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Os dez melhores livros do ano

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pilha livros Os dez melhores livros do anoAqui vai, sem ordem de preferência, a lista dos melhores livros que li em 2015. Peço desculpas pela pouca presença de obras de ficção, mas a verdade é que, nos últimos tempos, tenho lido mais autores antigos.

Mandem suas listas, por favor.

Na quinta publico a lista de melhores discos do ano e na sexta a de melhores filmes.

livro jll 203x300 Os dez melhores livros do ano
Jerry Lee Lewis – Sua Própria História, de Rick Bragg
Um dos melhores livros sobre música que já li é “Hellfire”, a biografia de Jerry Lee Lewis escrita por Nick Tosches. Mas essa autobiografia do “Killer”, narrada para Rick Bragg, não fica muito atrás. Um relato fascinante sobre o maior performer do rock.

As Aventuras do Bom Soldado Svejk, de Jaroslav Hasek
Lançado em 1921, saiu recentemente em nova edição brasileira e é uma obra-prima da literatura satírica, que relata as aventuras hilariantes de Svejk, um soldado cretino, na Primeira Guerra. Não sei como pude passar a vida inteira sem ter lido essa maravilha.

Sam Phillips – The Man Who Invented Rock’n’Roll, de Peter Guralnick
O livro acabou de sair e tem 800 páginas. Estou na metade e adorando. Guralnick fez livros clássicos sobre Elvis Presley e a música de raiz americana, e aqui conta em detalhes a vida e obra do homem que verdadeiramente “inventou” o rock, e que Guralnick conheceu por quase 25 anos.

The Song Machine – Inside the Hit Factory, de John Seabrook
História da música pop dos últimos vinte e tantos anos e dos superprodutores que dominam o mercado, como Max Martin, Dr. Luke, Denniz PoP e Stargate. Você pode não ser fã de Britney e Kary Perry, mas é fascinante descobrir os segredos por trás de seus hits.

Perfidia, de James Ellroy
Primeiro livro de uma tetralogia e projeto mais ambicioso de Ellroy: contar a origem de TODOS os personagens que criou em clássicos como “Dália Negra”, “Los Angeles, Cidade Proibida” e “Tabloide Americano”. O louco junta a trupe – 87 personagens, para ser exato – numa história absurdamente intrincada, sangrenta e doentia, passada nos dias que se seguiram ao bombardeio japonês a Pearl Harbor, em 1941. Setecentas e vinte páginas de pulp fiction da melhor qualidade.

livro nile 208x300 Os dez melhores livros do ano
Le Freak, de Nile Rodgers
Saiu este ano no Brasil e é uma das melhores autobiografias que li em muito tempo. As histórias sobre os megasucessos que Nile teve com Chic, Madonna e Bowie são demais, mas a descrição de sua infância absurdamente triste é a parte mais incrível do livro.

Como a Música Ficou Grátis, de Stephen Witt
Um livro de não-ficção com o ritmo e as surpresas de um thriller de espionagem, conta a história da decadência da indústria musical nas últimas duas décadas pela ótica de diversos personagens: o inventor do MP3, o líder de um grupo de piratas de música, um alto executivo de gravadora e outros.

Número Zero, de Umberto Eco
Me diverti demais com o relato ficcional de Eco sobre um jornal criado só para destruir reputações de adversários políticos. Passado em 1992 durante a investigação Mãos Limpas, poderia muito bem ter saído da cabeça de um autor brasileiro na era da Lava Jato.

Devoradores de sombras – A história real de uma jovem inglesa que desapareceu nas ruas de Tóquio e do mal que a aniquilou, de Richard Lloyd Parry
Lucie Blackman, uma jovem inglesa, desaparece misteriosamente enquanto trabalhava em uma casa noturna em Tóquio. A investigação desvenda não só o sumiço de Lucie, mas uma sombria e pouco falada rede de crimes contra estrangeiras na capital japonesa. Outro livro de jornalismo investigativo comum enredo digno de thriller policial.

livro mcewan 195x300 Os dez melhores livros do ano
A Balada de Adam Henry, de Ian McEwan
Um livro curto e emocionante sobre uma juíza que precisa decidir um caso polêmico sobre um menor de idade cujos pais, por motivos religiosos, recusam fazer a transfusão de sangue que pode salvar a vida do menino.

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Os dez melhores discos do ano

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Aqui vão, sem ordem de preferência, meus discos prediletos de 2015...

Songhoy Blues – Music in Exile
Quem gosta de Bombino, Terakaft, Tinariwen e outros sons do norte da África vai se esbaldar com o Songhoy Blues. Em “Music in Exile”, co-produzido por Nick Zinner, do Yeah Yeah Yeahs, a banda do Mali faz uma versão bem pop e comercial dos sons do deserto africano.

Jim O’Rourke – Simple Songs
Há uns dez anos, Jim O’Rourke largou o emprego no Sonic Youth e se mudou para o Japão, onde se dedica a trilhas sonoras para cinema e a fazer música cada vez mais estranha. Por isso é uma surpresa ouvir “Simple Songs”, seu quinto disco solo pela gravadora Drag City, onde lança seu trabalho, digamos, mais “convencional”. Acompanhado por músicos japoneses, O’Rourke fez uma espécie de ode ao pop setentista e autoral do qual ele é fã. E quem ouvir ecos de Genesis não estará delirando...

Sleater-Kinney – No Cities to Love
Que falta fez o Sleater-Kinney. Sumido por dez anos depois de lançar, entre 1994 e 2005, sete discos perfeitos de pós-punk, a banda voltou com um de seus melhores LPs, "No Cities to Love".

Riley Walker – Primrose Green
Um grande guitarrista fazendo folk acompanhado por músicos de jazz. Isso é “Primrose Green”, um disco misterioso e comovente. Tive a sorte de ver Walker ao vivo, e o impacto das canções foi imenso.

Beach House – Depression Cherry
O duo teve um ano ocupado, com o lançamento de dois discos de estúdio – este e “Thank Your Lucky Stars”. Mas “Depression Cherry” é o melhor, misturando um dream-pop lindo que remete a Cocteau Twins a esquisitices eletrônicas e sons distorcidos e psicodélicos.

Kamasi Washington – The Epic
Este foi dica dos leitores do blog. Ouvi “The Epic” pela primeira vez há uns três ou quatro meses, e continua em altíssima rotação aqui em casa. Um grande – em todos os sentidos: três CDs e quase três horas - disco de jazz moderno.

Death Grips – Jenny Death / The Powers That Be
Hardcore, noise e hip hop numa barulheira insana cometida por uma das bandas mais inclassificáveis dos últimos tempos. "Jeny Death" é a segunda parte - e melhor, na minha opinião - de um disco duplo chamado "The Powers That B", em que as metades foram lançadas com quase um ano de diferença. Inusitado. Quem já viu Death Grips ao vivo diz que é de outro planeta.

Viet Cong – Viet Cong
Excelente banda canadense.Para fãs de Siouxsie, Birthday Party e pós-punkices sombrias em geral. Alguns leitores comentaram que a banda teve de trocar de nome por causa de patrulhas politicamente corretas. As pessoas estão dementes.

Pond – Man It Feels Like Space Again
Pop psicodélico australiano ligado ao Tame Impala. “Man It Feels Like Space Again” é o sexto disco dos caras, e gostei bem mais do que o último do Impala.

Kurt Vile – B’lieve I’m Going Down
Esse cara é incapaz de gravar um disco ruim. Recomendado para quem gosta dos sons lo-fi psicodélicos do War on Drugs, que Vile fundou com Adam Granduciel.

MELHORES RELANÇAMENTOS
Lead Belly: The Smithsonisn Folkways Collection
Sly & the Family Stone – Live at the Fillmore East
Arnaldo Baptista – Edição Limitada
Led Zeppelin Remasters

Amanhã, a lista de melhores filmes do ano.

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Os dez melhores filmes de 2015

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Aqui vão, sem ordem de preferência, os dez melhores filmes que vi em 2015. Privilegiei títulos lançados no Brasil. Todos estão disponíveis em locadoras ou serviços de streaming nacionais.

Lembrando que alguns dos filmes que possivelmente estariam na lista de melhores do ano – “Carol”, de Todd Haynes, “The Big Short”, de Adam McKay – ainda não saíram por aqui.

Vício Inerente, de Paul Thomas Anderson
Baseado no livro de Thomas Pynchon, é um thriller detetivesco, lisérgico e hilariante sobre o início dos anos 70 na Califórnia, quando a contracultura se choca com Nixon. Sugiro uma sessão dupla com “Medo e Delírio”, de Terry Gilliam.

