Muito triste começar o ano com uma notícia dessas, mas não dá para deixar passar em branco a morte de Nelson Ned, 66, um dos maiores ídolos românticos da música brasileira.
Admiro demais Nelson Ned. Não consigo pensar em um popstar no mundo que tenha superado adversidades físicas tão tremendas.
Nenhum brasileiro cantou para tanta gente no exterior. Ned se apresentava em estádios para 30 mil, 40 mil e até 80 mil pessoas no México, Venezuela, Colômbia e República Dominicana. Cantou duas vezes no Madison Square Garden e quatro no Carnegie Hall, em Nova York. Seus fãs iam do escritor Gabriel Garcia Márquez ao traficante Pablo Escobar.
Moacyr Franco e Nelson Ned por thevideos no Videolog.tv.
Há cerca de um ano, fiz uma longa entrevista com Ned para um livro sobre música brasileira dos anos 70, que sai no meio de 2014. Não vou publicar a entrevista na íntegra aqui para não estragar a surpresa do livro, mas selecionei alguns trechos marcantes.
A entrevista foi realizada num sítio em Cotia que pertence a Neuma, irmã de Nelson. Neuma tomava conta do cantor havia seis anos, desde que ele sofreu um derrame e foi confinado a uma cadeira de rodas. A dedicação de Neuma a Nelson era comovente.
Aqui vão alguns trechos da entrevista. Para quem quiser saber mais sobre a vida extraordinária de Ned, sugiro procurar em sebos a autobiografia “O Pequeno Gigante da Canção”.
- O senhor tem algum outro caso de nanismo na família?
- Nenhum. Minha família toda é normal. Tenho seis irmãos, Ned Helena, Nélia, Nedson, Neuma, Neide e Nelci, todos normais. Quando eu completei quatro meses de vida, meus pais começaram a perceber que havia algo errado em meu crescimento. Eu sofria de displasia espôndiloepifisária.
- Como seus pais reagiram?
- Foi um choque para eles. Imagine só em Ubá, em 1947, ninguém sabia dessas coisas. Minha mãe não se conformou e buscou apoio e explicação em várias religiões. Ela frequentou cultos católicos, kardecistas e orientais, como a Seicho-no-ie e a Perfeita Liberdade. Ela queria descobrir porque eu nasci desse jeito.
- O senhor acha o Brasil um país preconceituoso?
- O Brasil é a terra mais preconceituosa que conheço. O preconceito era contra o meu tamanho e contra meu estilo de música.
- A música romântica sofria preconceito?
- Muito, meu filho. Me chamavam de brega, de cafona, diziam que minha música era de péssima qualidade. Mas, quando eu ia ao exterior, me sentia respeitado, bem mais que aqui na minha terra.
- Mas o senhor tem muitos fãs no Brasil...
- Graças a Deus, tenho, sim. Mas eles nunca ligaram para o que a crítica e os intelectuais diziam sobre o meu trabalho.
- Sua condição física o atrapalhava na hora de cantar?
- Ah, não era fácil. Eu não podia me movimentar muito pelo palco, tinha de tomar muito cuidado para não perder o equilíbrio. Mas, por outro lado, as dificuldades me ensinaram a enfrentar qualquer plateia. Já cantei para 80 mil pessoas no México, sozinho num palco, e dominei o público.
- É verdade que o senhor tentou fazer parte do elenco do programa Jovem Guarda?
- É sim. Eu gostava de rock, gostava de Trini Lopez, e tentei participar do programa. Mas você acha que, num programa que só tinha bonitões tipo Roberto Carlos e Ronnie Von, iam deixar um anãozinho feio que nem eu participar?
- O senhor fez muito sucesso nos anos 70. Deu pra guardar uma grana?
- Ah, meu filho, eu era um homem muito orgulhoso e teimoso e fui dominado pela droga. Quase morri.
- Foi tão ruim assim?
- Foi. Eu cheirava cocaína o dia todo, só queria saber de sexo e droga. Quando eu penso naquele sujeito que só andava armado, com uma mulher em cada braço e o bolso cheio de cocaína, tenho até vergonha. Eu era um demônio.
- Como o senhor gostaria de ser lembrado?
- Como um homem que amou muito intensamente.
P.S.: A pedido dos leitores, o R7 mudou a seção de comentários do blog. Agradeço muito à equipe técnica do R7. Por favor, testem a nova seção de comentários e, se tiverem qualquer sugestão para melhorá-la, por favor, mandem.
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