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Se você quer incentivar um adolescente a ler bons livros, sugiro presenteá-lo com uma cópia de "O Velho e o Mar", de Ernest Hemingway. A vida dele mudará para sempre. Sei disso porque a minha mudou quando ganhei o livro, há mais de 30 anos.
Dia desses, para passar as horas em uma tediosa viagem de ônibus, decidi reler a história pela enésima vez. Continua tão emocionante como da primeira leitura.
"O Velho e o Mar" foi o último romance de Hemingway. Ele começou a escrever em 1951, em Cuba. O livro saiu no ano seguinte e ganhou o Pulitzer em 1953, oito anos antes de Hemingway se matar com um tiro de rifle.
É um livro curto - pouco mais de 120 páginas - e que pode ser lido em menos tempo do que você gasta vendo um filme de Michael Bay. É difícil imaginar algo mais proveitoso para fazer com duas ou três horas da sua vida.
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O personagem principal de "O Velho e o Mar" é um pescador octogenário chamado Santiago. Quando a história começa, Santiago está em meio a uma onda de azar, sem capturar um peixe há 84 dias. Seu pupilo e amigo, o jovem Manolin, é forçado pelos pais a abandonar o mestre e vai pescar com outro barco. Numa madrugada, Santiago sai sozinho pelas águas da costa cubana, torcendo para acabar com sua maré de azar.
A sorte muda para Santiago no 85o dia, quando ele fisga um marlim gigante. O peixe é tão poderoso que arrasta a canoa de Santiago por dois dias e duas noites na direção do horizonte.
Quase a totalidade da história é passada dentro da canoa. O velho pescador e o peixe começam uma batalha mental para derrotar o adversário. Santiago analisa a angulação da linha no mar e a velocidade da canoa para tentar adivinhar o grau de cansaço do peixe. Já este faz de tudo para se livrar do anzol: muda de rota, dá saltos espetaculares e busca águas mais profundas para tentar afundar a canoa.
Não vou contar mais. Leia. Você vai agradecer depois.
"O Velho e o Mar" talvez seja o trabalho em que Hemingway levou mais a ferro e fogo o seu "Princípio do Iceberg", uma teoria segundo a qual o que não é dito numa história pode ser tão importante quanto o que é dito.
Escreveu Hemingway: "Se um autor de prosa conhece suficientemente o tema sobre o qual está escrevendo, ele pode omitir certas coisas que sabe, e o leitor, se o escritor estiver escrevendo de maneira verdadeira, vai sentir essas coisas tão fortemente quanto se o escritor as tivesse escrito. A dignidade do movimento do iceberg só existe porque apenas um oitavo dele está fora d'água. Um escritor que omite coisas porque não as conhece apenas cria lugares vazios em sua escrita."
O personagem de Santiago é uma criação genial dessa teoria. Hemingway não gasta muito tempo descrevendo-o e não conta o seu passado, deixando muito à imaginação do leitor. Mas há pelo menos duas passagens extraordinárias em que o pescador recorda fatos de sua vida. Na primeira, ele conta a Manolin sobre leões que viu em uma viagem à África. Na segunda, está falando sozinho, extenuado pelo esforço de sua batalha contra o peixe, e recorda outra batalha, uma queda de braço de 24 horas que teve com "o grande negro de Cienfuegos".
Essas duas imagens - os leões que Santiago vê de cima do mastro do navio e o negro imenso com quem ele passa um dia medindo força - já renderiam, sozinhos, dois livros inteiros e fazem o leitor pensar em quem é esse tal de Santiago. De onde veio? Em que acredita? Como terminou a vida pescando sozinho numa canoa?
Quando li "O Velho e o Mar" pela primeira vez, curti mais a "aventura" da história, a narrativa de um velhinho brigando contra um peixe de seis metros, as descrições emocionantes das criaturas marinhas com quem Santiago se depara e dos perigos que ele enfrenta no mar. Com cada releitura, o texto foi mudando de significado, e comecei a perceber coisas e sensações que não havia percebido antes. Talvez o iceberg esteja, pouco a pouco, se revelando.
P.S.: Estarei fora o dia todo e impossibilitado de moderar comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência.
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