Timbuktu, de Abderrahmane Sissako
A vida de uma aldeia no norte do Mali tomada por extremistas. Poderia ter virado um dramalhão novelesco nas mãos de um diretor menos competente, mas Sissako é muito talentoso e consegue incluir passagens irônicas e engraçadas na narrativa. Fora que tem uma das melhores cenas de futebol já filmadas.

Night Will Fall, de Andre Singer
Em 1945, o produtor de cinema Sid Bernstein e Alfred Hitchcock juntaram forças para realizar um documentário sobre a libertação dos campos de concentração nazistas pelas forças Aliadas. O filme nunca foi terminado. Mais de 70 anos depois, o documentarista Andre Singer conta, em “Night Will Fall”, a história desse projeto. Assustador é pouco.

The Overnighters, de Jesse Moss
Quando empregos em campos de petróleo começam a atrair dezenas de milhares de pessoas ao estado de Dakota do Norte, um pastor briga com sua pequena cidade para permitir que os trabalhadores usem sua igreja como hospedagem. O final é tão surpreendente que, se um roteirista escrevesse como obra de ficção, diriam que ele havia exagerado.

Mapas para as Estrelas, de David Cronenberg
David Cronenberg filmou Homens-Mosca, cérebros que explodem por poderes telecinéticos e explorou os universos de Kafka, Stephen King e Ballard. Mas em “Mapas para as Estrelas” ele ataca um mundo ainda mais bizarro, o das megacelebridades hollywoodianas. Julianne Moore antológica.

What Happened, Miss Simone?, de Liz Garbus
Excelente documentário sobre a grande cantora norte-americana Nina Simone (1933-2003). Apesar de chancelado pela família de Simone e, por isso, evitar passagens mais tristes da vida da artista, tem imagens de arquivo impressionantes que mostram por que ela foi uma cantora única.

Going Clear: Scientology and the Prison of Belief, de Alex Gibney
Dirigido por Alex Gibney, responsável por excelentes documentários sobre o Wikileaks e o escândalo da Enron, e baseado no livro do jornalista investigativo Lawrence Wright, “Going Clear” conta a história da Cientologia e de seu criador, L. Ron Hubbard (1911-1986). Mas é a segunda parte, depois da morte de Hubbard e com a ascensão de seu “vice”, David Miscavige, que o filme fica realmente assustador. E quem ainda tinha dúvidas de que Tom Cruise tem vários parafusos a menos vai se convencer.

Sicario, de Dennis Villeneuve
Grande thriller do canadense Dennis Villeneuve (“Suspeitos”) sobre uma equipe de elite do exército norte-americano que combate uma rede de traficantes de drogas na fronteira com o México. Emily Blunt surpreende, mas quem comanda o filme é Benicio Del Toro. Há um tiroteio em meio a um engarrafamento de trânsito que merece ser visto e revisto.

O Ano Mais Violento, de J.C. Chandor
Sidney Lumet vive. Não, não é verdade, ele morreu em 2011. Mas o espírito de seus filmes – thrillers urbanos nova-iorquinos sobre a marginalidade e a política – sobrevive em “O Ano Mais Violento”, filmaço de J.C. Chandor em que Oscar Isaac faz o dono de uma firma de venda de óleo para aquecedores que precisa lidar com uma concorrência, digamos, feroz.

Ida, de Pawel Pawlikowski
Excepcional filme polonês, filmado em preto e branco, sobre uma noviça que, nos anos 60, vai visitar uma tia e descobre segredos terríveis sobre sua família. Foi lançado no finzinho de 2014 e por isso não entrou na minha lista do ano passado.

O blog volta em 11 de janeiro. Um maravilhoso fim de ano para todos e até lá.

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Lemmy: recordar é viver

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lemmy memorial 2 Lemmy: recordar é viverQue linda despedida teve Lemmy Kilmister.

Sábado, em Los Angeles, parentes e amigos se reuniram para um memorial em homenagem ao líder do Motorhead, que morreu em 28 de dezembro, aos 70 anos (veja aqui a íntegra):

Foi uma cerimônia simples. O pequeno palco foi decorado com arranjos de flores, fotos de Lemmy e da banda, os amplificadores Marshall e o baixo Rickenbacker que Lemmy usou por tanto tempo.

Amigos célebres e desconhecidos se revezaram fazendo pequenos discursos sobre o homem. Lemmy foi descrito como um sujeito 100% leal, que fazia de tudo para ajudar os amigos. Seu carinho e dedicação à equipe do Motorhead e aos fãs da banda também ocuparam boa parte dos discursos.

lemmy memorial Lemmy: recordar é viver

Mikey, um motociclista que trabalha como adestrador de cobras dos shows de Alice Cooper, contou que conheceu Lemmy num show de Cooper e se tornaram amigos instantâneos. "Aquele show foi traumático, porque uma das cobras cagou em cima da cabeça de Alice Coooper", contou. "Lemmy quase morreu de rir quando viu aquilo". Dali, a dupla foi ao bar Rainbow, espécie de segundo lar de Lemmy, levando duas cobras de dois metros de comprimento. Mikey chorou ao lembrar as incontáveis vezes em que terminou a noite com Lemmy em um bar de strip.

Matt Sorum, baterista do Guns 'n Roses e do Velvet Revolver, lembrou a inabalável sinceridade de Lemmy. "Um dia, recebi uma mensagem de texto de Lemmy, perguntando se eu queria substituir Mikkey Dee, que estava doente e não poderia comparecer a alguns shows. Perguntei: 'Por que eu?", e Lemmy respondeu: "Porque Dave Grohl não estava disponível!"

Scott Ian, do Anthrax, lembrou a emoção que sentiu ao ouvir, em 1980, o álbum "Ace of Spades", em que Lemmy, "Fast" Eddie Clarke e Philty "Animal" Taylor aparecem na capa vestidos de bandoleiros: "A única coisa que pensava era: quem diabos são esses mexicanos?"

Rob Halford, do Judas Priest, lembrou uma cena comovente, que disse ter ocorrido recentemente na América do Sul (terá sido no Brasil?): no aeroporto, encontrou Lemmy, bastante abatido, sentado no setor de embarque, pegou em sua mão e ficou ali por minutos, em silêncio, de mãos dadas com o amigo.

Slash ficou muito emocionado ao lembrar o amigo: "Ele tinha mais integridade em uma ponta do dedo do que um quarto cheio de roqueiros". O guitarrista do Guns contou que, sempre que encontrava Lemmy, costumava brindar com uma garrafa de Jack Daniel's que guardava no bolso. "Depois que voltei do rehab e parei de beber, a única coisa chata de estar sóbrio era não poder brindar com o Lem".

Robert Trujillo e Lars Ulrich, do Metallica, também contaram histórias bonitas sobre o ídolo. Trujillo lembrou um encontro que teve em um clube com Lemmy e Joni Mitchell, em que o baixista do Motorhead, provando que seu gosto musical não se limitava ao rock pesado, passou a noite perguntando a Mitchell sobre os acordes que usara no álbum "Court and Spark", de 1974.

Ulrich lembrou sua adoração pelo Motorhead e o carinho com que era tratado por Lemmy, mesmo quando ainda não havia montado o Metallica e era apenas um fã da banda. O baterista contou uma história de quando vomitou no quarto de hotel de Lemmy depois de uma bebedeira. Lemmy não só fotografou a cena como a publicou, anos depois, no encarte do álbum "Orgasmatron".

Um dos momentos mais comoventes foi a eulogia de Dave Grohl, que disse ter conhecido Lemmy há mais de 20 anos, em um bar. Quando se aproximou do ídolo, a primeira reação de Lemmy foi dizer que sentia muito pela morte de Kurt Cobain.

Lemmy e Grohl tornaram-se grandes amigos e tinham em comum a paixão pela música de Little Richard. Um dia, Grohl encontrou Little Richard no aeroporto e pediu um autógrafo, com a ideia de presentear Lemmy com o souvenir. Grohl mostrou a foto e disse, chorando, que acabou nunca dando a foto de presente ao amigo. E encerrou lendo a letra da canção religiosa "`Precious Lord, Take My Hand", que Little Richard costuma cantar. Nunca tantos metaleiros choraram juntos.

O fim foi lindo: um roadie colocou o baixo de Lemmy em frente à pilha de Marshalls e deixou a microfonia tomar conta do lugar. Como sempre, Lemmy fez mais barulho que todo mundo.

P.S.: Eu havia prometido voltar a publicar no blog dia 11, mas o texto sobre o memorial de Lemmy não podia esperar. O blog volta com um texto inédito na terça, dia 12. Até lá.

