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JAGUAR: “QUANDO EU BEBIA, NÃO TINHA AMNÉSIA”

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Jaguar  JAGUAR: “QUANDO EU BEBIA, NÃO TINHA AMNÉSIA”

Na noite de quarta, na FLIP, os humoristas Hubert e Reinaldo, do “Casseta”, entrevistaram o cartunista Jaguar, 82, na mesa “Millôrmaníacos”. Jaguar foi convidado para falar de Millôr, seu amigo desde os anos 50, mas acabou também contando várias histórias engraçadas sobre sua própria vida. Selecionei os melhores trechos do papo:

“Quando comecei a desenhar, nos anos 50, cartunista não era profissão. Eu dizia que era cartunista e a pessoa achava que eu fazia cartões. Mas até hoje não sei desenhar direito, sou o único cartunista que não faz caricatura, copio todas do Chico Caruso.”

“Fiz um teste para cartunista da ‘Manchete’. Foram aprovados três: eu, do Rio, o Borjalo, de Minas, e o Brandão, de Porto Alegre. Eu era bancário na época e disse pro Brandão que era melhor ele fazer teste pro Banco do Brasil, porque ninguém podia viver de cartum. Resultado: o Brandão virou bancário. Muitos anos depois, fui lançar um livro em Barcelona e encontrei o Brandão lá. Ele era gerente da filial do Banco do Brasil em Barcelona, tava muito melhor que eu!”

“Quando eu bebia, não tinha amnésia; agora que parei, sofro de amnésia abstêmica, não lembro de mais nada.”

“A repressão aqui no Brasil era a maior esculhambação. Lembro que os milicos prenderam um monte de gente e foram prender o Millôr, mas o carro tava lotado e deixaram pro dia seguinte. Daí o Ferreira Gullar soube e ligou pro Millôr, que se escondeu na casa do sogro.”

“Quando o pessoal do ‘Pasquim’ foi preso, por alguma razão, não me pegaram. Daí me escondi na casa do Flávio Cavalcanti, que era o maior apoiador do golpe. Era o melhor lugar: ninguém ia me procurar na casa do Flávio. E foi melhor ainda, porque fiquei escondido junto com a Leila Diniz.”

“É até estranho dizer isso, mas nunca fui tão feliz quanto no tempo em que fiquei preso na Vila Militar. Passava o dia todo sem fazer nada, nem banho eu tomava. Fiquei três meses lá. Consegui ler uns livros que nunca achei que terminaria. Li ‘Guerra e Paz’ inteirinho. Onde mais alguém poderia ler ‘Guerra e Paz’ sem ser na cadeia? Também tentei ler ‘Ulysses’, mas só cheguei na página 15. Era tradução do Antônio Houaiss. E o Ivan Lessa odiava a tradução: ‘Você liga pro Joyce e tem o Antônio Houaiss na linha.’”

Sobre a história de Millôr ter inventado o frescobol: “O Millôr dizia que gostava de frescobol porque era um jogo sem vencedor e sem vencido, mas isso é conversa dele. A verdade é que ele não tolerava perder nunca. Millôr achava que perder era coisa pro Federer, pro Nadal, mas não pra ele.”

“Millôr odiava o Tarso de Castro, que era muito amigo do Chico Buarque, então o Millôr vivia falando mal do Chico. Um dia, eu estava com o Millôr num bar, quando o Chico chegou e foi tirar satisfação. Teve uma discussão, o Chico cuspiu no Millôr, que jogou tudo que tinha na mesa – incluindo a moça com quem ele estava – em cima do Chico. No dia seguinte, fiz uma notinha dizendo, sem citar nomes: ‘O maior músico brasileiro e o maior cartunista brasileiro saíram no tapa num bar.’ E comecei a ouvir de um monte de gente: ‘Que história é essa, que o Ziraldo saiu na porrada com o Martinho da Vila?’”

 

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ATÉ BREVE, ALLAN JONES!

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allanandlou040613w ATÉ BREVE, ALLAN JONES!

É o fim de uma era. Depois de 17 anos, Allan Jones, criador, fundador e editor da “Uncut”, uma das melhores revistas de música, cinema, livros e cultura pop que já existiu, foi substituído no comando da publicação pelo jornalista John Mulvey.

Jones, 65, fundou a “Uncut” em 1997, depois de trabalhar na revista “Melody Maker” desde 1974. Seus textos, que misturavam conhecimento enciclopédico de música, humor anárquico e a atitude “gonzo” de sempre fazer parte da matéria que estava cobrindo, fizeram dele um herói para muita gente.

Por 40 anos, Jones farreou, bebeu, cheirou e cometeu incontáveis pecados ao lado de entrevistados. Quase apanhou de Lou Reed e sua então namorada, um travesti chamado Rachel; desmaiou de tanto beber pinga com Keith Moon e irritou tanto o Pink Floyd com a crítica de um show que, no dia seguinte, a banda dedicou uma música a ele: “Essa é para Allan Jones, da ‘Melody Maker’”, disse Roger Waters. ‘Se chama ‘Run to Hell’ (‘Corra pro Inferno’), e eu sugiro que ele faça justamente isso.’”

Por muito tempo, Jones assinou a coluna “Stop Me If You Think You’ve Heard This One Before”, textos hilários sobre os bastidores de entrevistas com artistas famosos. Era minha seção favorita na “Uncut”. A coluna era mais reveladora que a maioria das entrevistas, porque Jones colocava o leitor onde ele nunca esteve e mostrava o que rolava por trás das reportagens: as maquinações dos assessores de imprensa, o ego inflado dos artistas e a arrogância dos executivos.  Muitas histórias terminavam com o autor enchendo a cara com os músicos ou brigando com algum diretor de gravadora.

Jones conta que teve a ideia de criar a “Uncut” em 1997, quando estava de saco cheio do britpop, foi a Nashville entrevistar a banda de alt-country Lambchop e teve uma epifania: o que ele, quase cinquentão, estava fazendo na “Melody Maker” escrevendo sobre Blur e Oasis, bandas que desprezava e não entendia? “Eu estava envelhecendo e queria escrever sobre os artistas que gostava”. A ideia era fazer uma revista não só de música, mas que falasse também de cinema e literatura.

Em junho de 1997, saiu o primeiro número da “Uncut”, com Elvis Costello na capa. O número dois tinha Steve McQueen. Comprei a minha primeira em 98 – com Morrissey  – e não parei mais. Jones começou a lançar, a cada edição, um CD que vinha de graça com a revista. A mais famosa dessas compilações foi “Sounds of the New West”, de 98, que apresentou a muita gente Josh Rouse, Calexico, Handsome Family, Willard Grant Conspiracy e outros. Não é exagero dizer que esse disco ajudou muito a popularizar o alt-country entre fãs de rock alternativo.

Allan Jones também ficou conhecido por ter sido autor da célebre entrevista com Todd Rundgren na “Melody Maker”, em que o músico esculhambava John Lennon, dizendo que ele era um revolucionário de araque e um “poseur”. Lennon depois respondeu aos ataques, numa carta bem humorada para a “Melody Maker”. Foi a leitura dessa entrevista de Rundgren, anos depois, que levou Mark Chapman a perseguir – e matar – John Lennon (a história toda, em inglês, você confere aqui).

Allan Jones deixa a "Uncut" no momento em que a revista vende metade dos 11o mil exemplares que vendia nos anos 90. Em sua última coluna, Jones diz que vai tirar férias, o que não faz desde 75. Espero que ele volte logo e publique um livro de memórias. Compro na hora.

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PAVÕES MISTERIOSOS POUSAM EM SÃO PAULO, RIO E FORTALEZA

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raul seixas 1363449037608 639x300 PAVÕES MISTERIOSOS POUSAM EM SÃO PAULO, RIO E FORTALEZA

Semana que vem começam os lançamentos de meu novo livro, “Pavões Misteriosos: 1974-1983: A Explosão da Música Pop no Brasil”.

O primeiro será em São Paulo. Quarta, dia 13 de agosto, de 18h30 às 21h, haverá sessão de autógrafos na Livraria Cultura do Conjunto Nacional (Av. Paulista, 2073, esquina com Augusta).

Um dia antes, na terça, 12 de agosto, participo com os amigos André Forastieri (“O Dia em que o Rock Morreu”) e Ricardo Alexandre (“Cheguei Bem a Tempo de Ver o Palco Desabar”) do debate “Música para Ler”, sobre jornalismo musical. Será às 19h, no MIS (Av. Europa, 158), com entrada franca. Os interessados devem retirar a senha com uma hora de antecedência na recepção do MIS. Os livros de todos os autores estarão à venda no evento.

Dia 23 de agosto, sábado, estarei em Fortaleza para um debate no Laboratório de Música do Porto Iracema das Artes. E o lançamento no Rio de Janeiro será na quarta, 27 de agosto, na Livraria Travessa do Shopping Leblon, onde participo de um debate com Ritchie, às 19h, seguido de sessão de autógrafos, às 20h.

Muita gente tem perguntado como é o livro, por que concentrei a narrativa entre os anos de 1974 a 1983 e outras questões pertinentes. Achei que seria legal fazer aqui um resumo de “Pavões Misteriosos” para que os leitores possam ter uma ideia melhor do que vão encontrar.

É um livro curto – 240 páginas – e dividido em dez capítulos, um para cada ano de 1974 a 1983. Os anos não foram escolhidos à toa: 1974 foi o primeiro em que um LP de artista estreante (“Secos e Molhados”, lançado em 73) terminou como o disco mais vendido do Brasil, batendo Roberto Carlos e os astros da música romântica. E 1983 foi o ano da consagração de Ritchie, popstar que bateu em vendas tanto Roberto Carlos quanto o “Thriller” de Michael Jackson. Entre Secos e Molhados e Ritchie, tento contar como a música jovem dominou o Brasil.

