É o fim de uma era.
Depois de 63 anos, o semanário inglês “New Musical Express”, uma das publicações mais importantes da história da música pop, anunciou que deixará de ser vendido e passará a ser distribuído de graça.
A partir de setembro, cerca de 300 mil exemplares serão dados em lojas, estações de trem e metrô, lojas de discos e universidades.
Quem poderia imaginar que, um dia, o "NME" teria o mesmo valor de folhetos de promoção de supermercados ou anúncios imobiliários?
Como diria o Prince: sinal dos tempos.
É mais uma vitória da tese suicida e burra segundo a qual informação nasce em árvore e não vale nada. Enquanto isso, supostos arautos da liberdade de informação, como Zuckerberg e o Google, que vivem de explorar conteúdo e opinião criados por outros, comemoram. Parabéns a todos os envolvidos.
O “New Musical Express”, ou “NME”, tem uma história e tanto. Criado em 1952, foi o primeiro jornal a publicar uma parada de discos na Inglaterra, ajudou a popularizar Beatles, Stones e Kinks, foi citado por Johnny Rotten em “Anarchy in the UK” (“I use the e-ne-my”, ou “N-M-E”), defendeu o punk e o pós-punk, lançou duas fitas cassete fundamentais do indie rock inglês, “C-81” e “C-86”, criou o termo “Britpop”, azedou a briga Blur-Oasis, brigou com Morrissey, ajudou a popularizar o Nirvana na Europa e foi fundamental na explosão da cena dance inglesa dos anos 90.
Nessa trajetória, lançou críticos e jornalistas como Nick Kent, Charles Shaar Murray, Ian MacDonald, Julie Burchill, Tony Parsons, Paul Morley, Ian Penman, Barney Hoskyns, Steve Lamacq, Paolo Hewitt e muitos outros. Músicos como Mick Farren (Deviants) e Chrissie Hynde (Pretenders) também escreveram para o semanário.
Nos últimos meses, a circulação do “NME” não chegava a 16 mil exemplares. Chegou a vender 300 mil por semana, primeiro na época de ouro dos Beatles, em meados dos anos 60, e uma década depois, quando o editor Alan Smith pegou um jornal decadente e abriu espaço para que talentos como Nick Kent e Ian MacDonald escrevessem textos definitivos sobre a música pop (se você lê inglês, recomendo fortemente “The Dark Stuff”, coletânea dos textos de Kent, e “Revolution in the Head”, de MacDonald, análise de toda a obra dos Beatles, música a música).
Para saber mais sobre a história do “NME” e da imprensa musical, sugiro a leitura de “The History of the NME”, de Pat Long, e “In Their Own Write – Adventures in the Music Press”, de Paul Gorman. O primeiro é um relato detalhado da trajetória do “NME”, e o segundo é ainda melhor e mais abrangente, reunindo entrevistas com dezenas de pesos-pesados da crítica musical inglesa e norte-americana como Jon Savage, Ian MacDonald, Richard Metzger, Nick Logan, Vivien Goldman, Caroline Coon, Lisa Robinson, Lenny Kaye e muitos outros.
Bons tempos.
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