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David Bowie: a metamorfose ambulante

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Bowie AGES David Bowie: a metamorfose ambulantePor onde começar um texto sobre David Bowie?

Criador do glam rock?

Pioneiro do punk?

Cientista maluco dos experimentos eletrônicos de vanguarda?

Inventor da new wave e do new romantic?

David Robert Jones foi tudo isso e muito mais. Por quase 50 anos, ele foi o criador mais eclético da história da música pop, um gênio que imprimiu seu talento a um sem-número de estilos e gêneros musicais.

Bowie nunca foi um antecipador de tendências. O que ele fez, melhor que ninguém, foi pegar um estilo que estava em voga e carimbar nele a sua marca.

Fez isso no início dos anos 70, quando ajudou a inventar o glam rock, junto ao Lou Reed da fase "Transformer", Marc Bolan e Mott the Hoople, em discos como "Hunky Dory" e "Ziggy Stardust".

Continuou em 1973 e 74, ao lançar, inspirado nos sons abrasivos e pesados dos Stooges - e no "Laranja Mecânica" de Burgess - discos como "Aladdin Sane" e "Diamond Dogs", tratados desesperançados e distópicos sobre um mundo em ebulição.

Em 1975, pulou das guitarras distorcidas proto-punk para o "funk plástico" de "Young Americans" (1975), tributo à era disco e aos sons negros e dançantes americanos, para logo depois embarcar em uma trip germânica, altamente influenciada por Kraftwerk, lançando uma tríade de obras-primas do pop eletrônico, "Low", "Heroes" e "Lodger".

Não foi só. Bowie depois mostrou que era capaz de fazer pop de FM como ninguém em "Let's Dance" (1983), ao mesmo tempo em que inspirava, musical e esteticamente, grupos como Duran Duran e Spandau Ballet a criarem o movimento new romantic.

E essa lista que acabei de fazer deixou de fora discos extraordinários como "Station to Station" (1976) e "Scary Monsters" (1980).

Enfim, David Bowie foi o maior experimentador que a música pop já conheceu. Um artista completo e sempre disposto a começar do zero. Um gênio em constante mutação. Não é à toa que cada fã tem sua fase predileta de Bowie.

Na árvore genealógica do pop, todos os artistas vêm acompanhados de seus respectivos estilos: Michael Jackson? Funk e soul. Bruce Springsteen? Folk, country e rock americano. Beach Boys? Doo-wop e surf music.

Mas e David Bowie? Como definir um sujeito indefinível?

Desde o fim dos anos 60, quando largou o nome Davie Jones e adotou o nome artístico David Bowie, ele se pautou pela imprevisibilidade. Nunca lançou dois discos iguais na sequência e nunca deixou que o sucesso tirasse seu ímpeto de mudar, mudar e mudar. Ch-ch-ch-ch-changes foi seu lema.

Nos últimos anos, Bowie diminuiu o ritmo. Doente, passou quase uma década sem gravar, até voltar recentemente com o ótimo "The Next Day", que remetia ao pós-punk oitentista de "Scary Monsters".

Mesmo ausente, era bom saber que Bowie estava por aí, sempre antenado nas novidades (amigos revelaram, em entrevistas recentes, que ele estava adorando Death Grips e o disco mais recente do Boards of Canada) e tramando algum projeto interessante.

O legado de David Bowie é imenso. Não existe um fã de música pop que não tenha sido, em algum momento, influenciado por ele. Deixou discos extraordinários que merecem ser ouvidos para sempre. O problema é escolher por onde começar.

Minha sugestão?

Comece pelo começo. Ouça os primeiros e dali, prossiga na ordem cronológica, sempre atentando para o período em que foram lançados. Ouça os discos lendo "David Bowie e os Anos 70", de Peter Doggett, e entenda as circunstâncias - sociais, políticas, culturais - que inspiraram a música de Bowie. Assim fica mais fácil compreender a grandeza de sua obra e o tamanho de sua genialidade.

Hoje é dia de ouvir Bowie o dia todo.

P.S.: Escrevi, para a "Folha", outro texto sobre David Bowie (leia aqui).

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David Bowie em dez versos

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404322 david bowie 640x366 David Bowie em dez versosOntem escrevi quatro textos sobre David Bowie. Um aqui para o blog e três para a “Folha de S. Paulo”.

O primeiro texto para a “Folha” foi uma tentativa de resumir, em três mil toques, a carreira musical do homem.

O segundo foi uma análise do disco “Blackstar”, o primeiro testamento musical do pop.

O terceiro foi sobre três shows de Bowie que tive a sorte de ver (por falta de espaço, o texto saiu editado no jornal; amanhã publico a íntegra aqui no blog).

Para hoje, escolhi dez trechos de letras marcantes de de David Bowie.

Vale lembrar que poucos artistas escreveram letras tão crípticas e impenetráveis quanto Bowie. Ele nunca disse as coisas da maneira mais simples. Sempre preferiu analogias e mistérios.

Como analisar uma letra como a de “Quicksand” (1971) sem conhecer a obsessão de Bowie pelo ocultismo e por Aleister Crowley? Impossível.

Mais uma vez, recomendo a leitura de “David Bowie e os Anos 70”, de Peter Doggett, em que o autor destrincha a obra de Bowie na década de 70 e explica as circunstâncias culturais, sociais, políticas e comportamentais que inspiraram as letras.

Em ordem cronológica:

Agora é hora de sair da cápsula / se você tem coragem
Space Oddity, 1969

Dizem que sua vida vai muito bem / Dizem que você brilha como uma menininha / mas algo me diz que você se esconde / quando o mundo é quente e cansado / você chora um pouco no escuro / eu também / não tenho certeza o que você deve dizer / mas posso ver que não está bem
Letter to Hermione, 1969

Dia após dia / eles mandam meus amigos / para mansões frias e cinzas / do outro lado da cidade / onde homens magros vigiam as ruas / e os sãos permanecem nos subterrâneos
All the Madmen, 1970

Eu não sabia o que estava esperando / e meu tempo corria solto / um milhão de ruas sem saída / e sempre eu achava que estava no caminho certo / parecia que o gosto não era tão doce / então eu me virei para olhar para mim mesmo / mas nunca consegui perceber / como os outros vêem o farsante / eu sou rápido demais para fazer esse teste / mudanças / vire-se e contemple o estranho
Changes, 1971

Ouça esse Robert Zimmermann / escrevi uma canção para você / sobre um homem jovem e estranho / chamado Dylan / com uma voz como areia e cola / e palavras de vingança / elas podiam nos derrubar / trouxeram mais pessoas / e amedrontaram muitas mais
Song for Bob Dylan, 1971

Eles vão rachar ao meio seu crânio bonitinho / e enchê-lo de ar / e te dizer que você tem 80 anos, mas irmão, você não vai se importar / você vai se deixar injetar qualquer coisa sem pensar no amanhã / Cuidado com a mordida selvagem / de 1984
1984, 1974

Não é o efeito da cocaína / penso que pode ser o amor
Station to Station, 1976

Às vezes você fica tão só / às vezes você chega a lugar nenhum / eu vivi por todo o mundo / e deixei todos os lugares / por favor, seja minha / divida minha vida / fique comigo / seja minha esposa
Be My Wife, 1977

Caso essa viagem fantástica / torne-se erosão / e nós nunca envelhecermos / lembre-se, é verdade, a dignidade vale muito / mas as nossas vidas são valiosas também
Fantastic Voyage, 1979

Ela abria portas estranhas / que nós nunca fecharíamos
Scary Monsters (and Super Creeps), 1980

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Bowie em três shows

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O primeiro show de David Bowie ninguém esquece. O meu foi em 20 de setembro de 1990, na Praça da Apoteose, no Rio. Era a estreia de Bowie em palcos brasileiros e o primeiro concerto na América do Sul da turnê "Sound + Vision" ("Som e Visão"), em que Bowie revisitava os maiores sucessos da carreira.

A única reclamação do público foi que o show teve bastante "sound", mas nenhuma "vision", já que a imensa tela de projeção, uma das grandes atrações da turnê, não foi usada. Mesmo assim, foi uma emoção incrível ver Bowie, de camisa branca de mangas compridas e gola bufante, acompanhado de uma banda de apenas cinco integrantes (incluindo o guitarrista Adrian Belew, do grupo King Crimson), tocar um repertório que incluiu "Rebel Rebel", "Ziggy Stardust", "Changes", e que foi encerrado com uma versão de "Gloria", do grupo Them.

Na época, Bowie jurou que aquela seria a última vez que tocaria a maioria daquelas canções. Felizmente, ele descumpriu a promessa.