Escolhi um tema principal para cada capítulo. O de 1974, por exemplo, conta como tantos discos “estranhos” – “Secos e Molhados”, “Gita” (Raul Seixas), “A Tábua de Esmeralda” (Jorge Ben), “Racional” (Tim Maia), “Lóki” (Arnaldo Batista) e outros chegaram às lojas quase simultaneamente, e explica o processo de crescimento absurdo da indústria do disco após o Milagre Econômico. O capítulo de 1978 fala de Sidney Magal, Gretchen e outros ídolos “fabricados” por produtores, além do domínio impressionante da discoteca nas paradas de sucesso do país.

Entre os temas abordados no livro estão o jabá em rádio e TV, o sucesso dos discos de novela, a popularização das rádios FM, o fenômeno dos “falsos gringos” (brasileiros que cantavam em inglês), o sucesso de Sullivan & Massadas, a explosão da música infantil com Xuxa e A Turma do Balão Mágico e a diminuição de elencos pelas gravadoras, no fim dos anos 70, que deixou muitos artistas sem casa.

Fiz cerca de uma centena de entrevistas com 65 pessoas, de artistas (Rita Lee, Fagner, Guilherme Arantes, Odair José, Sidney Magal, Lulu Santos, Sullivan, Massadas, Ritchie) a produtores (Mazzola, Roberto Menescal, Guto Graça Mello, Roberto Livi, Hélio Costa Manso, Pena Schmidt) e executivos de gravadora (Andre Midani, Antônio Paladino).

De todas as histórias do livro, a mais surpreendente para mim foi a do grupo Os Carbonos, formado por três irmãos paulistanos. Entre meados da década de 60 e o fim dos anos 90, Os Carbonos foi a banda de estúdio mais procurada de São Paulo e participou, muitas vezes anonimamente, de gravações famosas do pop brasileiro, como “Feelings”, “Fuscão Preto”, “É o Amor” e “Domingo Feliz”, entre outras.

Assim que eu tiver informação sobre lançamentos em outras cidades, aviso. Estão todos convidados.

foto 1 PAVÕES MISTERIOSOS POUSAM EM SÃO PAULO, RIO E FORTALEZA

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PRESIDENTE, QUE TAL UM MERGULHINHO NA BAÍA DE GUANABARA?

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nuzman 8 PRESIDENTE, QUE TAL UM MERGULHINHO NA BAÍA DE GUANABARA?

Num país onde homens públicos têm por hábito dar declarações revoltantes, algumas conseguem ser mais revoltantes que outras.

Anteontem, o presidente do Comitê Organizador da Olimpíada do Rio, Carlos Arthur Nuzman, elogiou a “limpeza” e “transparência” da Água da Baía de Guanabara, onde serão realizadas as competições de vela em 2016 e que recebeu, esses dias, um evento-teste.  Aqui vai uma foto, tirada há pouco mais de três meses, da mesma baía elogiada por Nuzman:

baia imunda2 PRESIDENTE, QUE TAL UM MERGULHINHO NA BAÍA DE GUANABARA?

Fôssemos um povo mais politizado e atuante, a frase de Nuzman seria suficiente para tirá-lo do cargo. Porque a limpeza da Baía, prometida há décadas à população do Rio, até hoje não passou de um embuste. As águas continuam imundas e prejudicando toda a cidade. Ao dizer que a água está "transparente", Nuzman debocha de todos os cariocas. É um escárnio.

Há cinco anos, quando o Rio foi escolhido sede da Olimpíada de 2016, Sergio Cabral e Eduardo Paes prometeram limpar 80% do esgoto da Baía de Guanabara até os Jogos. Era mentira. Pelo menos Eduardo Paes teve a decência de admitir, há dois meses, que não cumprirá a promessa. Mas Nuzman continua fingindo morar no Taiti e ainda tem a pachorra de reclamar dos velejadores: "Os atletas da vela sempre levantam questões contra alguma coisa da água. Em Pequim, eram muitas algas, que ficavam presas aos barcos, e eles reclamaram sem parar".

No Rio, não são algas que atrapalham os velejadores, mas sacos plásticos, óleo, fezes, animais mortos, pneus e, dizem, até cadáveres, que alguns já viram boiando por ali. Passei a infância velejando na Baía e cansei de desviar o barco de peixes mortos e lixo de todo tipo.

Quem é obrigado a treinar ali relata um cenário de horror. Velejadores experientes, como Torben Grael e Bimba, vivem criticando a imundície da Baía. Veja esta foto, tirada há menos de oito meses pelo surfista e professor de surfe Paulo César dos Santos Oberlander...

guanabara paulo oberlander PRESIDENTE, QUE TAL UM MERGULHINHO NA BAÍA DE GUANABARA?

Vale lembrar que Nuzman também comandou a candidatura do Rio a sede dos Jogos Pan-Americanos de 2007, que deixaram de legado à cidade um estádio olímpico – o Engenhão – fechado há mais de um ano, com risco de o teto desabar, e um velódromo que foi destruído para construir outro em cima, já que não atendia às exigências olímpicas.

Mas Nuzman diz que está tudo bem e garante que os problemas serão resolvidos. Só acredito se ele levar a família para um mergulho refrescante na Baía de Guanabara. De preferência, na minha amada Praia da Bica, na Ilha do Governador.

P.S: Dei uma entrevista para a Rádio Cultura sobre meu novo livro, "Pavões Misteriosos". O link está aqui. Espero que gostem.

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DE PERTO, NENHUM POPSTAR É NORMAL

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novo livro neil strauss fama e loucura animale post 12 DE PERTO, NENHUM POPSTAR É NORMAL

A Best Seller acaba de lançar no Brasil o mais recente livro do jornalista musical americano Neil Strauss (“The New York Times” e “Rolling Stone”). Numa jogada inteligente, a editora mudou o título em inglês – “Everyone Loves You When You're Dead" (em tradução literal, "Todo Mundo Ama Você Quando Você Está Morto") – para algo mais vendável e direto: “Fama e Loucura”. Duas palavras que definem bem os entrevistados.

“Fama e loucura” é uma coletânea de trechos de 228 entrevistas que Strauss fez com artistas como Madonna, Tom Cruise, Snoop Dogg, Bowie, Ozzy, Mike Tyson, Britney Spears e Lady Gaga. Sempre com um pé no “gonzo”, o estilo jornalístico/literário que fez a fama de Hunter S. Thompson, Strauss gosta de compartilhar da insanidade e estranheza de seus entrevistados. Assim, ele dá uma volta de carro com Snoop Dogg para comprar fraldas, vai a uma festa de arromba na mansão de Puffy Combs e compete com o rapper Ludacris para ver quem acerta mais tiros de rifles em garrafas. Divertido demais.

As entrevistas fogem do lugar comum. Strauss é capaz de abrir um papo com o Kraftwerk perguntando como a banda faz para passar todo o equipamento pela alfândega, ou de espezinhar Lenny Kravitz para admitir que chupou riffs de guitarra do Led Zeppelin. Uma conversa com Ike Turner começa assim: “É verdade que você já viu um homem matar 26 pessoas?”.

Autor de biografias pesadas de gente como Motley Crue, Dave Navarro e Marilyn Manson, Strauss ficou mais conhecido nos Estados Unidos por “O Jogo - A Bíblia da Sedução", lançado no Brasil e um best-seller internacional, em que narra suas aventuras numa sociedade secreta de conquistadores profissionais.

Há dois anos, quando “Fama e Loucura” saiu nos Estados Unidos, fiz uma entrevista com Strauss. Aqui vai o papo:

- Você acha que o tipo de relacionamento entre artistas e imprensa mudou muito desde que você começou a trabalhar como crítico musical?

- Sem dúvida. A internet mudou tudo. Antigamente, os artistas não tinham uma via direta para se comunicar com seu público, a não ser a imprensa. E eles faziam de tudo - tudo mesmo - para tentar chegar até o público. Hoje, com Twitter e sites, os artistas já podem se comunicar diretamente com os fãs, e isso mudou totalmente a relação com a mídia. Basicamente, eles não precisam mais de nós.

- E como isso impactou a qualidade da cobertura musical?

Impactou muito. Hoje os artistas têm um maior controle sobre as informações, e isso é péssimo. Prejudica inclusive os fãs. A qualidade da cobertura piorou muito. Hoje, um jornalista tem, quando muito, 20 ou 30 minutos com um artista, e não dá para descobrir muito sobre ele com tão pouco acesso.

- Como você faz?

Eu tento, de alguma forma, estabelecer uma conexão com o artista. Deu certo com Lady Gaga, por exemplo. Eu tinha uma entrevista marcada com ela para depois de um show. Mas ela gostou de nossa conversa e me convidou para voltar no dia seguinte.

- Quem eram seus ídolos na crítica musical?

Gostava muito de Richard Meltzer e Gerard Cosloy. Gostava muito também de Paul Nelson (veterano crítico da "Rolling Stone" que teve um fim trágico, morrendo abandonado e sozinho - aparentemente, de fome - em um muquifo em Nova York). Mas eu sempre gostei muito também de ficção, de autores como John Fante, Jim Carroll, Jerzy Kozinski e Nabokov.

- Seus livros misturam crítica musical e reportagem, você não concorda?

- Sem dúvida. Nunca me vi muito como um crítico, sempre tentei fazer livros ou escrever histórias sobre pessoas interessantes. Para mim, o mais importante é tentar descobrir quem são, no fundo, as pessoas que fazem a música. Quando lancei "Fama e Loucura", fiz um desafio aos leitores de meu blog: se alguém não gostasse do livro, era só mandar a capa pelo correio que eu devolveria o dinheiro. Só dois leitores pediram a grana de volta.

- Outra característica de seus livros é uma predileção por personagens mais "outsiders", como Mötley Crüe, Marilyn Manson etc.

