O primeiro show de David Bowie ninguém esquece. O meu foi em 20 de setembro de 1990, na Praça da Apoteose, no Rio. Era a estreia de Bowie em palcos brasileiros e o primeiro concerto na América do Sul da turnê "Sound + Vision" ("Som e Visão"), em que Bowie revisitava os maiores sucessos da carreira.
A única reclamação do público foi que o show teve bastante "sound", mas nenhuma "vision", já que a imensa tela de projeção, uma das grandes atrações da turnê, não foi usada. Mesmo assim, foi uma emoção incrível ver Bowie, de camisa branca de mangas compridas e gola bufante, acompanhado de uma banda de apenas cinco integrantes (incluindo o guitarrista Adrian Belew, do grupo King Crimson), tocar um repertório que incluiu "Rebel Rebel", "Ziggy Stardust", "Changes", e que foi encerrado com uma versão de "Gloria", do grupo Them.
Na época, Bowie jurou que aquela seria a última vez que tocaria a maioria daquelas canções. Felizmente, ele descumpriu a promessa.
Meu encontro seguinte com Bowie foi em 9 de janeiro de 1997, no Madison Square Garden, em Nova York. Era um show muito especial, a comemoração dos 50 anos do Camaleão, e um elenco de peso foi convidado para a festa: Foo Fighters, Sonic Youth, Robert Smith (The Cure), Frank Black (Pixies) e Billy Corgan (Smashing Pumpkins) subiram ao palco para tocar com Bowie.
De repente, Bowie chamou um amigo querido e herói da contracultura nova-iorquina: "O rei de Nova York, senhor Lou Reed!", e o lugar quase veio abaixo. Os dois emendaram "Queen Bitch", de Bowie, e três clássicos de Reed, "Waiting for the Man", "Dirty Boulevard" e "White Light White Heat".
Revendo essa cena no Youtube, é impossível não lembrar que esses dois "Transformers" partiram com pouco mais de dois anos de intervalo, deixando Iggy Pop sozinho como o último sobrevivente da geração de iconoclastas que nos salvou do otimismo hippie.
Pouco mais de dois anos depois, em 19 de novembro de 1999, uma assessora da gravadora Virgin me convidou para um show no Kit Kat Klub, um teatro de mil lugares em Nova York: "Não posso dizer quem vai tocar, mas sugiro que você não perca". Era Bowie, em turnê promocional - e secreta - de seu álbum "Hours".
Ver David Bowie num palco a poucos metros de distância foi uma experiência marcante. A banda era sensacional - Gail Ann Dorsey no baixo, Sterling Campbell na bateria, o grande Page Hamilton, da banda Helmet, na guitarra - e o repertório misturava músicas novas, clássicos habituais dos shows de Bowie, como "Life on Mars?" e "Ashes to Ashes", e canções que ele não tocava com tanta frequência, como "Always Crashing in the Same Car" (do álbum "Low", de 1977), "Drive-In Saturday" (de "Aladdin Sane", 1973) e "Repetition" (de "Lodger", 1979).
Foi uma noite rara e que nunca vou esquecer.
P.S.: Fiz esse texto para a "Folha" mas, por motivo de espaço, foi publicado em versão reduzida. Esta é a versão completa.
The post Bowie em três shows appeared first on Andre Barcinski.