Meu encontro seguinte com Bowie foi em 9 de janeiro de 1997, no Madison Square Garden, em Nova York. Era um show muito especial, a comemoração dos 50 anos do Camaleão, e um elenco de peso foi convidado para a festa: Foo Fighters, Sonic Youth, Robert Smith (The Cure), Frank Black (Pixies) e Billy Corgan (Smashing Pumpkins) subiram ao palco para tocar com Bowie.

De repente, Bowie chamou um amigo querido e herói da contracultura nova-iorquina: "O rei de Nova York, senhor Lou Reed!", e o lugar quase veio abaixo. Os dois emendaram "Queen Bitch", de Bowie, e três clássicos de Reed, "Waiting for the Man", "Dirty Boulevard" e "White Light White Heat".

Revendo essa cena no Youtube, é impossível não lembrar que esses dois "Transformers" partiram com pouco mais de dois anos de intervalo, deixando Iggy Pop sozinho como o último sobrevivente da geração de iconoclastas que nos salvou do otimismo hippie.

Pouco mais de dois anos depois, em 19 de novembro de 1999, uma assessora da gravadora Virgin me convidou para um show no Kit Kat Klub, um teatro de mil lugares em Nova York: "Não posso dizer quem vai tocar, mas sugiro que você não perca". Era Bowie, em turnê promocional - e secreta - de seu álbum "Hours".

Ver David Bowie num palco a poucos metros de distância foi uma experiência marcante. A banda era sensacional - Gail Ann Dorsey no baixo, Sterling Campbell na bateria, o grande Page Hamilton, da banda Helmet, na guitarra - e o repertório misturava músicas novas, clássicos habituais dos shows de Bowie, como "Life on Mars?" e "Ashes to Ashes", e canções que ele não tocava com tanta frequência, como "Always Crashing in the Same Car" (do álbum "Low", de 1977), "Drive-In Saturday" (de "Aladdin Sane", 1973) e "Repetition" (de "Lodger", 1979).

Foi uma noite rara e que nunca vou esquecer.

P.S.: Fiz esse texto para a "Folha" mas, por motivo de espaço, foi publicado em versão reduzida. Esta é a versão completa.

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Já viu “Making a Murderer”?

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O Netflix está exibindo, desde o fim de 2015, a série documental “Making a Murderer”. Assisti no fim do ano e a história acabou com os festejos natalinos e de Réveillon aqui em casa. Poucas vezes vi uma coisa tão triste e arrasadora.

Dirigida por Moira Demos e Laura Ricciardi, a série tem dez episódios e acompanha, durante cerca de dez anos, a vida de Steven Avery, morador do condado de Manitowoc, no estado de Wisconsin, norte dos Estados Unidos. Em 1985, Avery foi preso pelo estupro de uma mulher e passou 18 anos na cadeia, até ser libertado depois que testes de DNA provaram sua inocência.

O filme mostra como a polícia de Manitowoc colaborou decisivamente para a condenação de Avery, seja por falhas gritantes na investigação ou por não divulgar informações que poderiam provar sua inocência.

Mas a história não termina ali. Pouco depois de ser libertado e processar o condado de Manitowoc pelos 18 anos que passou na cadeia, Avery foi preso novamente, dessa vez acusado do assassinato de uma fotógrafa. Novamente, a polícia local pareceu ter agido com má-fé e feito de tudo para condená-lo.

A série acompanha em detalhes as investigações desse crime e levanta suspeitas terríveis contra a polícia, incluindo a de forjar provas e arrancar confissões de menores de idade com evidentes problemas mentais.

Os personagens parecem saídos da imaginação bizarra dos Irmãos Coen. Para começar, há Steven Avery e sua família, donos de um imenso ferro-velho de automóveis. Os Avery são considerados a escória da comunidade e unanimemente odiados por vizinhos. Steven é um sujeito simplório, dotado de um QI baixíssimo e que não parece ter noção da gravidade das acusações contra ele. Mas é um verdadeiro gênio se comparado ao sobrinho adolescente, Brendan, que é preso como cúmplice, mas só está preocupado em assistir a programas de luta-livre na TV.

Os policiais são igualmente estranhos, uma galeria medonha de psicopatas que parecem viver no tempo do faroeste (um deles, chefe da polícia local, diz a uma repórter de TV que teria sido mais fácil matar Steven Avery do que forjar provas contra ele). O promotor do caso diz aos jurados: “E daí se a polícia plantou provas contra Avery? Ele é culpado!”. A coisa toda parece um pesadelo.

“Making a Murderer” funciona como relato jornalístico de um caso intrigante, como desfile de personagens incríveis e como denúncia de um sistema judicial completamente falho e injusto. A série é viciante.

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“Tubarão”: do luxo ao lixo

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O Telecine Cult exibe domingo uma sessão quádrupla bem divertida e que mostra como Hollywood é capaz de transformar tudo em estrume. O canal mostrará os quatro filmes da franquia “Tubarão”, iniciando às 13h45 com o clássico filme de Steven Spielberg lançado em 1975 e terminando às 20h15 com “Tubarão 4 – A Vingança” (1987), um abacaxi sem tamanho estrelado por Michael Caine.

O primeiro filme é excelente, um terror B que inaugurou a era dos “blockbusters” em Hollywood. Se quiser saber detalhes sobre as filmagens e o impacto do filme, sugiro a leitura de “Como a Geração Sexo, Drogas e Rock’n’Roll Salvou Hollywood”, de Peter Biskind.

“Tubarão 2”(1978) ainda contava com Roy Scheider no papel principal, mas Spielberg estava bem longe dali. O filme foi dirigido por Jeannot Szwarc e trouxe cenas hilariantes como essa:

Já “Tubarão 3” (1983) é tão ruim que chega a ser engraçado. Filmado em 3D, leva a ação para o parque Sea World, na Flórida. Vejam que cena antológica:

Finalmente, chegamos a “Tubarão 4 – A Vingança”, provavelmente a pior atuação de um grande ator em toda a história do cinema. Até hoje ninguém sabe se Michael Caine estava bêbado, sob efeito de remédios, ou se simplesmente ligou o “f*da-se”, embolsou o cachê e passou algumas semanas se divertindo. Algum espertalhão fez no Youtube uma coletânea dos melhores momentos do ator no filme:

Um maravilhoso fim de semana a todos.

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A escolinha do professor Santucci

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o diretor roberto santucci nos bastidores de ate que a sorte nos separe seu novo filme 1348172099752 615x300 A escolinha do professor SantucciA revista “Piauí” de janeiro publicou um perfil do cineasta carioca Roberto Santucci. Assinada por Luiza Miguez, a reportagem afirma que ele é o cineasta de maior sucesso comercial da história do cinema brasileiro, com um total de 22 milhões de ingressos vendidos.

O público pode não conhecer Santucci, mas já deve ter visto alguns de seus filmes: “De Pernas pro Ar”, “Até que a Sorte nos Separe”, “O Candidato Honesto”, “Loucas pra Casar” e “Odeio o Dia dos Namorados”, entre outros. Seu próximo lançamento é “Um Suburbano Sortudo”:

Santucci dirige comédias populares na linha do humor televisivo de programas como “Zorra Total” e “Sai de Baixo”. E se você não gosta desses filmes, não tem problema: nem o próprio Santucci parece gostar, tanto que se refere a eles como sua “moeda de troca”, sucessos que produz para poder realizar seu verdadeiro sonho artístico, que é o de dirigir filmes policiais e de ação (ele chegou a dirigir alguns, incluindo “Bellini e a Esfinge”, de 2002, mas foram fracassos de público).

Confesso que fiquei surpreso ao saber que Santucci é o cineasta mais popular da história do cinema brasileiro. Se alguém me perguntasse, eu chutaria que J.B. Tanko, o croata que dirigiu uma penca de filmes dos Trapalhões, era o campeão de bilheteria. Mas não duvido que Santucci tenha vendido mais ingressos, especialmente depois de ler que em 2014 seus filmes foram responsáveis por 60% do total de público do cinema nacional e que, naquele mesmo ano, comédias representaram 80% dos ingressos vendidos para filmes brasileiros. Santucci criou uma fórmula de sucesso e merece os parabéns por levar tanta gente ao cinema.
ate que a sorte nos separe A escolinha do professor SantucciA reportagem de Luiza Miguez é interessante também por explicar as principais características do público do cinema brasileiro atual. É, segundo o texto, um público conservador e “família”, que “se interessa por temas de ascensão social – pobres que ficam ricos graças à astúcia e ao engenho – e aprecia um humor mais popular”. Os espectadores não gostam de filmes com legendas e se concentram, segundo um especialista em análises de mercado, no interior de São Paulo, onde está a maior parte das salas de cinema. Para se certificar de que os filmes agradem ao público, Santucci realiza sessões de testes, coisa normal em Hollywood. Dependendo da reação da plateia, o cineasta faz mudanças no filme.