- Sim. Os personagens mais "dark" me parecem os mais interessantes. Uma vez eu estava entrevistando o Prince e ele me disse: "Mas você só gosta do lado escuro! O que há de errado com o lado claro e leve da vida?" E começou uma digressão estranha sobre filosofia e religião, falando da necessidade de purificar o espírito...

- O que é, por si só, uma coisa bem "dark" e sombria, não?

[Rindo] Sem dúvida. Prince não é, exatamente, um raio de sol...

- Em todos esses seus anos entrevistando as pessoas mais diferentes, houve algum artista que realmente te impressionou pela loucura?

- Jerry Lee Lewis, sem dúvida. É um verdadeiro psicopata. Tive a impressão de que ele poderia fazer qualquer coisa a qualquer momento.

- Você esteve no Brasil cobrindo a cena de baile funk, inclusive citou o DJ Marlboro em seu livro.

- Sim, estive no Brasil algumas vezes, entrevistei Caetano Veloso e seu filho Moreno. E conheci também o Karnak, gosto muito da banda e por pouco não incluí trechos da entrevista no livro.

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NELSON NED: O PEQUENO GIGANTE DA CANÇÃO

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nelson1 NELSON NED: O PEQUENO GIGANTE DA CANÇÃO

Este ano, Nelson Ned completaria 50 anos de carreira profissional. Foi em 1964 que lançou seu primeiro LP, “Um Show de Noventa Centímetros”.

Em homenagem a Nelson, aqui vai uma de suas últimas entrevistas, gravada seis meses antes de sua morte. Publiquei trechos dela depois da morte de Nelson Ned, mas o texto, em sua versão integral, é inédito.

 

O local marcado para a entrevista é um pequeno sítio, a cerca de 50 km de São Paulo. A propriedade está longe de ser luxuosa, mas é bem cuidada e cercada de árvores. A casa tem uma varanda, com uma bonita vista de um vale verde. Nessa manhã de inverno e céu azul, não há sinal de nuvens, e uma brisa agradável sopra do vale.

Depois de quase uma hora de espera, um carro se aproxima. A motorista sai do carro, abre a mala traseira do veículo e tira uma cadeira de rodas dobrável. A porta de trás do carro se abre. Só aí percebo que ela não estava sozinha no carro: do banco de trás, sai Nelson Ned.

Nelson se acomoda com dificuldade na cadeira de rodas. Usa a cadeira há cerca de cinco anos, desde que sofreu um derrame e perdeu a capacidade de locomoção. A motorista do carro é Neuma, sua irmã. Nos fins de semana, ela cuida de Nelson, que passa a semana em uma clínica próxima ao sítio. Neuma marcou a entrevista para o período da manhã: “Nelsinho sempre está melhor de manhã, depois vai ficando mais cansado ao longo do dia.” Sentado na cadeira de rodas, Nelson Ned parece ainda menor que seus 112 centímetros de altura.

Quem cresceu nos anos 1970 ou1980 certamente já viu Nelson nos programas de Sílvio Santos, Gugu, Chacrinha, Bolinha ou Raul Gil, e já leu sobre ele em colunas sociais – ou policiais. Até o “Planeta Diário”, bíblia do humor descoladex carioca, costumava citar o cantor. Uma famosa manchete dizia: “Nelson Ned é o Novo Menudo”.

Ele era um astro. No ranking de maiores vendedores da Associação Brasileira dos Produorres de Discos (ABPD), está em quinto lugar, com 45 milhões de discos. Nenhum cantor brasileiro cantou para tanta gente no exterior. Nelson se apresentava em estádios – não teatros, estádios mesmo – na Colômbia, México e Venezuela. Cantou duas vezes no Madison Square Garden e quatro no Carnegie Hall, em Nova York. Quando o escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez visitou o Brasil, em 1981, surpreendeu ao revelar que era fã de Ned. “Se a sua literatura fosse música, que tipo de música seria?”, perguntou-lhe Chico Buarque. “Seria um bolero cantado por Nelson Ned”, respondeu o prêmio Nobel de Literatura.

Ned foi um fenômeno de popularidade, especialmente nos países latino-americanos. E conseguiu isso apesar de suas limitações físicas e do preconceito que sofreu por toda a vida. “O Brasil é a terra mais preconceituosa que conheço. O preconceito era contra o meu tamanho e contra meu estilo de música.” Diz que nunca teve medo de enfrentar plateias: “Quem passou a vida toda sendo humilhado aprende a se defender. Quando canto eu me transformo, consigo ver o ar transformado em música, é uma sensação gloriosa.”

Nelson Ned nasceu em 1947, em Ubá, Minas Gerais, numa família de classe média. Foi o primeiro filho do casal Nelson de Moura Pinto, 26, e Ned d’Ávila Pinto, 18. Era um bebê de tamanho normal. Quando Nelson completou quatro meses de vida, os pais começaram a perceber que havia algo errado em seu crescimento. O bebê sofria de displasia espôndiloepifisária, uma doença rara que causava nanismo e deformações esqueléticas.

Foi um choque para os pais. Não havia nenhum caso de nanismo na família. O casal fez de tudo para “reverter” a condição de Nelsinho, incluindo massagem com sebo de cordeiro e orações de todos os tipos. A mãe, em especial, não se conformava e buscou apoio e explicação em várias religiões. Frequentou cultos católicos, kardecistas e orientais, como a Seicho-No-Ie e a Perfeita Liberdade. Queria descobrir porque o filho nascera daquele jeito. Na escola, Nelson era alvo da zombaria dos colegas, que o chamavam de “Anãozinho”. Mas Ned se recusou a tirar o filho da escola. Nelson teria de enfrentar o mundo, e não fugir dele: “Vou criar meu filho para o mundo, e não um mundo para meu filho.” O casal teve outros seis filhos – Ned Helena, Nélia, Nedson, Neuma, Neide e Nelci – todos normais.

Desde pequeno, Nelson cantava muito bem. Aos quatro anos, já participava de programas em rádios locais, impressionando a todos com a potência e afinação de sua voz. Aos oito anos, foi apresentado ao grande Ary Barroso, seu conterrâneo de Ubá. Nelson sentou no colo do compositor e cantou “Risque”, uma das grandes canções de Ary: “Risque meu nome de seu caderno / pois não suporto o inferno / do nosso amor fracassado”. Ary caiu na gargalhada quando o pequenino errou o verso “Afogue as saudades / nos copos de um bar” e cantou “...nos copos de Ubá”.

Em 1960, a família mudou para Belo Horizonte.  Nelson arrumou um emprego de office boy na fábrica de chocolates Lacta. Depois de vê-lo cantando no almoço dos funcionários, um gerente convenceu a empresa a botar Nelson como atração em um programa de TV patrocinado pela empresa. Logo ele ganharia seu próprio programa, “Gente, o Tamanho Não Importa!”. Três anos depois, a família foi para o Rio de Janeiro, onde Nelson participou de um concurso de calouros e gravou seu primeiro compacto. Em 1964, lançou o primeiro LP, “Um Show de Noventa Centímetros”: “Eu disse que já tinha 1,12 metro, mas a gravadora achou que noventa centímetros ia chamar mais atenção.”

Nelson virou atração em programas de rádio e TV: Sílvio Santos, Chacrinha e Hebe Camargo viam a audiência disparar quando ele se apresentava. No fim dos anos 60, Nelson cantou rock – adorava Trini Lopez - e fez de tudo para ser aceito no programa “Jovem Guarda”, mas não teve sucesso: numa atração dominada por galãs como Roberto Carlos e Ronnie Von, um anão certamente destoaria.

Nelson Ned se especializou em música romântica. Adorava cantores latinos de repertório melodramático, como Lucho Gatica e Miguel Aceves Mejia, além de crooners brasileiros como Francisco Alves, Mário Reis e Orlando Silva. Mas seu cantor predileto era mesmo Tony Bennett. Nelson fez imenso sucesso em rádios AM no Brasil e vendeu muitos discos, mas nunca foi aceito pela elite da MPB. Ronaldo Bôscoli costumava chamá-lo de “anãozinho ridículo”, o que motivou Nelson a compor “Tamanho Não é Documento”: “Você vive sempre a brincar comigo / pode judiar de mim que eu nem ligo / sou pequeno, mas meu coração é grande / bem maior do que o seu (...) tamanho não é documento / pelo menos tenho sentimento / isso é coisa que você não tem.”

Nos anos 1970, Nelson Ned virou um astro: fazia shows lotados no exterior, ganhou oito discos de ouro nos Estados Unidos e muito dinheiro. Tinha apartamentos de luxo no Rio e em São Paulo, andava em limusines e freqüentava boates da moda, como a Gallery, em São Paulo. Também começou a beber, cheirar cocaína e colecionar armas. “Quando eu ia ao Gallery, só queria saber de duas coisas: pó e champanhe Dom Perignon.” Vaidoso, cercava-se de belas mulheres e seguranças armados. Para sacanear os grã-finos da elite paulistana, que torciam o nariz quando viam aquele anão metido entrando no Gallery, Nelson combinou com o DJ da casa que lhe pagaria cem dólares para tocar “Eu Não Sou Cachorro Não”, de Waldik Soriano, toda vez que ele chegasse à boate com sua trupe de mulheres e guarda-costas. “Você tinha de ver a cara de espanto do pessoal!”

celebridades nelson ned 04 size 598 NELSON NED: O PEQUENO GIGANTE DA CANÇÃO

Suas companhias não eram das melhores: depois de um show no México, foi visitado no camarim por Arturo Durazo Moreno, então chefe de polícia da Cidade do México – e depois condenado por corrupção, tráfico de drogas e extorsão. Moreno era grande fã de Nelson e o presenteou com um revólver Colt 45 banhado em ouro, que o cantor repassou a outra figura sombria, o então presidente do Brasil, João Figueiredo. “Figueiredo me recebeu com lágrimas nos olhos.” Toda vez que se apresentava na Colômbia, Nelson era visitado nos camarins por membros dos cartéis de drogas, que lhe ofereciam mulheres e cocaína. Conheceu pessoalmente Pablo Escobar, chefão do cartel de Medellin: “Conheci, claro, cantei várias vezes pra ele. Mataram ele, né?”

