Quem pega o táxi no Santos Dumont em direção à zona sul do Rio é presenteado com uma das paisagens urbanas mais bonitas do mundo: à direita, o Outeiro da Glória; à esquerda, a Marina da Glória; ao fundo, o Pão de Açúcar emoldurando os barquinhos que repousam na enseada de Botafogo. Um cenário deslumbrante.
Mas há uma imagem que destoa dessa maravilha toda: o Hotel Glória. Construído em 1922, o Glória foi comprado em 2008 pelo então bilionário Eike Batista, que recebeu uma bolada do BNDES – 50 milhões, de um total de 190 milhões aprovados - para deixá-lo pronto para a Copa do Mundo. Hoje, do velho hotel, só resta a fachada. Por dentro, o lugar está em ruínas. É uma analogia perfeita do próprio Eike: por fora, beleza e fleuma; por dentro, decrepitude.
Acabo de ler “Tudo ou Nada – Eike Batista e a Verdadeira História do Grupo X”, de Malu Gaspar, um relato detalhado da ascensão e queda de “Magic Eike”, como ele próprio gostava de se chamar.
São 545 páginas de falcatruas, números inventados, uso de informações privilegiadas, manipulações, relações escusas com o poder, falta de ética e muita, mas muita ostentação. A autora calcula o rombo deixado por Eike em 65 bilhões de dólares – “um colapso equivalente ao provocado no mercado financeiro americano pela quebra do Lehman Brothers ou pelo esquema fraudulento do banqueiro Bernard Madoff”.
Eike Batista é um dos maiores símbolos do Brasil-ostentação. O empresário surfou na ótima imagem do país na época da capa da “Economist”, da escolha do Brasil como sede de Copa e Olimpíadas e em Obama chamando Lula de “o cara”, e encarnou a imagem do brasileiro arrojado e vitorioso.
Mas era tudo fumaça. As empresas de Eike valiam muito menos do que ele apregoava. A comoção era tanta, e o otimismo cegou tanta gente, que poucos se deram ao trabalho de checar se as informações bombásticas sobre jazidas inesgotáveis de petróleo e montanhas de ouro eram verdadeiras ou pura invenção de um marqueteiro esperto e carismático.
Os políticos deram uma forcinha, claro: Sergio Cabral fartou-se de viajar nos jatinhos particulares de Eike e retribuiu conseguindo permissões e alvarás para obras; Lula tentou ajudá-lo como pôde, mesmo depois que o Império de Magic Eike começou a ruir.
O empresário contou também com a conivência, incompetência e falta de atitude das comissões que deveriam zelar pela lisura do mercado de ações. Todo mundo passou a mão na cabeça de Eikezinho e o deixou brincar à vontade – com o dinheiro dos outros.
Tão chocante quanto a descrição dos desmandos que botaram Eike abaixo é o perfil que Malu Gaspar faz do sujeito: vaidoso, egocêntrico, cafona – tinha Ferraris e Lamborghinis decorando a sala – e vítima de um intenso complexo de inferioridade do pai, o empresário Eliezer Batista. Eike é o estereótipo do novo-rico, elevado à enésima potência.
Em nenhuma das 545 páginas do livro se vê Eike fazendo uma coisa sequer que não tenha sido motivada pela obsessão em tornar-se o homem mais rico do mundo. Enquanto nos acostumamos a ver magnatas estrangeiros doando dinheiro para as ciências, as artes e a cultura, o brasileiro só dispensava sua grana em doações para puxar o saco de Madonna ou ganhar favores com políticos.
Se eu fosse acionista das empresas X e tivesse perdido as economias da vida inteira com os desmandos do ex-bilionário, não conseguiria terminar o livro, de ódio. E enquanto não sai o resultado do julgamento de Eike por manipulação de mercado e uso indevido de informação privilegiada, sugiro que os escombros do Hotel Glória sejam rebatizados de Hotel Magic Eike. Seria uma homenagem apropriada ao sujeito que fez a mágica de transformar um cartão-postal do Rio em ruína.
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