Um aspecto triste da reportagem é o ressentimento de Santucci contra o “establishment” do cinema brasileiro. Imaginei que um diretor de tanto sucesso comercial estivesse mais em paz com sua obra e não ligasse tanto para críticas, que são normais e até esperadas para o tipo de cinema apelativo e escrachado que ele produz. Mas a reportagem é cheia de ataques do cineasta contra a crítica e o que ele chama de “patota”. Um trecho diz: “Socializar com os ‘diretores intelectuais, esses que ostentam inteligência’, lhe causa desânimo”.

O que me causa desânimo é perceber que no Brasil muitos consideram a atividade intelectual algo arrogante e ostentador, numa separação grotesca entre o “bom” e o “popular” e que chega perigosamente próximo da apologia à ignorância. Parece que o ato de criticar denota algum tipo de superioridade e deve ser rechaçado como elitista. Vindo de um cineasta, essa visão é verdadeiramente espantosa.

A reportagem diz que Santucci não gosta dos filmes de Godard e de Truffaut e acha críticos "preconceituosos e elitistas". "Assim como não é cinéfilo nem apreciador de cinema de arte, também lhe falta paciência para filmes clássicos do gênero [a comédia]."

Não há problema algum em um diretor não gostar de determinados cineastas (embora eu ache estranho um cineasta não ser um cinéfilo e não gostar de clássicos), mas ao espernear contra o "elitismo" e "preconceito" de quem fala mal de seus filmes, Santucci parece querer dizer que só pessoas despidas de preconceitos podem realmente apreciar sua obra.

Só para efeito de comparação, o italiano Mario Monicelli (1915-2010) também realizou comédias de costumes que abordavam as diferenças sociais e culturais da Itália, fizeram imenso sucesso de bilheteria e atraíam o "povão" aos cinemas, e nem por isso Monicelli vivia reclamando que os críticos tinham preconceito contra seus filmes e que a “intelligentsia” o desprezava enquanto artista. Talvez porque os filmes fossem bons, não é mesmo?

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Sete irmãos e uma prisão: a própria casa

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Por indicação dos leitores Ricardo Moraes e Bruno Pacheco, assisti a “The Wolfpack”, um documentário norte-americano disponível no Netflix brasileiro. Estendo a indicação a todos os leitores: não percam.

É um filme dos mais esquisitos e interessantes. Os personagens principais são os sete irmãos Angulo – Mukunda, Narayana, Govinda, Bhagavan, Krisna e Jagadesh, além da irmã caçula, Visnu – que passaram a infância e adolescência trancados dentro de um pequeno apartamento em Nova York, quase sem contato com o mundo exterior.

O pai dos meninos se chama Oscar e vem de um país andino (não fica claro qual). A mãe, Susanne, vem do meio-oeste dos Estados Unidos, é professora, e educou as crianças em casa.
Os meninos passam os dias vendo filmes na TV. A diversão da família é reencenar filmes inteiros – “Pulp Fiction”, “Batman”, “Cães de Aluguel”, “O Poderoso Chefão” – e filmar tudo para assistir depois e comentar as próprias atuações.

Os irmãos Angulo raramente saem de casa. Oscar tem as chaves e decide quando a família pode se aventurar nas ruas de Nova York. Os meninos chegaram a ficar mais de um ano trancados. Num ano bom, saíram do apartamento nove vezes.

Numa dessas saídas, a estudante de cinema Crystal Moselle viu os seis meninos andando pelo bairro, todos de terno e óculos escuros, imitando os personagens do filme “Cães de Aluguel”, de Quentin Tarantino. Curiosa, Crystal se aproximou dos rapazes e ficou surpresa quando eles contaram a história da família.

Por quatro anos, a diretora filmou a intimidade dos Angulo, justamente numa época em que os irmãos mais velhos começaram a questionar as decisões dos pais e as ordens de não sair de casa.

Uma das maiores qualidades de “The Wolfpack” é não carregar na dramaticidade ao mostrar o processo de rompimento dos meninos com o pai. Não há música triunfante quando um deles decide conseguir um emprego e sai de casa, ou quando os irmãos decidem fazer um passeio a uma praia. Tudo é mostrado de uma maneira muitos simples e sem adereços, como se fosse um filme caseiro, o que torna a experiência de assistir ao filme ainda mais impactante.

Imaginar o martírio que essas crianças sofreram é impossível. Em certa hora, um deles diz: “Outras pessoas que tivessem passado pelo que nós passamos teriam ficado completamente loucas”. Vendo o filme, não dá para ter uma ideia clara das consequências – psicológicas, comportamentais, sociais – que o isolamento causou nos irmãos.

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Beat Happening: nem tudo era grunge (e um top 10 de Ettore Scola)

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Na virada dos anos 1980 para 1990, o mundo foi apresentado ao “grunge”, graças ao sucesso da gravadora Sub Pop e a bandas como Nirvana, Soundgarden e Mudhoney. Seattle, cidade da Sub Pop, virou a “capital do grunge”, e toda banda que vinha daquela região, o noroeste dos Estados Unidos, acabava incluída no mesmo balaio.

Mas não existia apenas o “grunge” por ali. Na verdade, a região era um celeiro inesgotável de bandas alternativas de estilos diversos.

Havia o power-pop de Fastbacks e Posies, o punk de Coffin Break e 7 Year Bitch, o shock-rock dos Dwarves, os sons rurais de The Walkabouts, o metal-drone do Earth, os sons tortos de Modest Mouse e Built to Spill, o emo do Sunny Day Real Estate, e por aí vai. Elliot Smith não era da região, mas fez sua curta carreira em Portland. E isso falando só do indie rock, sem mencionar bandas de metal e rock de arena como Candlebox, Queensryche, Metal Church, etc.

Depois de Seattle, a cidade mais importante da cena do rock alternativo da região foi Olympia, 70 km ao sul. Foi lá que surgiu o movimento “riot grrrl” que gerou bandas como Sleater-Kinney, Bikini Kill e Bratmobile, e onde Kurt Cobain compôs a maioria das canções que entrariam em “Nevermind”.

Olympia também era a sede da K Records, uma gravadora fundada por um sujeito chamado Calvin Johnson.

Sempre atuando à margem do rock corporativo, o selo lançou discos de Beck, Bikini Kill, Modest Mouse, Built to Spill, Melvins e de uma penca de outras grandes bandas e artistas. Alguns fãs amavam tanto a K Records que tatuaram o logo da gravadora. Foi o caso de Kurt Cobain, que sempre admirou a independência da K Records e via Calvin Johnson como um modelo de integridade.

Além de chefiar a gravadora, Johnson criou, em 1982, sua própria banda, o Beat Happening.

É difícil classificar a música do Beat Happening. Era um som minimalista de músicas muito simples e total despreocupação com a perfeição técnica das composições e gravações. O grupo se resumia a guitarra (sem nenhum tipo de efeitos), bateria e a voz gutural de Johnson. Lembra muito Cramps, The Birthday Party e o início da carreira do The Jesus and Mary Chain. As letras eram de uma simplicidade quase infantil:

Aqui, uma de minhas músicas prediletas da banda, “Cast a Shadow” (que foi regravada pelo Yo La Tengo):

O Beat Happening durou dez anos e cinco discos. No fim do ano passado, a gravadora inglesa Domino lançou “Look Around”, uma coletânea de 23 músicas abrangendo toda a carreira do grupo. O disco está em altíssima rotação aqui em casa e não tem previsão de sair tão cedo. É viciante.

P.S.: Soube da morte do grande cineasta italiano Ettore Scola na noite de ontem. Por volta de 10 da manhã, adiciono aqui um texto com uma seleção comentada de seus dez maiores filmes.

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Um Top 10 de Ettore Scola

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Ettore Scola 1024x768 Um Top 10 de Ettore ScolaO cineasta italiano Ettore Scola morreu em Roma, dia 19, aos 84 anos.

Scola dirigiu filmes extraordinários, mas de vez em quando exagerava na sacarina e tinha uma tendência ao melodramático (não aguento ver dez minutos de “O Baile”, por exemplo). Prefiro suas comédias mais realistas e “pé no chão”.