Em 1988, Nelson Ned apareceu nas páginas policiais, ao ser acusado de atirar na esposa. Ele diz que a arma disparou acidentalmente quando a mulher limpava um paletó. Mas seu comportamento era errático e imprevisível, causado pela bebida e cocaína. Nelson só andava armado, tomava um litro de uísque por dia e cheirava cinco a dez gramas de cocaína por semana. Um dia, estava tão desnorteado pelo pó que foi de sunga ao tradicional restaurante Gigetto, no centro de São Paulo, e pediu cachaça. Quando os garçons se recusaram a servi-lo, Nelson armou um escândalo. Acabou desmaiando na calçada em frente ao restaurante.

Nelson teve três filhos, todos anões. Aconselhado pelos médicos, fez uma vasectomia: “Sou pequeno, mas não sou burro!” Em 1993, estava no fundo do poço, cheirando, bebendo e passando dias sem dormir. Perdeu quase toda a fortuna e vivia paranóico. Sua casa tinha armas por todos os cantos, escondidas em gavetas e armários. Certa noite, diz ter visto viu um raio rasgar o céu e o atingir em cheio no coração. Converteu-se ao Evangelho e jura que nunca mais bebeu ou cheirou. Passou a gravar apenas músicas religiosas. Diz que ainda conversa regularmente com Roberto Carlos e Julio Iglesias, mas a frase soa mais nostálgica que verdadeira.

Quando perguntei como desejaria ser lembrado, Nelson Ned disse: “Quero que as pessoas se lembrem de mim como um homem romântico, que amou muito e viveu intensamente...” sua frase foi interrompida por um barulho numa árvore. Era um grupo de oito tucanos, lindos, de corpos negros e longos bicos amarelos, parados em um galho, a poucos metros de Nelson. Pareciam fitá-lo. “Olha isso!”, gritou o cantor, comovido pela visão. “Põe aí que eu sou um homem abençoado também!”

Em 5 de janeiro de 2014, Nelson Ned morreu, de pneumonia. Tinha 66 anos.

 

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CUIDADO COM O DÉBITO-FANTASMA!

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ghost with bag CUIDADO COM O DÉBITO FANTASMA!

Não conheço uma pessoa que esteja feliz com a empresa de celular que escolheu. Os brasileiros pagam as ligações mais caras do mundo e têm um serviço podre. Isso não é novidade. Mas o que aconteceu comigo, há algumas semanas, merece ser dividido com os leitores.

Há pouco menos de um ano, comprei dois celulares e fiz planos da empresa que vou chamar de Estrume (para ninguém achar que estou fazendo propaganda das outras operadoras, Dejeto, Asco e Ranho). Botei as contas dos dois telefones da Estrume em débito automático.

Três meses depois, nossos telefones foram cortados por falta de pagamento. Chequei o extrato bancário e vi que os débitos da Estrume tinham sido realizados. Liguei para a Estrume, e a atendente disse que o pagamento não constava no sistema da empresa. Seguindo as orientações da moça, imprimi os comprovantes e enviei ao SAC da Estrume.

Mais duas semanas passaram, e nossos telefones continuavam cortados. A Estrume sequer confirmou o recebimento dos comprovantes. Fui a uma loja da Estrume em São Paulo, esperei 50 minutos para ser atendido e falei com o gerente, que confirmou que os pagamentos não constavam do sistema. Ele sugeriu que eu pagasse de novo as contas, para que os aparelhos fossem religados, e depois brigasse com a Estrume para receber o dinheiro de volta.

O gerente imprimiu os dois boletos. Percebi que os valores que constavam dos boletos eram diferentes dos valores que haviam sido pagos em débito automático. Coisa pequena, um ou dois reais em cada conta. Liguei para o banco e tive mais uma surpresa: sem que eu tivesse pedido, os débitos automáticos haviam sido suspensos. Como diria o Dalto, muito estranho...

Pedi ao gerente do banco uma carta explicando que os débitos havia sido solicitados pela Estrume. Mostrei a carta ao gerente da filial da Estrume em São Paulo. Ele ligou para a empresa e disse que aqueles débitos, apesar de terem o nome da empresa, não foram solicitados por ela. “Isso está acontecendo direto”, disse. “Parece até um débito-fantasma. Quer uma sugestão? Tira suas contas de débito automático”. Nem precisei, já que as contas haviam sido tiradas do débito sem que eu pedisse.

Paguei as contas novamente e nossos telefones foram religados. Depois, escrevi pelo menos três vezes e liguei sete ou oito vezes para a Estrume, mas ninguém resolveu nada.

Há poucos dias, para nossa imensa surpresa, uma funcionária da Estrume ligou. Disse que a empresa havia analisado o meu caso, mas não pôde concluir nada, porque – é aqui que a história fica mais cabulosa – as contas pagas em débito automático não haviam chegado à empresa.

Quer dizer que o cliente paga dois débitos automáticos em nome da Estrume, o banco confirma que o pagamento foi feito para a Estrume, e a Estrume diz que não recebeu? E as contas somem do débito automático? E aparecem no extrato bancário com valores diferentes?

A essa altura, eu estava tão possesso que ameacei processar a Estrume, o presidente da Estrume e toda a família Estrume. Devo ter soado convincente, já que a moça aceitou reembolsar os valores que eu havia pago em duplicidade. 

Mas a história não acabou ali. Sexta passada, imprimi o boleto para pagar a última conta da Estrume. E o valor que constava no site da empresa era diferente do valor do boleto. Liguei para a Estrume, e uma atendente disse: “Ignore o valor do site, senhor, pode pagar o boleto. Deve ser uma falha do sistema.”

Torço para que não, mas aposto que a saga da Estrume não acabou...

P.S.: Estarei fora o dia todo e impossibilitado de moderar comentários até o início da tarde. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência.

 

 

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ROBIN WILLIAMS (1951-2014)

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Robin Williams in 1978 011  ROBIN WILLIAMS (1951 2014)

Quem assiste a reprises das comédias juvenis de quinta que Robin Williams, Eddie Murphy, Steve Martin e Billy Crystal fizeram nos últimos 20 anos não tem ideia de como eles eram radicais e transgressores quando surgiram.

Todos apareceram mais ou menos na mesma época, entre o meio dos 70 e o início dos 80 (Murphy era bem mais novo que os outros, mas explodiu antes de fazer 20 anos) e fizeram a transição de shows de stand-up para as telas do cinema. Viraram superastros da comédia americana.

De todos, Williams fez os piores filmes, a maioria indignos de seu talento. Teve imenso sucesso de bilheteria, mas suas escolhas sempre oscilarem entre comédias bobas e melodramas chorosos.

Mas quem já viu Robin Williams fazendo stand-up sabe que ali estava um verdadeiro gênio do improviso. Ele aprendeu com o grande mentor, Richard Pryor, a arriscar tudo, a não temer o ridículo, a ir ao limite de suas capacidades para arrancar uma gargalhada. Seu estilo era frenético, non-stop, numa avalanche ininterrupta de frases, imitações e piadas. Era amigo íntimo e companheiro de cheiração de John Belushi, e não é à toa que, em alguns shows, ambos pareciam empenados de tanto pó.

Robin Williams era um dos poucos comediantes que parecia subir ao palco sem ter nada preparado, tirando situações e humor de sua cabeça e suas memórias. Perguntem a Jim Carrey com quem ele aprendeu boa parte do que sabe.

Participei de duas entrevistas com Robin Williams. Os filmes não eram grande coisa: “Nove Meses” e “A Gaiola das Loucas”, mas nunca ri tanto em uma entrevista. Numa delas, uma jornalista francesa perguntou por que filmes europeus não eram exibidos com mais frequência nos cinemas americanos. Williams fez uma imitação de um caipira assistindo a “A Bela da Tarde”, de Luis Buñuel, que deixou todo mundo na mesa chorando de rir. Nunca vou esquecer aquilo.

A morte de Robin Williams acontece pouco depois do suicídio de Fausto Fanti, de “Hermes e Renato”, em outro exemplo de cômico talentoso batalhando com seus demônios. Williams passou os anos 70 e 80 entrando e saindo de detoxes mil e lutava há anos contra a depressão. Mesmo quando falava de seus vícios, era genial: “Se você lembra dos anos 60, é porque não estava lá”, disse certa vez.

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“CÃO BRANCO”: O FILME MALDITO DE SAMUEL FULLER

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Já escrevi bastante sobre “Cão Branco”, de Samuel Fuller. É um de meus filmes prediletos e foi lançado recentemente em DVD no Brasil pela Cinemax. Se você ainda não viu, corra à locadora.

"Cão Branco" é um caso clássico de filme incompreendido: um manifesto antirracista, foi acusado de preconceito e banido dos cinemas e TV por muito tempo.

Lançado em 1982, quando o cineasta tinha 70 anos, conta a história de uma atriz, Julie Sawyer (Christy McNichol), que atropela um pastor alemão. Ela socorre o animal e passa a cuidar dele. O que Julie não sabe é que o pastor é um "cão branco", treinado para atacar pessoas negras. A atriz leva o animal para um treinador negro (Paul Winfield), para que ele tente domar o cão e acabar com seu instinto assassino.

