Quantcast
Channel: Andre Barcinski
Viewing all articles
Browse latest Browse all 575

“Aliança do Crime” desperdiça uma grande história

$
0
0

James "Whitey" Bulger é um dos personagens mais fascinantes da história criminal norte-americana.

De 1975 a 1994, "Whitey", um descendente de irlandeses, comandou o crime em Boston, dominando a venda de drogas, apostas, agiotagem, vendendo proteção a comerciantes e eliminando todos os inimigos e competidores, que acabavam invariavelmente enterrados num matagal embaixo de uma ponte da região.

Mas "Whitey" não fez isso sozinho. Como revelou o jornal "The Boston Globe"em uma série de reportagens publicadas em 1994, Bulger contou com um aliado valioso: o FBI.

John Connoly, um agente do FBI - e amigo de infância de Bulger - procurou o bandido em meados dos anos 70 com uma oferta que ele não podia recusar: Bulger revelaria segredos da poderosa máfia italiana que então controlava Boston, e o FBI, depois que prendesse seus líderes, deixaria Bulger em paz.

Foi o que aconteceu: Connoly virou herói ao prender o clã dos Patriarca, que há décadas dominava o crime na cidade, e seu amigo Bulger e sua gangue, a White Hill, viraram os poderosos chefões.

A história é incrível e foi contada em detalhes no ótimo documentário "Whitey", de Joe Berlinger, que está disponível no Netflix brasileiro (leia aqui um texto que fiz sobre o filme). Também inspirou o personagem de Jack Nicholson em "Os Infiltrados", de Martin Scorsese.

Acaba de sair uma versão ficcionalizada da história de Bulger, "Aliança do Crime" ("Black Mass"), dirigida por Scott Cooper ("Coração Louco") e com Johnny Depp no papel principal. Infelizmente, o filme é uma decepção.

Em vez de tratar a história do acordo entre Bulger e o FBI como um mistério - até hoje, Bulger jura que não era informante - o diretor Cooper optou por estabelecer essa aliança bem no início do filme, o que tira muito da surpresa da trama. No filme de Scorsese, por exemplo, o espectador passa o tempo todo se perguntando como o personagem de Nicholson consegue se safar de tantos problemas com a lei, até descobrir, no fim, que ele trabalha para o FBI. O resultado é surpreendente e impactante.

Já em "Aliança do Crime", não existe a surpresa. Pelo contrário: TODO MUNDO no escritório do FBI fala de Bulger como um "parceiro", o assunto é comentado em voz alta e na presença de todos os funcionários. É impossível acreditar que os rivais de Bulger - e seus comparsas - também não soubessem.

O que resta é um filme de gângster comum - sangue, traições, brutalidade - mas sem nenhum embate moral ou tensão psicológica.

É difícil imaginar o que passou pela cabeça de Bulger ao decidir colaborar com a lei, mas esse conflito é resolvido, no filme, em um minuto, como se fosse coisa pouca.

"Aliança do Crime" é uma grande história que não mereceu um filme à altura.

Bom fim de semana a todos.

The post “Aliança do Crime” desperdiça uma grande história appeared first on Andre Barcinski.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 575