Aqui vão, em ordem cronológica, meus dez filmes prediletos de Scola:

Conseguirão Nossos Heróis Encontrar o Amigo Misteriosamente Desaparecido na África? (1968)
O impagável Alberto Sordi faz um rico industrial, entediado com a vida corporativa, que parte para a África em companhia de seu assistente (interpretado pelo engraçadíssimo Bernard Blier, pai do cineasta francês Bertrand Blier) para procurar um parente desaparecido. Engraçado demais. Para melhorar, se passa em Angola e os personagens africanos falam português.

Ciúme à Italiana (1970)
Qualquer filme reunindo Monica Vitti, Marcello Mastroianni e Giancarlo Giannini precisa ser visto. Esta comédia foi escrita pela dupla de roteiristas Age & Scarpelli.

Rocco Papaleo (1971)
Um filme estranho e bonito, escrito por Ruggero Maccari (autor de comédias clássicas do cinema italiano como “Aquele que Sabe Viver”, de Dino Risi), sobre um italiano simplório, interpretado por Marcello Mastroianni, que vai a Chicago ver uma luta de boxe e acaba se envolvendo com uma top model, vivida por Lauren Hutton. Saiu em DVD no Brasil recentemente.

A Mais Bela Noite da Minha Vida (1972)
Um filme diferente dentro do currículo de Scola. Trata-se de um drama sobre homens que se encontram em uma hospedaria numa noite, baseado no soturno conto “A Pane”, do suíço Friedrich Durrenmatt (li em inglês, com o título de “Traps”, e recomendo demais).

Nós que nos Amávamos Tanto (1974)
A nostalgia é um dos temas recorrentes do cinema de Scola, e aqui ele conta a história de três amigos (Vittorio Gassman, Nino Manfredi e Stefano Satta Flores) que lutam contra os nazistas e fascistas e depois se reencontram, muitos anos depois, para relembrar suas vidas. Outra colaboração de Scola com os roteiristas Age & Scarpelli.

Feios, Sujos e Malvados (1976)
Para mim, o melhor filme de Scola. Conta a vida de uma família de trambiqueiros que vive em uma favela na periferia de Roma. O clã é chefiado pelo incomparável Nino Manfredi. Co-escrito por Ruggero Maccari.

Um Dia Muito Especial (1977)
Scola sempre gostou de usar grandes momentos históricos como pano de fundo para contar pequenas histórias pessoais. Aqui, uma dona de casa (Sophia Loren) e um radialista (Mastroianni) que está prestes a ser deportado por ser homossexual e antifascista, estão praticamente sozinhos em um prédio, depois que todos os vizinhos saíram às ruas para ver o encontro entre Hitler e Mussolini, em 1938.

Casanova e a Revoução (1982)
Outra característica marcante de vários filmes de Scola é a presença dos protagonistas em um espaço confinado (um salão, um restaurante, etc.) Aqui, Mastroianni interpreta o conquistador (de mulheres, não de países) italiano Giacomo Casanova, que se encontra em uma carruagem (onde também estão Thomas Paine e Rétif de La Bretonne), durante a fuga de Louis XVI e Maria Antonieta de Paris, em 1791.

Macaroni (1985)
Está longe de ser uma das melhores comédias italianas, mas só por juntar Jack Lemmon e Marcello Mastroianni, merece ser vista.


Concorrência Desleal (2001)

Nos últimos 20 ou 30 anos, os filmes de Scola pareceram voltar aos temas e estilos preferidos do diretor: saudosismo, reuniões familiares, personagens que se reúnem para lembrar o passado, etc. “Concorrência Desleal” retoma o tema do fascismo que Scola já havia explorado em “Nós Que Nos Amávamos Tanto” e “Um Dia Muito Especial”, contando a história da disputa entre dois comerciantes – um católico e o outro judeu – em 1938.

P.S.: Devido à morte de Ettore Scola, adiantei o texto de quinta-feira. O blog volta com um texto inédito – sobre “Os Oito Odiados”, de Quentin Tarantino – na sexta. Até lá.

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“Oito Odiados”: Tarantino fala muito

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Quentin Tarantino sempre disse que sua principal inspiração na criação de diálogos foi Elmore Leonard (1925-2013), o cultuado escritor de romances policiais (o terceiro filme de Tarantino, “Jackie Brown”, foi adaptado do livro “Rum Punch”, de Leonard).

Como grande fã de Leonard, Tarantino certamente sabe que o escritor fez uma lista de dez regras para escrever bem (leia aqui). A décima regra de Leonard é das mais importantes: “Tente deixar de fora a parte que os leitores tendem a pular”. Infelizmente, Tarantino não tem obedecido a essa regra de Leonard. E “Os Oito Odiados” é a maior prova.

O filme tem quase três horas de duração, e pelo menos uma hora é dedicada a um blablablá sem fim e sem importância. A primeira metade do filme beira o insuportável. Pouco acontece, e esse pouco vem soterrado em diálogos intermináveis. Tarantino sabe escrever diálogos como poucos, mas parece tão confiante em seus superpoderes de criação que se deixa levar pelo exagero.

“Os Oito Odiados” tem dois cenários: as montanhas geladas do Wyoming e o interior de uma estalagem, onde chega uma carruagem com dois caçadores de recompensas (Kurt Russell e Samuel L. Jackson), uma criminosa (Jennifer Jason Leigh) que o personagem de Russell está levando para uma cidade para ser enforcada, e o novo xerife da cidade (Walton Goggins).

Na estalagem, o grupo encontra alguns personagens – um inglês (Tim Roth), um mexicano (Demian Bichir), um velho soldado (Bruce Dern) e um caubói quieto e misterioso (Michael Madsen). Fica o mistério: essas pessoas são quem dizer ser, ou bandidos que tentarão salvar a criminosa?

É uma premissa interessante, embora a ideia de confinar personagens em lugares pequenos não seja nada nova. Mas estender isso quase três horas?

Tarantino é um cineasta de estilo tão particular e marcante que consegue transformar qualquer lugar, seja a Europa da Segunda Guerra (“Bastardos Inglórios”), o sul escravocrata dos EUA (“Django Livre”) ou as montanhas de Wyoming em cenários que parecem fábulas. Basicamente, ele faz o mesmo filme em qualquer lugar, tempo e circunstância. Suas imagens são irreais e lúdicas, e a maneira peculiar como encena diálogos e confrontos entre os personagens dá aos filmes um tom vagamente surrealista. Nada ali parece real, mas um universo tarantinesco próprio, amplificado, em “Os Oito Odiados”, pela fantasmagórica trilha de Ennio Morricone.

Quando a história é boa, como em “Bastardos Inglórios”, os longos diálogos não atrapalham, mas impulsionam a trama. Já em “Django Livre”, “Os Oito Odiados” e, principalmente, “Prova de Morte”, a falação mais atravanca do que ajuda. Os diálogos são sempre espertos e bem feitos, mas acabam entediando o espectador, que fica à espera que algo de interessante aconteça.

Em “Os Oito Odiados”, isso é exacerbado pelo confinamento dos personagens e a fraqueza da trama. Todo mundo sabe como o filme vai terminar, e as surpresas da história, convenhamos, não são tão surpreendentes assim. Se Tarantino tivesse seguido o conselho de seu mestre Leonard e extirpado as partes que o público tende a pular, suspeito que “Oito Odiados” teria uns 80 minutos de duração. O que o tornaria um filme muito, mas muito melhor.

Um ótimo fim de semana a todos.

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“Um Tiro na Noite”é obra-prima de De Palma

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A Versátil acaba de lançar a caixa “A Arte de Brian De Palma”, com três filmes: “Irmãs Diabólicas” (1973), “O Fantasma do Paraíso” (1974) e “Um Tiro na Noite” (1981). Os dois primeiros são ótimos e mereciam reedições, mas o terceiro é uma obra-prima, certamente um dos melhores da carreira do diretor.

O título em inglês de “Um Tiro na Noite” é “Blow Out”. Assim como vários outros filmes de De Palma, o tema deste é o cinema. O filme referencia diretamente “Blow Up” (1966), de Antonioni.

John Travolta faz Jack Terry, um técnico de áudio de um filme B. Numa noite, ele está às margens de um rio, captando som ambiente para o filme, quando presencia um carro derrapar na estrada e cair dentro do rio. Ele pula nas águas geladas e consegue resgatar uma mulher, Sally (Nancy Allen). O motorista, infelizmente, morre. Ele é ninguém menos que o governador do Estado, e Nancy, uma garota de programa que o acompanha.