A exemplo de outros filmes de Fuller, cineasta que nunca primou pela sutileza, “Cão Branco” foi considerado apelativo e preconceituoso. Atacado por todos os lados, foi jogado de escanteio pelo estúdio Paramount, que o lançou em poucas salas, e banido de exibições em TV. O filme só teve um lançamento mais amplo nos Estados Unidos em 2008, nove anos depois da morte de Fuller.

Além de ser um “thriller” de primeira, "Cão Branco" levanta questões sociais relevantes: o racismo é "aprendido" em casa? O preconceito pode ser extirpado pela razão?

Essas questões sempre intrigaram Fuller, um ex-repórter policial que lutou na Segunda Guerra, ajudou a libertar campos de concentração dos nazistas e levou para as telas do cinema uma visão pessimista e crua do mundo.

“Cão Branco” deveria ter sido o auge de sua trajetória de cineasta, aquela obra-prima que consagra um cineasta veterano. Em vez disso, acabou com sua carreira nos Estados Unidos. Arrasado com o fracasso do filme, Fuller se mudou para a França e nunca mais filmou na América.

P.S.: Estarei hoje em São Paulo para o lançamento de meu livro “Pavões Misteriosos”, que acontece 18h30 na Livraria Cultura do Conjunto Nacional (Paulista com Augusta). Publico um novo texto no blog na sexta-feira.

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O blog volta segunda

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Amigos,

Estou em São Paulo para entrevistas sobre o lançamento do meu livro "Pavões Misteriosos". Foram tantos os pedidos de entrevistas que não terei tempo de escrever um texto novo para hoje e responder aos comentários. Volto segunda com um texto novo. Peço desculpas e espero que entendam.

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ADEUS, MINHOCÃO, JÁ VAI TARDE…

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congestionamento minhocao acervo estadao ADEUS, MINHOCÃO, JÁ VAI TARDE...

Uma boa notícia: depois de 44 anos emporcalhando o visual e acabando com a vida de moradores de vários bairros, o Elevado Costa e Silva, conhecido por Minhocão, uma das maiores aberrações arquitetônicas de São Paulo, será finalmente desativado. O novo Plano Diretor, sancionado pelo prefeito Fernando Haddad, prevê que o monstrengo seja demolido ou transformado em parque.

Para quem não é de São Paulo, posso descrever o Minhocão como uma monstruosidade de 2,5 km de extensão e altura que atinge o segundo andar de prédios. Ele corta alguns bairros que, antes de sua construção, estavam entre os mais charmosos da cidade: Santa Cecília, Campos Elíseos e Vila Buarque.

Mas sua construção, feita pelo então prefeito biônico da ditadura, Paulo Maluf, e batizado por ele em tributo a Costa e Silva, general-presidente que o nomeou ao cargo, acabou com a vida de muita gente. Quem morava ali perto viu seu bairro transformado em um lugar lúgubre e sujo, com carros passando a poucos metros das janelas dos prédios, todos pretos de fuligem e poluição. O mercado imobiliário em torno da obra foi dizimado.

Morei muito tempo nas regiões de Perdizes, Barra Funda e Santa Cecília, e todas sofrem demais com a presença do Minhocão. Debaixo do viaduto, mendigos e viciados em crack passam os dias, o lixo se acumula, e o cheiro beira o insuportável.

À noite e aos domingos, com o tráfego de carros proibido, o Minhocão vira uma das poucas opções de lazer para os locais, mas é constrangedor andar de bicicleta ali e bisbilhotar, mesmo sem querer, a intimidade dos moradores.

Sei que muita gente vai chiar e dizer que a obra ajuda a desafogar o tráfego. É verdade. Mas governar é assumir prioridades, e acho muito mais importante melhorar a qualidade de vida dos moradores a diminuir o tempo que levam para chegar à Radial Leste. O que Maluf e seu monstrengo fizeram foi condenar uma parte imensa de São Paulo a tempos sombrios.

Infelizmente, o plano do prefeito não estipula um prazo para a desativação do Minhocão. Espero que seja rápido, e me ofereço para dar a martelada inicial. Aquele lixo já vai tarde.

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COMO SOBREVIVEMOS 25 ANOS SEM RAULZITO?

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Dia 21 de agosto é aniversário de 25 anos da morte de Raul Seixas. Raulzito morreu sozinho, no trono de um apartamento, aos 44 anos e muita lenha pra queimar. O que estaria fazendo hoje, aos 69?

Para mim, Raul foi o nome mais radical e inventivo do pop-rock brasileiro. Seus quatro primeiros discos solo, gravados entre 1973 e 1976, em parceria com Paulo Coelho, são marcos de uma época em que grandes LPs apareciam aos montes.

Conheço gente que prefere os quatro primeiros discos dos Mutantes, ou a série que Jorge Ben gravou entre “Ben” (1972) e “África Brasil” (1976). Mas quando se compara níveis de excelência assim, a questão é pessoal. E nada me emociona mais que a parceria entre Raul e Paulo Coelho.

Aqui vão breves comentários sobre cada um dos discos:

Krig-ha Bandolo - 1973 

1 COMO SOBREVIVEMOS 25 ANOS SEM RAULZITO?

Um disco que tem “Ouro de Tolo”, “Al Capone”, “Metamorfose Ambulante” e “Mosca na Sopa” parece uma coletânea. Mas foi o disco de estreia de Raul e Paulo Coelho. A dupla já começou com um clássico.

Gita – 1974

4 COMO SOBREVIVEMOS 25 ANOS SEM RAULZITO?

Inspirado pela filosofia de Aleister Crowley, Raulzito e Paulo fizeram essa ópera-rock-xaxado-country-bolero sobre os ensinamentos do bruxo. Com produção de Mazzola, orquestrações de Miguel Cidras e 62 músicos no estúdio, a faixa “Gita” é a apoteose do disco, um momento ribombante de pura genialidade pop-sinfônica.

Novo Aeon – 1975

2 COMO SOBREVIVEMOS 25 ANOS SEM RAULZITO?

Quem conhecia Raul de perto diz que era seu disco predileto. É o meu também. Outra apologia a Crowley, com algumas das letras mais ácidas e geniais da dupla Paulo/Raul. Ouça “A Verdade sobre a Nostalgia” e confira.

Há Dez mil Anos Atrás – 1976

3 COMO SOBREVIVEMOS 25 ANOS SEM RAULZITO?

Para mim, o menos inspirado do quarteto de discos, marcado por uma crise criativa entre Raul e Paulo Coelho. Mesmo assim é um LP sensacional, com a faixa-título, “Meu Amigo Pedro” e a autobiográfica “Eu Também Vou Reclamar”, que traz os versos “As verdades se misturam / a verdade do universo / e a prestação que vai vencer”, síntese da genialidade de Raul, um músico capaz de falar das questões mais intrigantes de forma simples e direta.

O TOP 10 DO MALUCO-BELEZA

Em 2012, publiquei no blog a lista de minhas dez músicas prediletas de Raul. Compare com a sua:

Ouro de Tolo (Krig-ha Bandolo, 1973)

Existem músicas tão sublimes que demandam atenção total. Não dá para ouvir três segundos de “God Only Knows” ou “My Funny Valentine”, por exemplo, sem parar tudo que se está fazendo. “Ouro de Tolo” é uma dessas.  Sobre uma balada melancólica e grandiosa à Phil Spector, Raul faz uma confissão vitriólica de seu próprio deslocamento, achincalhando as aspirações da classe média propagandeadas pelo milagre brasileiro dos anos 70. Uma obra-prima absoluta, que ninguém na Censura pareceu perceber. E com um dos versos mais incríveis da música brasileira: “Eu que não me sento no trono de um apartamento / com a boca escancarada cheia de dentes, esperando a morte chegar”.

Metamorfose Ambulante (Krig-ha Bandolo!, 1973)

OK, você certamente já ouviu muitos cantores péssimos destruindo a coitada em barzinhos por aí. Mas pare e ouça “Metamorfose Ambulante” como se fosse a primeira vez. Repare no clima psicodélico, naquela guitarrinha preguiçosa que precede o coral e na letra sarcástica sobre as verdades absolutas. E então faça justiça a uma das maiores músicas de Raul.

As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor (Gita, 1974)

Um repente/baião com uma das letras mais raivosas e inspiradas de Raul: “Eu já passei por todas as religiões, filosofias, políticas e lutas / aos 11 anos de idade eu já desconfiava da verdade absoluta”.

S.O.S. (Gita, 1974)

“Hoje é domingo, missa e praia, céu de anil / Tem sangue no jornal, bandeiras na avenida zil…”. Ninguém começava uma letra como Raul. Essa aqui é uma crônica, tão fluida que parece prosa. Começa com a descrição de um lindo domingo no Rio de Janeiro, para depois virar um apelo melancólico de alguém que não se encaixa naquele sol e naquela felicidade toda. E quando Raul pede ao moço do disco voador para levá-lo, e canta “e das janelas desses quartos de pensão / Eu, como vetor, tranqüilo tento uma transmutação”, é difícil suportar tanta tristeza. Pra mim, a música mais bonita de Raul. E pensar que foi chupada de “Mr. Spaceman”, do Byrds...

A Maçã (Novo Aeon, 1975)

Acho inacreditável que essa música raramente seja lembrada quando se fala nas melhores músicas de Raul. É uma balada dilacerante, com um teclado viajandão e uma das interpretações mais corajosas de Raul. Sua voz quase se despedaça, de tão frágil. Bonito demais.

Tu És o MDC da Minha Vida (Novo Aeon, 1975)

A melhor música que Odair José nunca gravou. Um bolerão brega com uma letra bizarra e engraçada, misturando Pink Floyd, Flavio Cavalcanti, Pepsi Cola, Shakespeare e as Casas da Banha.

