito boa a notícia de que a Conferência do Clima, a COP-21, não será cancelada ou adiada por causa dos atos terroristas. O encontro está marcado para o dia 30 de novembro na capital francesa e deve reunir mais de 100 chefes de Estado. É uma demonstração importante de que Paris, que já sobreviveu a invasões de vikings e nazistas, vai superar mais esse desafio.
P.S.: O assunto é tão importante que adiantei o texto que publicaria segunda. O blog volta com um texto inédito terça. Segunda, estarei fora boa parte do dia e com dificuldade para responder a comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência. Obrigado.
The post Nós sempre teremos Paris appeared first on Andre Barcinski.