Terry ouve as gravações que fez, e ouve o tal “tiro na noite” que o título brasileiro tão estupidamente entrega. Isso é só o começo de uma história policial intrincada, envolvendo política, sexo e poder, com uma atmosfera de medo e paranoia que lembra grandes filmes como “The Parallax View” (Alan J. Pakula, 1974) e “Três Dias do Condor” (Sidney Pollack, 1975) (leia aqui uma texto que fiz em 2012 com uma lista de dez grandes filmes do “cinema paranoia”).

O filme inteiro é uma ode ao cinema. Terry não é um detetive, mas um profissional de filmes, e é por meio de suas habilidades técnicas que ele consegue, aos poucos, desvendar o mistério da morte do governador.

Assim como Tarantino e John Woo, De Palma usa e abusa de referências cinematográficas em seus filmes. Quem prestar atenção verá toques de Hitchcock (“cola” habitual de De Palma), do Coppola de “A Conversação” e, claro, de “Blow Up”. O acidente de carro é uma menção óbvia ao incidente de 1969 envolvendo o então senador Ted Kennedy (1932-2009), quando sua colega, Mary Kopechne, morreu afogada depois que Kennedy perdeu controle do carro em uma ponte e caiu num canal.

Quando lançado, em 1981, “Blow Out” foi um fiasco de bilheteria, mas ganhou status de “cult” ao longo dos anos, e novas gerações de cinéfilos puderam conhecê-lo. Para mim, é um dos três melhores filmes de De Palma, junto com “Scarface” (1983) e “Carlito’s Way” (1993).

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Courtney Love é tão boazinha…

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O canal BIS está exibindo o documentário “Hit So Hard”, sobre a ex-baterista do grupo Hole, Patty Schemel (reprisa hoje, às 10 da manhã, e dia 30, ao meio-dia).

Não é um grande filme, mas traz ótimas histórias e cenas de arquivo e certamente vai interessar a qualquer um que goste do rock alternativo da era “grunge”. De quebra, traz cenas inéditas, filmadas por Patty, da intimidade da família Cobain, de quem era muito amiga.

Patty era conhecida na cena underground de Seattle quando entrou para a banda Hole, em 1992. Por pouco não tocou com o Nirvana, mas a vaga ficou com Dave Grohl. Mesmo assim, ela ficou amiga de Kurt e morou com ele, Courtney Love e a filha do casal, Frances, em Los Angeles, pouco antes do suicídio de Kurt, em abril de 1994.

A primeira metade do filme mostra a carreira de Patty, de suas inúmeras tentativas com bandas desconhecidas ao sucesso com o Hole e o disco “Live Through This” (1994). Há reveladoras imagens de bastidores, filmadas pela própria baterista, mostrando shows do Hole, entrevistas e momentos íntimos da banda. Há também perturbadoras cenas de Kurt e Courtney, chapados até a alma, brincando com seu bebê.

Mas ninguém convive com Kurt e Courtney impunemente, e Patty, que tinha problemas com álcool desde os 12 anos de idade, logo fica viciada em heroína e metanfetaminas. A morte de Kurt e, dois meses depois, a overdose fatal da baixista do Hole, Kristen Pfaff, mandam Patty numa espiral suicida de seringas e depressão.

Depois de um bom tempo em clínicas de reabilitação, durante o qual a banda fica em hiato devido à carreira cinematográfica de Courtney, que atuou em “O Povo Contra Larry Flynt” (1996), Patty e banda se reúnem para as gravações do álbum “Celebrity Skin”. Patty está bem de saúde e escreve boa parte das canções, mas um acontecimento vai jogá-la num buraco ainda mais fundo.

Courtney contrata o produtor Michael Beinhorn para produzir “Celebrity Skin” e concorda quando ele exige usar um baterista de estúdio – Deen Castronovo, do Journey e então recém-chegado de uma turnê com o Whitesnake – para tocar no lugar de Patty, que fica obviamente revoltada e pede demissão do Hole.

A traição destrói a pouca autoconfiança e amor próprio que ainda restavam a Patty. Em pouco tempo, ela está viciada em crack, morando nas ruas e se prostituindo. Entrevistada, Courtney Love, em total mode Dercy Gonçalves, lembra, às gargalhadas, receber uma ligação a cobrar de Patty pedindo dinheiro.

O que o documentário não conta é que, depois disso, Courtney deu entrevistas chamando Michael Beinhorn de “nazi” e o criticando pelo tratamento dispensado a Patty. O que não impediu Courtney de contratar Beinhorn de novo quando gravou o disco de volta do Hole, “Nobody’s Daughter”, em 2010. Patty, por sua vez, também voltou a trabalhar com Courtney no álbum desta, “America’s Sweetheart”, em 2004. O que mostra que traições e ofensas são facilmente esquecidas quando há dinheiro na parada.

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A banda que o rock esqueceu

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hollywood brats 1024x537 A banda que o rock esqueceuA revista inglesa "Mojo" escolheu "Sick on You", de Andrew Matheson, o melhor livro sobre música lançado em 2015. É o relato da breve carreira - e fracasso - de sua banda, The Hollywood Brats, uma espécie de New York Dolls inglês.

Não conhecia o Hollywood Brats e Matheson, mas comprei o livro em versão eletrônica e o coloquei na fila, já que estava ocupado com as últimas páginas do calhamaço de Peter Guralnick sobre Sam Phillips e começando outro tijolo, "A Brief History of Seven Killings", do jamaicano Marlon James.

sick on you1 196x300 A banda que o rock esqueceuDomingo de manhã, só de bobeira, comecei a folhear "Sick on You". Seis horas e 317 páginas depois, a conclusão: se não é a melhor autobiografia de músico que já li, está bem no topo. Que livro sensacional.

A história começa em 1971, quando Matheson chega a Londres com 18 anos de idade, uma obsessão por Kinks e Stones e o sonho de montar um grupo de rock'n'roll primal e de visual andrógino. Logo nas primeiras páginas, ele conta as cinco regras que estabeleceu para a banda. Algumas delas: "Um cabelo sensacional é inegociável"; "Nada de pelo facial - nenhuma groupie digna de respeito suspira pelo Grateful Dead", e a melhor: "Nada de namoradas. Elas acabam com o cachê sexual de qualquer banda e podem torcer o cérebro de um reles baixista até ele achar que merece um disco solo triplo. Duas palavras: Yoko e Ono".

A muito custo, Matheson monta sua banda, batizada The Queen, e começa sua saga pelo mundinho de gravadoras e clubes da Swinging London em busca de fama, grana e mulheres. Não consegue nada disso - com exceção de algumas groupies - e passa os dias morando em muquifos, enchendo a cara, dividindo o chão com ratos, brigando com vizinhos, roubando comida de mercadinhos e apanhando de gangues de motoqueiros. O que ele não perde é o senso de humor sarcástico e autodepreciativo e, principalmente, o ar blasé de quem acredita que sua banda é a melhor do planeta.

Claro que outra banda chamada Queen aparece e leva o nome. Matheson, enfurecido, muda o nome do grupo para Hollywood Brats. Dias depois, encontra o cantor do Queen - "aquele dentuço metido" - no clube Marquee e acerta um direto no queixo do sujeito.

As histórias são engraçadíssimas: Matheson e trupe roubam uma peixaria só para descobrir que levaram um isopor cheio de enguias vivas; uma festa na mansão do astro pop Cliff Richard acaba com o carro da banda atolado num campo de batatas; um show numa base militar termina em destruição. Os Brats encontram Keith Moon, Bryan Ferry, Mick Jones e Jimmy Page, com resultados sempre hilariantes.

O livro termina em 1975, quando Matheson descobre que a gravadora com a qual assinou contrato para o primeiro disco era só uma lavanderia de grana para a Máfia. O LP acaba saindo apenas na Noruega e vende exatas 563 cópias. Mas rendeu um livro fora de série.

Espero que alguma editora lance "Sick on You" no Brasil. Li que Matheson (olha ele aí embaixo, numa foto recente) está trabalhando no roteiro de um filme adaptado do livro.
The Hollywood Brats A banda que o rock esqueceu

Esse filme promete.

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Steve Jobs: personagem frio num filme gelado

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Os dois filmes mais recentes do roteirista Aaron Sorkin, “A Rede Social” (2010) e “Moneyball – O Homem Que Mudou o Jogo” (2011) são parecidos. Ambos têm como protagonistas homens obcecados por exatidão e tecnologia. O primeiro, claro, é Mark Zuckerberg, fundador do Facebook. O segundo é o gerente de um time de beisebol, interpretado por Brad Pitt, que usa números e estatísticas para montar seus times.