Meu Amigo Pedro (Há Dez Mil Anos Atrás, 1976)

Sempre adorei essa música, mas ela ganhou outra dimensão para mim depois que vi o documentário de Walter Carvalho e descobri que Raul a tinha escrito em homenagem ao irmão, Plinio. A letra fala de duas pessoas muito diferentes – um doidão, outro careta – e da dificuldade de relacionamento dos dois. No fim, conclui Raul, “tudo acaba onde começou”. Não me lembro de uma música tão bonita sobre dois irmãos.

Eu Também Vou Reclamar (Há Dez mil Anos Atrás, 1976)

Raul ironiza as percepções do público sobre sua obra e imagem, nesse country em que cita até sua conhecida obsessão por Bob Dylan. Essa faixa mostra uma das grandes virtudes de Raul como letrista – e que ele divide com Jorge Ben e Jackson do Pandeiro: uma capacidade quase sobrenatural de espremer palavras onde elas parecem não caber, sem prejuízo da fluidez ou da métrica. E o verso “Dois problemas se misturam / a verdade do universo e a prestação que vai vencer” é um momento de puro sarcasmo à Monty Python.

As Profecias (Mata Virgem, 1978)

Começa com um pianinho romântico à Richard Clayderman, para depois cair num xaxado malemolente sobre filósofos, sábios e visões do Apocalipse. Uma das melhores letras de Paulo Coelho.

Aluga-se (Abre-te Sésamo, 1980)

Faria uma dupla imbatível com “Inútil”, do Ultraje: duas letras irônicas e iradas sobre nosso complexo de inferioridade e síndrome de vira-latas.

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“EU SEI QUEM MATOU JIM MORRISON… E NANCY SPUNGEN!”

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marianne faithfull morisson “EU SEI QUEM MATOU JIM MORRISON... E NANCY SPUNGEN!”

Mais de 43 anos depois da morte do líder do The Doors, Jim Morrison, a cantora Marianne Faithfull fez uma revelação bombástica: foi o então namorado dela, o francês Jean De Breteuil, quem matou o cantor.

Em entrevista à revista inglesa “Mojo”, Faithfull, 67, conta que Breteuil, um traficante e playboy que fornecia heroína a astros como Keith Richards, foi ao apartamento de Morrison em Paris e lhe vendeu uma dose tão potente que o matou. “Tenho certeza que foi um acidente”, diz Faithfull. Meses depois, o próprio Breteuil morreria de overdose, em Tânger, no Marrocos.

A história é boa e possível. Se é verdadeira, só Marianne Faithfull pode dizer. E, convenhamos, em 1971 ela não era das testemunhas mais sólidas. Um ano antes, seu relacionamento com Mick Jagger havia acabado, ela perdera a guarda do filho, tentou o suicídio e acabou vivendo nas ruas de Londres por um bom tempo, chapada de heroína e barbitúricos.

A confissão tardia de Marianne Faithfull me lembrou episódio parecido que vivenciei com outro louco talentoso, Dee Dee Ramone. Aqui vai a descrição, publicada em meu blog em 2011, de um encontro que tive com ele no mitológico Hotel Chelsea, em Nova York:

“Ex-michê, ex-delinquente, ex-assaltante, ex-heroinômano (ex? será?), Dee Dee era um dos sujeitos mais instintivamente brilhantes que já conheci. Praticamente analfabeto, mal conseguia juntar duas frases, mas escreveu letras autobiográficas de um minimalismo poderoso e atordoante, como “53rd and 3rd”.

Nesse dia, descobri outra coisa sobre Dee Dee. Não sei se era alguma doença ou resultado de alguma medicação, mas o fato é que ele sofria de um grave déficit de atenção. Simplesmente não conseguia se concentrar em nada por mais de cinco minutos.

Dee Dee chegava ao cúmulo de parar frases no meio, ficar em silêncio por alguns segundos e depois emendar outro assunto, sem ter terminado o anterior. Digamos que clareza não era o seu forte. Conversar com ele, especialmente para um jornalista, era enlouquecedor.

Certa hora, começamos a conversar sobre o Chelsea, e eu comentei como era impressionante a quantidade de pessoas que vinham todo dia ao hotel pedindo para ficar no quarto onde Sid Vicious matara Nancy Spungen (só de curiosidade, o quarto não existe mais).

“O quê? Sid matou Nancy? De onde você tirou isso?”, disse Dee Dee. “Todo mundo sabe que não foi isso que aconteceu!”

Seria esse o furo jornalístico do fim de século? Dee Dee revelaria ao mundo o nome do verdadeiro assassino?

“E quem foi, Dee Dee?”

“Porra, foi aquele traficante que vendia heroína pra Nancy… Como é o nome dele… Fuck…Daqui a pouco eu lembro o nome do cara!”.

Foi a última vez que ele tocou no assunto.”

Dee Dee Ramone e Marianne Faithfull… Vocês juram dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade?

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“CORRIDA CONTRA O DESTINO” É O EPITÁFIO DO SONHO HIPPIE

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Nas listas de lançamentos recentes em DVD vejo um filme imperdível: “Corrida contra o Destino” (“Vanishing Point”, 1971), de Richard S. Sarafian.

Se “Easy Rider” foi o road movie da geração hippie, “Vanishing Point” é o filme-símbolo da geração pós-Altamont, quando o sonho hippie estava morto e os ideais de paz, amor e LSD tinham virado cinza.

Como uma visão, o filme começa sem explicar nada: vemos Kowalski (Barry Newman) chegando a uma oficina mecânica no Colorado e recebendo ordens para levar um envenenado Dodge Challenger até São Francisco, na Califórnia. Ele tem 15 horas para percorrer dois mil quilômetros.

Antes de pegar a estrada, Kowalski faz uma parada num bar infestado de Hell’s Angels, traficantes e outros personagens que parecem saídos de algum faroeste de Sam Peckinpah ou de um livro de Jim Thompson. Encontra um amigo, compra um punhado de anfetaminas e cai na freeway.

Ao melhor estilo “Medo e Delírio em Las Vegas”, Kowalski começa a ser atacado por visões – reais e imaginárias. Ele é perseguido por dois policiais de moto, depois por caipiras nazistas. O filme vira uma “Odisséia” lisérgica a 200 km por hora.

Enquanto isso, Super Soul, cultuado DJ de uma rádio de black music (Cleavon Little) capta as transmissões da polícia e passa a contar, em seu programa, a saga de Kowalski (se isso te fez lembrar a DJ que narra as brigas de gangues em “Warriors”, de Walter Hill, não é coincidência; a personagem é claramente inspirada em Super Soul).

O roteiro de “Vanishing Point” foi escrito por um certo Guillermo Caín, pseudônimo do grande escritor cubano Guillermo Cabrera Infante (1929-2005), de “Três Tristes Tigres”. E você provavelmente conhece o diretor do filme, Richard Sarafian, de filmes de gângster como “Bugsy”, em que ele, com aquela cara de leão-de-chácara, invariavelmente interpreta um brucutu qualquer.

“Vanishing Point” virou um cult movie. Bandas como Primal Scream e Mudhoney lançaram discos com esse título, George Miller se inspirou nele para fazer “Mad Max”, Steven Spielberg disse que era seu filme predileto e o usou como base de “Encurralado”, Quentin Tarantino homenageou Kowalski em “Death Proof”, e o Guns’N’Roses sampleou uma fala de Super Soul na faixa “Breakdown”.

Só falta você assistir. Mas tome cuidado para não alugar a refilmagem, de 1997.

 

 

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TIRIRICA É O NOVO GERALDO VANDRÉ

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tiririca 1 TIRIRICA É O NOVO GERALDO VANDRÉ

Pode acreditar: nenhum artista foi tão perseguido no Brasil nos últimos anos quanto Tiririca.

Se a ditadura atacou gente como Geraldo Vandré e Chico Buarque, nossa democracia anda caçando Tiririca com uma ferocidade impressionante.

Esses dias, a gravadora EMI Songs exigiu que o Youtube retirasse do ar um comercial engraçadíssimo, em que Tiririca comete o pecado de ironizar Roberto Carlos, esse ser angelical e santificado, defensor da censura e de Pinochet:

 

 

Em 2010, a Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo quis impugnar a candidatura de Tiririca por suposto “crime eleitoral”. O promotor eleitoral Mauricio Antonio Ribeiro Lopes, do Ministério Público Eleitoral de São Paulo, disse, à época, que via no bordão “Pior que está não fica” infração capaz de levar a uma impugnação da candidatura. “É propaganda irregular. Vislumbro infração ao artigo 5º da resolução 23.191 do TSE”, declarou. Felizmente, a baboseira do promotor não colou.

Em 1996, quando Tiririca estava estourado em todo o país com a música “Florentina”, o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), entidade com sede no Rio de Janeiro, implicou com a faixa "Veja os Cabelos Dela", que foi considerada racista. O Ceap alegou que a letra ("Essa nega fede/ fede de lascar/ bicha fedorenta, fede mais que um gambá") denegria as mulheres negras e entrou com uma ação criminal contra o artista e a gravadora Sony.

Tiririca me disse, em entrevista, que a música era uma brincadeira com a esposa, Rogéria Márcia, cujo apelido era "Nega": "Eu escrevi a letra depois de um show. A Rogéria não tinha tomado banho e estava com uma catinga braba. Eu nunca quis falar mal de raça alguma." À época, Tiririca declarou aos jornais: "Como é que eu vou ser racista? Minha mãe é preta, meu cachorro é preto, meu carro é preto e eu sou rubro-negro. Preto é minha cor da sorte."

A explicação não convenceu a juíza Flávia Viveiros de Castro, que ordenou o recolhimento de todos os CDs e fitas de Tiririca. A Sony foi obrigada a destruir mais de 125 mil CDs que continham a faixa "Veja os Cabelos Dela" e a reimprimir o disco sem a música. A senadora Benedita da Silva, do PT, depôs contra Tiririca. A seu favor depuseram os cantores Agnaldo Timóteo e Ângela Maria. Em fevereiro de 1998, 18 meses depois da abertura do processo, o juiz Carlos Alfredo Flores, da 23ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, absolveu Tiririca e a Sony e revogou o veto à música. Em sua sentença, o juiz concluiu que o Ministério Público havia se precipitado ao deflagrar a ação penal sem analisar com maior profundidade a letra da música.

Mesmo com a absolvição, Tiririca perdeu muito dinheiro. As vendas do disco caíram, os shows minguaram, e ele sofreu vários processos por racismo. Foram movidas quatro ações cíveis contra o artista em São Paulo, Rio, Bahia e Barbacena (MG), todas pedindo compensação financeira. Cada um dos processos exigia, em média, R$ 1 milhão. Na Bahia, quatro mulheres entraram com um processo pedindo uma indenização por danos morais no valor de 4.000 salários mínimos e mais 35% do dinheiro arrecadado com a venda de 300 mil CDs de Tiririca, o que totalizaria, na época, cerca de R$ 2 milhões.

Mas não foi só. Em 1997. Tiririca escreveu uma letra engraçada, "Eu Vou Comer Você", ironizando os personagens Chapeuzinho Vermelho e Lobo Mau. Na letra, incluiu o verso "pela estrada afora/ eu vou bem sozinha/ levar esses doces para a vovozinha", que fazia parte da cantiga "Chapeuzinho Vermelho", escrita em 1946 por Carlos Alberto Ferreira Braga, o Braguinha, autor de clássicos como "As Pastorinhas" e "Touradas em Madri".

Braguinha não gostou de ter sua obra associada a Tiririca e pediu o recolhimento dos discos. A Sony afirmou que tinha a autorização da editora de Braguinha para utilizar a música, mas, para evitar nova batalha judicial, decidiu pagar uma indenização.

"Como é que eu ia saber que a música era do Braguinha?", defende-se Tiririca. "Eu canto essa musiquinha desde pequeno!"

Infelizmente, Braguinha não está mais entre nós. Mas o “Rei” Roberto está, e eu gostaria de deixar uma pergunta para ele: se, em vez de Tiririca, essa criatura feia, pobre e desdentada, algum artista mais “sofisticado” – digamos, uma Fernanda Montenegro ou um Jô Soares – resolvesse se candidatar e usasse uma de suas canções, Vossa Majestade se revoltaria também? Ou o problema é com Tiririca?

P.S.: Sábado estarei no Porto Iracema, em Fortaleza, para um debate sobre meu livo "Pavões Misteriosos - 1974-1983: A Explosão da Música Pop no Brasil".

P.S. 2: Hoje, estarei fora o dia todo e só poderei moderar e responder comentários no fim da tarde.

 

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CRIOLO, MAS PODE CHAMAR DE CLARA NUNES…

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clara criolo CRIOLO, MAS PODE CHAMAR DE CLARA NUNES...

 

O mundinho indie-Sesc-Vila Madalena está em polvorosa: em entrevista à “Billboard”, o autor de uma famosa música gravada por Clara Nunes (1942-1983) diz que Criolo plagiou sua canção de forma “escandalosa”.

Armando Fernandes, conhecido por Mamão, tem 76 anos e escreveu “Tristeza Pé no Chão” em 1973, 38 anos antes de Criolo lançar “Linha de Frente”, samba de seu disco “Nó na Orelha”. A “Billboard” localizou Mamão em Minas Gerais (leia a matéria completa aqui).

Compare as duas músicas:

 

 

 

A “Billboard” tentou entrar em contato com Criolo, mas o cantor, que estava se apresentando com Milton Nascimento em São Paulo, não retornou o contato (numa nota triste, Milton passou mal durante o show, abandonou o palco e foi levado ao Incor; felizmente, parece que está tudo bem).

Antes que o fã-clube de Criolo na PUC diga que a acusação de plágio não passa de uma manipulação da mídia burguesa e elitista contra o artista popular, vale lembrar que Mamão também é um artista popular e, ao que consta, faria bom uso do dinheiro de royalties, caso fique comprovada a coincidência entre as músicas.

Afinal, como diz Criolo, “a alma flutua, o corpo precisa de alimento. Se não tem leite, a criança chora”.

 

 

CORREÇÕES EM “PAVÕES MISTERIOSOS”

Agradeço a todos os leitores que escreveram apontando dois erros em meu livro “Pavões Misteriosos”. Ambos já haviam sido identificados e corrigidos na segunda impressão. Por um erro de digitação, a idade de Ney Matogrosso em 1973, quando foi lançado o primeiro LP dos Secos e Molhados – 32 anos – saiu como “23”, com os números trocados. E na descrição do LP “Paêbiru”, de Zé Ramalho, cometi a sandice de confundir Zé Geraldo com Geraldo Azevedo. Peço desculpas aos artistas. No capítulo sobre o produtor Roberto Livi, “inventor” de Sidney Magal, há uma frase que aparece duas vezes na sequência. O erro também já foi corrigido. Obrigado a todos.

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EM BUSCA DA BUCHADA PERDIDA (E “PAVÕES” NO RIO)

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11 EM BUSCA DA BUCHADA PERDIDA (E “PAVÕES” NO RIO)

Fui a Fortaleza para um debate – muito bom, aliás - sobre meu livro, “Pavões Misteriosos”, e aproveitei dois dias na capital cearense para uma exploração gastronômica. O objetivo: degustar buchada, paçoca, panelada, sarrabulho, mão de vaca e outras delícias da culinária regional.

Toda vez que chego a uma cidade que não conheço, peço dicas a taxistas. “Leve-me onde você janta com sua família” é uma frase que sempre dá certo. Ou quase sempre: em Fortaleza, parece que todos os taxistas têm algum tipo de acordo com determinados restaurantes, e acabam indicando as mesmas armadilhas de turista.

Acabei num dos restaurantes mais famosos e “estrelados” da cidade. Dei uma olhada no público de mauricinhos, nas babás cuidando das crianças e nas TVs de plasma, e saí de lá correndo. Peguei um táxi e fui ao Mercado Central, onde disseram que havia bons restaurantes.

Outra furada: no mercado comprei castanhas e doces, mas os restaurantes não eram o que eu esperava: pra começar, todos usavam o odioso sistema “serve-serve”, e o cardápio era uma mistureba desgracenta: macarrão, peixe frito, feijoada, tudo ao mesmo tempo agora.

Puxei conversa com um vendedor de castanhas, que indicou um restaurante “bem típico, da roça mesmo”. Até o nome do lugar remetia a rincões sertanejos. Esse prometia.

Cheguei ao restaurante e a decepção foi imediata: o lugar não só usava o tal sistema “serve-serve”, como tinha cartão de consumação. E nada aniquila meu apetite tão rápido quanto cartão de consumação. Nem TV exibindo o programa da Regina Casé.

O restaurante era daqueles lugares que fingem descontração e autenticidade: garçonetes usam chapéus de cangaceiro, mas pegam os pedidos em palmtops; gerentes sugerem aos clientes baixar o aplicativo do restaurante; um grupo de modelos aparece distribuindo folhetos de um empreendimento de “alto padrão” na região.

Na aparência, o restaurante era tradicional e respeitador das tradições culinárias locais, mas era só papo furado. Pedi um suco de caju. A garçonete disse: “Natural, só laranja e limão, senhor”. Frutas típicas – cajá, caju, mangaba – só em polpa. Era mais fácil achar um Nespresso em Fortaleza do que um suco de cajá natural.

Fortaleza é uma metrópole, e ninguém vai a um restaurante de comida sertaneja esperando ver cabritos andando entre as mesas. Mas é triste constatar como o público – e não falo só de Fortaleza, mas de Rio e São Paulo também – adora esses lugares falsos que posam de autênticos, com garçons fantasiados e decoração à Disney, parecendo bufês infantis. Talvez esses simulacros deem às pessoas uma sensação de pertencimento, de experimentar a “realidade”, mas de uma forma segura e controlada.

De volta ao hotel, conversei com um segurança que vigiava a calçada. Perguntei onde poderia comer uma buchada autêntica, sem garçom fantasiado, sem “serve-serve” e sem cartão de consumação. “Olha, senhor”, disse o rapaz, “Tem um lugar, mas não sei se o senhor vai gostar, não é um lugar assim de muito bom nível...” Nada mais preconceituoso que o povão, não é mesmo?

No domingo de manhã, fui ao local. Era o Mercado São Sebastião, um centro popular onde se vende de tudo: frutas, carnes, queijos, peixes, rações para animais e utensílios para cozinha. Na porta, um trio de forró formado por crianças animava os clientes e pessoas faziam propaganda de candidatos: Preta do Churrasquinho, Alison o Lindão e, o melhor de todos, Perereca do Alumim.

Em um canto do mercado, há vários restaurantes de comidas típicas. Todos têm mesas de plástico, cardápio parecido – carne de sol, buchada, rabada, carneiro, língua – e estavam lotados. Era ali mesmo.

Simpatizei com a foto de Dona Neuza, a “Rainha da Buchada”, e tracei uma panelada (cozido de tripa, bucho e pata de boi) com arroz e cuscuz. Preço: dez reais. De sobremesa, doce de caju comprado de um ambulante. O almoço todo saiu mais barato que o táxi até o Mercado São Sebastião.

Mas o domingão estava só começando: de lá, rumei ao centro da cidade, onde haviam recomendado um lugar chamado Raimundo do Queijo. Era sensacional: numa esquina, debaixo de um toldo, mais de cem pessoas se acotovelavam em mesas de plástico para comer queijo coalho, carne de sol e tomar cachaça e cerveja. Um tecladista e um cantor animavam a massa com sucessos de forró, brega, Jovem Guarda e música romântica. Teve Amado Batista, Odair José, The Fevers, Roberto Carlos, Reginaldo Rossi e até “Menina Veneno”. Quando o cantor começou “Fogo e Paixão”, de Wando, o lugar quase explodiu: casais sessentões dançavam agarradinhos, grupos de senhoras levantavam os braços, como se estivessem no auditório do Chacrinha. Tudo num clima divertido e descontraído. Vejam que beleza:

21 EM BUSCA DA BUCHADA PERDIDA (E “PAVÕES” NO RIO)

Obrigado, Neuza da Buchada e Raimundo do Queijo, por refeições inesquecíveis em Fortaleza.