Quando li que Sorkin seria o roteirista de uma cinebiografia de Steve Jobs (1955-2011) baseada na biografia escrita por Walter Isaacson, achei a escolha certa. Sorkin parecia o roteirista perfeito para traduzir para o público, de forma compreensível e interessante, as brigas corporativas e os dilemas criativos que marcaram a vida de Jobs.

Infelizmente, “Steve Jobs”, o filme, não decola. Apesar das soluções narrativas arriscadas e criativas imaginadas por Sorkin e pelo diretor Danny Boyle (“Trainspotting”), o resultado é um filme frio, chato e prolixo, em que Jobs sai como um picolé de chuchu sem graça e sem alma, bem diferente do personagem complexo relatado por Isaacson.

O filme é estruturado em três “atos”, três lançamentos marcantes de Jobs: o do primeiro Macintosh, em 1984, o do “cubo” da NeXT, em 1988 e, finalmente, o do iMac, em 1998. Toda a ação do filme acontece nos bastidores desses eventos, onde Jobs encontra o co-fundador da Apple, Steve Wozniak (Seth Rogen), o CEO da Apple, John Sculley (Jeff Daniels) e o engenheiro Andy Hertzfeld (Michael Stuhlbarg), além de uma antiga namorada, Chrisann, que traz a tiracolo a pequena Lisa, que Chrisann diz ser filha de Jobs. Durante todo o período mostrado no filme, Jobs tem a companhia da executiva Joanna Hoffman (Kate Winslet), sua confidente e conselheira.

Sorkin e Boyle optaram por uma estrutura narrativa diferente das cinebiografias tradicionais. Nada de cenas do jovem Steve tendo seu “momento Eureca” e inventando a Apple, ou coisa parecida. Ponto para eles. O filme é narrado aos pulos, nesses três “atos”, com alguns flashbacks ocasionais para explicar as circunstâncias.

Assim, vemos Jobs nos bastidores do lançamento do primeiro Mac, discutindo com Wozniak, que implora para que ele agradeça à equipe que criou o Apple 2; Jobs aos berros com Scully, em 1998, lembrando a noite traumática em que a diretoria da Apple o demitiu, e Jobs brigando com a ex-namorada, Chrisann, e garantindo que não é pai da menina Lisa.

A solução é boa, mas não funciona, em grande parte porque Sorkin e Boyle mostram os clímax de cada situação sem se preocuparem em construir dramaticamente as cenas. Vemos muita gritaria, angústia e ressentimento, mas não dá para entender de onde vem tudo aquilo. É como presenciar uma briga sem saber os motivos: você não consegue tirar os olhos da cena, mas não tem nenhum envolvimento emocional com ela.

O que sobram são os diálogos sempre longos, espertos e ultrarrápidos de Sorkin (não é surpresa que ele seja o roteirista contemporâneo predileto de Tarantino, outro cara que adora diálogos espertos demais para serem credíveis e disparados com a velocidade de uma metralhadora).

Jobs é mostrado como um sujeito gélido, com um ego do tamanho de um bonde e arrogante ao extremo. Não seria problema se o personagem fosse interessante, mas não é o caso. Esse Steve Jobs parece uma caricatura, coisa que nenhum personagem de Sorkin pareceu até agora. Para piorar, Michael Fassbender não se parece em nada com Jobs, o que realça a impressão de distanciamento do personagem e o torna ainda mais falso. Uma rara bola fora de Aaron Sorkin.

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Savages: o pós-punk vai bem, obrigado

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Em abril de 2014, fui ao Chile ver o festival Lollapalooza. O evento foi uma desgraça. A única coisa que se salvou foi a banda inglesa Savages. Na época, escrevi sobre elas:

Eu já tinha gostado muito do único disco da banda, “Silence Yourself”, mas, ao vivo, esse quarteto feminino de Londres é ainda melhor.

É chato falar de influências e comparar sonoridades ao descrever uma banda tão boa, mas não dá para citar as Savages sem lembrar bandas do pós-punk britânico como Gang of Four, Wire, Fall, Siouxsie and the Banshees e os primeiros discos do The Cure.

As Savages têm uma pegada sombria e fazem um som denso e atmosférico, cheio de climas soturnos, mas com partes muito pesadas e rápidas, marcadas por uma bateria tribal que lembra o Killing Joke e linhas de baixo que são puro Peter Hook, tudo embalado em um senso estético chique e cool. Bom demais.

A cantora Jehnny Beth tem um carisma gélido e comandou o público com uma presença cênica intensa e contida. E a guitarrista Gemma Thompson é um assombro: por vezes despeja riffs angulosos e agressivos como os de Andy Gill, do Gang of Four, ou usa efeitos e ecos para criar barulhos sombrios. Sua sonoridade lembra também a de East Bay Ray, genial guitarrista do Dead Kennedys.

Mesmo sem conhecer a banda, a plateia do Lollapalooza aplaudiu muito ao fim do show. As Savages botaram o festival inteiro no bolso.

Há uns dez dias, a banda lançou seu segundo disco, "Adore Life" (Matador). Nas primeiras audições, achei mais leve e menos agressivo que "Silence Yourself", mas bem mais variado e interessante.

Vejam o lindo clipe da faixa "The Answer":

A cantora Jehnny Beth parece continuar com sua fixação em Siouxsie. Ponto para ela.

As Savages passaram com louvor pelo vestibular do segundo disco e mostraram que não são daquelas bandas que vão sumir de repente. E "Adore Life" deve continuar em alta rotação aqui em casa por um bom tempo.

Um ótimo fim de semana a todos.

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Sai da praia, filhinho, pro helicóptero não te decapitar!

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helip. PR OLE 1024x729 Sai da praia, filhinho, pro helicóptero não te decapitar!Quem frequenta praia no verão sabe o que esperar: lanchas disputando "rachas", barcos de passeio superlotados e jet skis zunindo no meio de banhistas.

Mas um par de veranistas inovou e estabeleceu um novo parâmetro de ostentação irresponsável e desrespeito à vida humana: os dois simplesmente pousaram seu possante helicóptero na areia de uma pequena praia cheia de crianças e banhistas.

Por volta de 13h30 de domingo, as famílias que se divertiam na praia da Barra do Corumbê, em Paraty, litoral sul do Rio de Janeiro, se surpreenderam ao ver um helicóptero da marca Robinson, modelo R44 Raven 2, prefixo PR-OLE, sobrevoando a praia. A surpresa virou medo quando a aeronave deu um rasante por cima de casas e árvores, derrubou guarda-sóis e pousou em frente a algumas residências, numa faixa de areia que não chega a 15 metros.

Por mais de um minuto, o helicóptero ficou parado na areia com a hélice principal e o rotor de cauda ligados, enquanto alguns banhistas gritavam para que ninguém se aproximasse.

Eu estava com minha família na praia e achei que o helicóptero havia sofrido algum problema técnico. Era a única explicação plausível para uma manobra absurda daquelas.

Para nossa surpresa, um dos dois ocupantes da aeronave desceu e em pouco segundos estava passeando pela praia com uma cervejinha long neck na mão. O piloto desceu em seguida e também começou a flanar pela areia. Não havia defeito técnico algum. Eles estavam simplesmente ostentando seu brinquedinho num domingo de sol.

O passageiro disse se chamar Renato. Quando alguns banhistas reclamaram do fato de a aeronave ter pousado perigosamente no meio da praia, próximo ao local onde famílias e crianças se banhavam e brincavam na areia, ele disse que um amigo o havia autorizado a pousar ali. Perguntei ao piloto se ele achava seguro pousar numa praia cheia de crianças. Ele desconversou e disse que não iriam demorar.

Enquanto alguns banhistas se mostravam indignados pelo descaso dos dois, outros se divertiam fazendo selfies e juntando a família para um retrato em frente à geringonça.

helicoptero Sai da praia, filhinho, pro helicóptero não te decapitar!

Quando "Renato" e o piloto perceberam que algumas pessoas não apreciaram a acrobacia e ameaçavam denunciá-los às autoridades, entraram no helicóptero e se mandaram dali.

Falta uma semana para o Carnaval. Que surpresas teremos durante a folia de Momo? Que brinquedinhos algum asno vai tirar da cartola para ostentar? Um zepelin? Um hidroavião? Um submarino? Quem viver verá.

P.S.: Segunda de manhã achei o contato do dono da aeronave no site da ANAC. Ele disse que o helicóptero foi vendido em 19 de janeiro para uma empresa chamada Isotec Construtora e Incorporadora, e enviou uma cópia do contrato de venda como prova. Ele disse também que iria pedir à ANAC para acelerar a troca do nome do proprietário no registro da aeronave. Procurei a assessoria de comunicação da ANAC e passei as informações sobre o ocorrido.

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