“PAVÕES MISTERIOSOS” NO RIO DE JANEIRO

Quarta-feira acontece o lançamento de meu novo livro, “Pavões Misteriosos: 1974-1983: a Explosão da Música Pop no Brasil” no Rio de Janeiro. Será às 19h na Livraria Travessa do Shopping Leblon (Av. Afrânio de Mello Franco, 290, loja 205ª, 2º piso). Espero todos os amigos cariocas lá. Infelizmente, o debate que deveria rolar com o Ritchie foi cancelado, por um problema de data. Pedimos desculpas ao Ritchie, que não teve culpa nenhuma no cancelamento.

P.S.: E o caso do suposto plágio de Criolo a uma música gravada por Clara Nunes chega ao fim (leia aqui). Tudo não passou de um "mal entendido". Segundo o artigo, Criolo teria procurado a gravadora da música de Clara para "acertar quaisquer pendências". 

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ORDEM, PROGRESSO… E OSTENTAÇÃO

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ostentaçao ORDEM, PROGRESSO... E OSTENTAÇÃO

Nada une o Brasil como a ostentação. Rico, pobre, branco, preto, amarelo, homem, mulher, sulista, nordestino, torcedor do América, todo mundo só quer ostentar.

Recentemente, soube de três casos que dão uma boa ideia do tipo de país que nos tornamos - e que estamos deixando pros nossos filhos.

O primeiro, descobri ao visitar um empreendimento imobiliário que um amigo, corretor de imóveis, estava vendendo. Era um condomínio de casas populares em uma região de praia e direcionado a um público de baixa renda. Foi um sucesso: as 22 casas foram vendidas em menos de quatro meses. Os clientes aproveitaram créditos de bancos e arremataram todas as unidades.

Eram apartamentos modestos, de 50m2, com dois quartos pequenos, banheiro, uma sala e cozinha. Mas havia uma atração que destoava da simplicidade das construções: uma linda e reluzente quadra de tênis. A quadra estava novinha e parecia nem ter sido usada. “E não foi mesmo”, disse meu amigo. “Ninguém aqui joga tênis. Em compensação, o espaço gourmet (área com churrasqueira) está sempre lotado, tem fila de espera”.

Perguntei por que o dono construiu uma quadra de tênis onde ninguém joga tênis. “Ah, os clientes gostaram porque podem dizer pros amigos que moram num lugar que tem quadra de tênis. Foi o maior chamariz pra venda”.

Dias depois, uma arquiteta nos contou sobre a visita que fizera a outro empreendimento, este próximo a Campos do Jordão. Segundo ela, a nova moda em casas populares na região era a chamada “lareira design”, que consiste em um buraco na parede, fechado por um vidro escuro. Dentro do buraco passa um cano de gás com pequenas aberturas, que simulam as chamas de uma lareira. “Um corretor disse que, quando contava pro cliente que ele poderia ter uma lareira em casa, o cliente fechava na hora”, disse a arquiteta.

O terceiro caso, li em uma reportagem de uma revista náutica. Não lembro o local exato, mas a história era mais ou menos assim: um ricaço, dono de uma mansão em um condomínio de luxo às margens de uma pequena represa, mandou rebocar para o local um iate de 52 pés (16 metros). O barco destoava absurdamente das pequenas lanchas usadas pelos vizinhos. Era tão grande que o dono nem podia ligar os motores com força máxima, ou a embarcação chegaria ao outro lado da represa em questão de segundos. Imagine alguém remando uma canoa dentro de uma piscina de 25 metros, e você terá uma ideia do ridículo da situação.

O repórter perguntou ao dono do iate por que ele tinha um barco tão grande em águas tão restritas. E a resposta foi mais ou menos essa: “Eu gosto de saber que ninguém aqui vai ter um barco maior que o meu”.

Não me surpreenderia se algum vizinho lesse a bravata, comprasse a briga e trouxesse para a represa uma lancha de 80 pés. Daqui a pouco, veremos no local um engarrafamento de iates. Podem esperar.

P.S.: Estarei fora o dia todo e impossibilitado de moderar e responder comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência.

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UM LIVRO PARA ENTENDER A AMÉRICA

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desagregação UM LIVRO PARA ENTENDER A AMÉRICA

Acaba de sair no Brasil “Desagregação – Por Dentro de uma Nova América”, um dos livros de não-ficção mais impressionantes e reveladores que li em muito tempo.

Packer, repórter da revista “The New Yorker”, conta a história das últimas três décadas dos Estados Unidos. E faz isso de forma original e surpreendente, por meio de perfis de diversas pessoas.

O livro parece um quebra-cabeça: no início não se percebe a relação entre as histórias, mas, à medida que Packer vai revelando os personagens - de empresários a políticos, de lobbystas a operários, de celebridades a escritores - começamos a perceber como eles se completam e contam a mesma saga: a de um país que foi, pouco a pouco, vendo sua democracia e seus valores fundamentais sendo distorcidos.

“Desagregação” explica como os Estados Unidos passaram de um bastião da democracia e do otimismo no pós-guerra a uma monstruosidade dominada por megacorporações, com centenas de cidades dizimadas por crises econômicas, globalização e a perda de empregos para países do Terceiro Mundo.

Uma das personagens é Tammy Carter, uma operária negra de uma fábrica de carros em Youngstown, no estado de Ohio. Ao contar a história de Tammy, Packer explica como Youngstown, uma potência industrial do nordeste americano, viu sua economia destruída pela falência da indústria automobilística da região e seus bairros transformados em lixões dominados por gangues de traficantes. A história parece um romance policial.

Outro personagem fascinante é Jeff Connaughton, um idealista líder estudantil que vai a Washington trabalhar na campanha de um candidato, mas se desilude com a política e acaba virando lobbysta de grandes empresas junto ao governo. A saga de Jeff explica como nenhuma decisão em Washington é tomada sem uma bênção corporativa.

Às vezes, os personagens de Packer não são pessoas, mas cidades. Uma das histórias mais escabrosas é a da bolha imobiliária em Tampa, na Flórida. O autor conta como a ganância de empreendedores e a incompetência/corrupção de políticos permitiu a criação de centenas de bairros e empreendimentos em meio a áreas completamente desabitadas e desertas, criando cidades-fantasmas que logo foram abandonadas.

Packer também traça o perfil de celebridades, como a apresentadora de TV Oprah Winfrey e o cantor Jay-Z, e dedica um capítulo ao escritor Raymond Carver, cujas histórias melancólicas e realistas retratavam personagens vivendo nos subúrbios de classe média baixa, dominadas por gigantescas lojas de departamentos e lanchonetes de fast food. E o perfil de Sam Walton, criador da cadeia Wal-Mart, é um primor de concisão e objetividade.

“Desagregação” fala dos Estados Unidos, mas algumas das histórias poderiam muito bem se passar no Brasil. Quando alguém vai escrever um livro explicando por que importamos tudo de pior que vem da América, mas não a crença na democracia que, mesmo maltratada, ainda é o que a América tem de melhor?

P.S.: Estarei fora por boa parte do dia e impossibilitado de moderar e responder comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, peço desculpas e um pouco de paciência.

 

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DO AFEGANISTÃO, UM FILME SURPREENDENTE

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Há muito tempo o cinema não mostrava uma personagem tão forte e complexa quanto a mulher sem nome interpretada pela atriz iraniana Golshifteh Farahari em “A Pedra de Paciência”, de Atiq Rahimi.

Rahimi, um afegão que vive na França desde os anos 80, escreveu um romance e agora dirigiu um filme inspirado no livro. É uma história simples e minimalista, quase toda passada em um quarto, mas que diz muito sobre a vida das mulheres afegãs.

O filme – uma produção francesa e afegã - começa em um apartamento dilapidado por bombas e tiros, localizado em uma cidade em guerra. Uma mulher conversa com um corpo inerte e estendido no chão. O corpo é do marido – também não identificado – um guerrilheiro que levou um tiro no pescoço e está há semanas em estado vegetativo.

A mulher fala com o marido como se ele pudesse responder. Mas não existe diálogo. O homem permanece imóvel e mudo. Mesmo assim, ela faz questão de explicar tudo que está fazendo: “Vou à casa da minha tia pegar água, depois pego as crianças e volto para dar banho em você”.

Aos poucos, vamos descobrindo o passado da mulher e conhecendo outros personagens: seus dois filhos pequenos, uma tia que a ajuda com comida e água e um soldado afegão que invade o apartamento. Também descobrimos como o marido terminou naquela condição.

O roteiro foi escrito por Rahimi em parceria com o grande Jean-Claude Carrière, colaborador frequente de Buñuel, e é um primor de economia. A história vai sendo desvendada em pequenas doses, revelando, sem pressa, toda sua complexidade.

Apesar de sua estética realista, há sequências que parecem um sonho, especialmente as “conversas” entre mulher e marido. A impressão é de que ela só consegue estabelecer uma relação de proximidade e afeto com o marido quando ele está paralisado, e usa essa chance para dizer o que nunca pôde dizer antes.

“A Pedra de Paciência” não é um filme fácil e pode não ser a melhor pedida para um sabadão no Cineplex comendo pipoca. Mas para quem ainda acredita que o cinema pode surpreender, com uma história original e contada de forma surpreendente, periga ser a melhor atração em cartaz. Bom fim de semana.

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